DEVIDO À INSTABILIDADE POLÍTICA E/OU INTEMPÉRIES VÁRIAS
Inês Raimundo, investigadora da Universidade Eduardo Mondlane, de Maputo, caracterizou os moçambicanos como uma sociedade com as “malas às costas”, por causa da instabilidade política e das calamidades naturais.
“Em Moçambique, do Rovuma a Maputo, nós temos as cheias dos rios, e se não são as cheias, são as secas, ou os ciclones e tudo isto afecta a deslocação da população”, afirmou a investigadora, esta quarta-feira, em Lisboa, Portugal, referindo-se, sobretudo, às inundações do rio Limpopo, no Sul do país.
Autora do estudo “Moçambique e o círculo vicioso de deslocamentos forçados – Guerras, Calamidades naturais e reassentamentos”, Inês Raimundo afirmou, durante uma conferência que decorreu no Instituto Superior de Economia e Gestão, em Lisboa, que também as situações de seca provocam a “mobilidade permanente” dos moçambicanos.
“As mudanças climáticas têm muito mais impacto em países pobres. O índice de desenvolv mento humano em Moçambique é dos mais baixos. Aliás, Moçambique faz parte da lista dos dez países mais pobres do mundo. Ainda por cima, temos as calamidades naturais”, afirmou.
O período da guerra civil que terminou em 1992 e, mais recentemente, as “hostilidades militares” registadas no país (entre a Renamo e as forças governamentais) foram circunstâncias que também originaram a existência de deslocados internos e o realojamento de populações.
As vantagens de viver em regiões fronteiriças
“Muitas vezes falamos com pessoas que dizem que não acreditam na paz. As populações que dizem estar mais seguras são aquelas que vivem nas áreas fronteiriças. Muito mais do que aquelas que vivem na costa, porque em qualquer situação podem voltar para os países onde, durante anos, viveram em refúgio”, explicou a investigadora.
Inês Raimundo realçou que as populações que, sobretudo no contexto da guerra civil, se encontravam junto das fronteiras mantiveram as casas que habitaram no país de refúgio.
Tanzânia, Zâmbia, África do Sul, Zimbabué e Malaui acolheram no total um milhão e 700 mil refugiados, sendo que só no Malaui chegaram a estar concentrados um milhão 285 mil refugiados moçambicanos durante a guerra civil que se travou em Moçambique entre 1976 e 1994.
“Temos famílias transnacionais, famílias em diferentes fronteiras”, referiu.
Fenómenos sociais, situações de conflito, insegurança, factores climatéricos e mesmo projectos de reconstrução provocaram e continuam a determinar a “mobilidade cíclica das populações com assentamentos e a reassentamentos”.
“Actualmente é comum falar-se em descobertas de recursos naturais. Eu coloco sempre esta questão entre aspas porque eles (recursos naturais) sempre existiram. Se virmos o mapa geológico de 1960, já indicam todos os produtos – carvão, areias pesadas, gás – está tudo identificado”, disse, sublinhando que actualmente é sentida uma presença muito forte de empresas estrangeiras, sobretudo da China e do Brasil.
Finalmente, a investigadora referiu-se à Lei de Terras, que determina que o Estado é proprietário da terra, facto que acaba por ser uma protecção para as populações obrigadas a deslocarem-se, seja porque motivo for.
CORREIO DA MANHÃ – 31.10.2014