Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
A verdade defende-se e a paz constrói-se com actos e cometimento
Uma engenharia claramente direccionada para a acomodação de interesses e distribuição de cargos governamentais visando a manutenção de um poder mais do que suspeito está travando todo um país e empurrando-o para uma confrontação desnecessária.
Os paladinos da “democracia de conveniência” assustam-se quando os partidos da oposição questionam com vigor os resultados eleitorais.
Um aparelho de Estado vivendo segundo os objectivos de uma elite pendurada no poder, chantageando e condicionando processos de importância fundamental para o país não pode continuar a agir de modo delinquente e criminoso.
Quando se provou que o recrutamento dos MMV’s tinha elementos suspeitos de favorecimento do partido Frelimo, alguns diziam que não correspondia à verdade.
Quando se tornou claro que a máquina do STAE ao nível dos distritos era composta por elementos afectos aos Governos distritais e provinciais, com tarefas específicas de envenenarem todo um processo eleitoral, poucos foram os que tomaram atenção e as devidas cautelas.
Quando os tribunais distritais e provinciais e outros departamentos governamentais foram preenchidos com funcionários e juízes afectos ao partido no poder, a ex-ministra da Função Pública veio a público desmentir.
Quando a oposição se queixa de partidarização do aparelho de Estado, levantam-se vozes hipócritas que dizem que isso não corresponde à verdade.
Quando se diz que a PRM e as FADM possuem os seus comandos compostos por membros da mais alta confiança política da liderança do partido Frelimo, ainda há gente que procura desmentir esse facto.
Um país não se constrói com mentiras e com exclusão.
Falar de patriotismo e de unidade nacional no vazio, e promover agendas que efectivamente excluem a maioria dos cidadãos de um país, é não só contraproducente, como perigoso.
Vivemos face a um adiamento constante da construção da moçambicanidade.
Muito “batuque e tambor” foi tocado em nome da unidade nacional. Na verdade, o que se dá aos cidadãos para digerirem é uma ração indigesta e já podre. A verdadeira unidade apregoada serve para a divisão do país e dos seus recursos entre “os eleitos” cidadãos “libertadores”.
Quem tinha dúvida sobre isso, veja a composição do “Governo” que querem que os moçambicanos “engulam”.
As pastas ministeriais foram negociadas a dedo e milimetricamente, aglutinando pelouros que garantam um controlo efectivo dos negócios acautelados sob vigência da III República.
Hoje, com o caldo em fogo brando, dando sinais de ebulição a qualquer momento, pretende-se, através de um bombardeamento mediático, vender aos moçambicanos que a opção válida é aceitar-se resultados eleitorais homologados por um conclave de juízes afectos ao partido no poder.
Os esforços titânicos e multifacetados que se fazem visam escamotear a verdade e proteger os que se dizem e se sentem “eleitos e predestinados” para comandar e deter as rédeas do poder em Moçambique.
A elite moçambicana conspurcada e viciada em jogos ilícitos defende com “unhas e garras” um “status” promotor de desgraças e violência.
O “comissário político chefe”, em mais uma jogada de xadrez, supõe-se vencedor e inatingível, protegido e imune ao que possa suceder no país.
Satisfeito com os arranjos intrapartidários, sossegado de que deixou os seus “peões” colocados no tabuleiro, suspira de satisfação com o curso dos acontecimentos.
Sem ter-se conseguido uma saída que garantisse a alteração da Constituição da República, depois de uma verdadeira drenagem de fundos escassos, as vírgulas ao texto foram adoptadas como a revisão pretendida, e todo o mundo se calou face ao aborto constitucional.
Moçambicanos, chegou o tempo de assumirmos que o destino de Moçambique está nas nossas mãos e não de supostos juízes constitucionalistas.
O bravo povo da RDC, nos últimos dias, mostrou sem protagonismos de partidos políticos que é possível parar com planos sinistros dos políticos. Uma manifestação rigorosa de cidadão em defesa dos preceitos democráticos e contra exercícios visando a manutenção do poder fora das regras democráticas venceu. Sangue humano foi derramado desnecessariamente. “Aliados naturais” de visita a Kinshasa foram escorraçados e envergonhados. A comunicação social arregimentada nada informa sobre as ocorrências de Kinshasa, mas a verdade acaba sendo conhecida.
Em Moçambique, não se deseja derramamento de sangue de inocentes. Os que se preparam para mais uma guerra civil, que coloquem os seus filhos e familiares na frente de batalha. Que coloquem os seus sobrinhos, os cunhados na linha da frente.
A tradicional “carne de canhão” acordou e recusa-se a servir de pasto para balas.
O exercício que actualmente se verifica de negociações que não terminam e ensaios de novas negociações a outros níveis, visando alcançar um consenso que garanta a unicidade do país, a sua governabilidade e o recuo dos sinais de confrontação eminente é útil, embora desgastante. Tudo pela paz vale a pena.
É preciso dar a conhecer aos defensores do “status”, aos seus mentores, à “sacrossanta aliança de Dar es Salaam” que já não há espaço para mais manobras dilatórias ou de outro tipo. De maneira inequívoca, é preciso que saibam que a sua astúcia e passos de ginástica são conhecidos e determinadamente inaceitáveis para a maioria dos moçambicanos.
O moleque do colono acordou e recusa-se a ser moleque do neocolonizador, mesmo que este se apresente com a mesma cor de pele, ou seja da mesma etnia, religião e partido político.
Enganar com capulanas e camisetes, com demagogia e com mensagens de terror já deu o que tinha a dar.
Enganar com promessas de cargos e moageiras também “não anda”.
Enganar com guloseimas e bolsas de estudo, com cotas para a juventude e a mulher já esgotou a sua utilidade.
É todo um povo que se levanta e exige o que lhe pertence. Em democracia, o poder emana do povo, e os que não foram votados não possuem legitimidade para governar. É tão simples como isso.
Haverá senso para entender isso? Haverá patriotismo que supere agendas individuais?
Moçambique é da responsabilidade dos moçambicanos, e não de uma SADC inquinada.
Mugabe foi recentemente vaiado em Lusaka, para onde se deslocara em nome da SADC.
Sem interferências perniciosas e promotoras de guerra civil, queremos ver as lideranças políticas de Moçambique tomando a peito o que está em disputa e, com seriedade, debaterem até à exaustão todos os “dossiers”.
Saiam de mais uma ronda negocial com respostas e com decisões que tragam a dignidade de todo um povo.
Não queremos um Moçambique dos “empresários de sucesso”.
Chantagistas, jogadores de batota e fauna acompanhante deveriam já ter compreendido que o tapete está escorregando e que as “costas quentes” que possuíam estão esfriando a grande velocidade. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 27.01.2015