OBSERVADORES nacionais do diálogo político entre o Governo e a Renamo apresentaram esta semana uma proposta de declaração com vista à implementação do processo de despartidarização da Função Pública.
O documento, que está a ser analisado pelas partes, ainda não tem uma designação definitiva e, segundo o Ministro da Agricultura e Segurança Alimentar, José Pacheco, visa basicamente a criação de mecanismos para se aperfeiçoar a transparência no processo de recrutamento, ingresso, promoção, progressão e mudança de carreira no Aparelho do Estado.
“É prematuro avançar seja o que for em torno deste documento, mas basicamente ele pretende dizer que devemos continuar com o esforço de garantir a transparência, que já é uma realidade, e torná-la cada vez mais sólida no processo de recrutamento através de concursos para o ingresso no Aparelho do Estado. O documento também versa sobre a necessidade de se promoverem concursos no processo de promoção, progressão e mudança de carreira com base em mérito profissional, sem interferência partidária, o que já é uma realidade, quer através de legislação, quer através de práticas que são adoptadas na nossa Administração Pública”, afirmou Pacheco, falando a jornalistas à saída da 91.ª ronda negocial realizada segunda-feira em Maputo.
Esta foi a primeira ronda de diálogo entre o Governo e a Renamo desde a investidura do novo Presidente da República, Filipe Nyusi, e o seu Executivo.
Aliás, a propostas dos observadores nacionais ao diálogo poderá, segundo o chefe da delegação do Executivo, José Pacheco, ser o instrumento que vai fechar o ponto três do diálogo, nomeadamente a despartidarização da Função Pública, o que fará com que fique apenas uma matéria remanescente, o ponto que se refere às questões económicas. O primeiro ponto, designadamente a alteração da Legislação Eleitoral, já foi realizado, enquanto o segundo, sobre o desarmamento e reintegração das forças residuais da Renamo na Polícia, Forças Armadas ou vida civil ainda está em negociação, registando-se actualmente um impasse no que diz respeito à sua implementação.
O Governo defende que a Renamo deverá apresentar uma relação nominal de todos os elementos da sua força residual, onde para além do nome deverá constar a idade, grau de escolaridade e patente militar de modo a não só conhecer-se o número exacto do efectivo como também para facilitar a sua integração em qualquer dos locais escolhidos.
A Renamo, na voz do chefe da sua delegação, Saimone Macuiana, não concorda com esta metodologia e defende a criação de um modelo de reintegração que deve prever a partilha de responsabilidades de direcção, comando e chefia. Isto é, para a Renamo o Governo deverá criar, nas Forças Armadas e na Polícia, um sistema que possa prever a criação de vice-comandantes em todos os escalões. Aqui, se o comandante for designado pelo Executivo o seu vice deverá ser proposto pela Renamo e vice-versa.
Na segunda-feira o Governo voltou a rejeitar a insistência da “perdiz” em fazer avançar com a ideia. Para José Pacheco, o que a sua delegação explicou à Renamo é que todo o desafio que o país está a ter é o de despartidarizar a Função Publica.
“O desafio é termos um Estado não partidário. Se nós embarcarmos num processo de integração ou de confiar tarefas de direcção, chefia e de comando de forma representativa dos partidos políticos, eventualmente com assento parlamentar, passaremos a ter forças armadas partidárias, o que viola, por um lado, a nossa Constituição da República, e a legislação que cria as FADM”, explicou o governante.
De acordo com Pacheco, pior do que isso é que a matéria levantada pela Renamo não faz parte dos acordos assinados. “Os acordos assinados assentam na cessação das hostilidades (que já aconteceu); assentam na integração (o que estamos à espera que nos entreguem as pessoas a serem integradas) nas Forças Armadas e na Policia; e assenta na integração social e económica dessas mesmas pessoas. Portanto, estamos aqui numa situação de tirar oportunidades das pessoas poderem usufruir os benefícios que existem nas Forças Armadas, na Polícia ou na sua reinserção social”, disse Pacheco.
O chefe da delegação do Governo referiu ainda que as pessoas que forem apresentadas em função daquilo que for declarado como capacidade delas, mesmo que sejam de idade avançada e que não tenham interesse de serem integradas na Polícia ou nas FADM, haverá um processo de integração e de passagem à reserva ou reforma para que beneficiem de um direito que lhe oferece nos termos do acordo assinado.
“Esperamos que os nossos irmãos entendam que aquelas pessoas têm o direito de beneficiar do que foi assinado pelo então Presidente da República, Armando Guebuza, e pelo líder da Renamo, Afonso Dhlakama, a 5 de Setembro do ano passado e que depois foi transformado em lei pelo Parlamento”, enfatizou, para depois sentenciar que “impedir que estas pessoas gozem desse direito é uma atitude difícil de entender e de compreender de um partido político que diz que tem interesses nacionais e que quer ver integração no nosso país”.
Apostar no trabalho em conjunto
O CHEFE da delegação da Renamo no diálogo com o Governo, Saimone Macuiana, acredita que se se apostar num trabalho conjunto entre as partes facilmente se ultrapassarão as diferenças.
Segundo Macuiana, é desejo da Renamo ver os seus oficiais nas Forças Armadas a ocuparem postos importantes. “Ainda não há consenso mas julgamos que trabalhando em conjunto com os nossos irmãos do Governo iremos encontrar soluções, em nome da paz, da reconciliação e da estabilidade do nosso país”, afirmou.
Macuiana confirmou que o seu grupo de trabalho está já a analisar o documento apresentado pelos observadores nacionais do diálogo sobre a despartidarização da Função Pública.
Instado a pronunciar-se sobre o facto de a presença da delegação da Renamo à mesa do diálogo significar reconhecer ou não o Governo de Filipe Nyusi, a fonte não foi clara na resposta, tendo afirmado que a Renamo está a dialogar com o Governo, um Governo que representa o Partido Frelimo.
“O que eu sei é que o Partido Frelimo continua nas mesmas circunstâncias em que começámos o processo de diálogo, no ano passado. O que significa que estão a dialogar as duas forças políticas reconhecidas em Moçambique, nomeadamente a Renamo e a Frelimo. São essas duas forças que assinaram o primeiro acordo de paz entre si em 1992, em Roma, e um segundo acordo, desta feita em Maputo, a 5 de Setembro do ano passado. O mais importante é procurar aspectos que contribuem para a paz. Outras perguntas que não contribuem para a paz não têm valor jurídico. Fomos mandados pelo presidente Dhlakama para vir tratar as questões pendentes do acordo assinado a 5 de Setembro de 2014. Este acordo, o seu cumprimento, não só interessa à Renamo e ao Governo, mas a todos os moçambicanos. Questões banais não têm relevância neste momento”, afirmou Macuiana, visivelmente nervoso.
Governo mantém equipa
Entretanto, o Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, decidiu manter a equipa negocial do Governo criada pelo seu antecessor, Armando Emílio Guebuza, no diálogo com a Renamo.
Com efeito, na ronda realizada esta segunda-feira a delegação do Executivo apareceu encabeçada pelo então Ministro da Agricultura, José Pacheco, entretanto nomeado Ministro da Agricultura e Segurança Alimentar, que tinha ao seu lado o antigo Ministro dos Transportes e Comunicações, Gabriel Muthisse, o seu número dois.
Muthisse não integra o novo Executivo.
Para além destes dois elementos a delegação do Governo mantém os peritos militares e outros integrantes.
NOTÍCIAS – 28.01.2015