XIPALAPALA por: João de Sousa
O Presidente da República anda preocupado com a qualidade da educação. O Ministro Jorge Ferrão também. Eu e tantos outros como eu também. Samora preocupou-se. Fez a “ofensiva” em Janeiro de 1980, algo que hoje parece não ter razão de ser. Foi às escolas, tal como Nyusi fez agora. A Dr.ª Graça Machel colocou o dedo na ferida. A maioria dos nossos professores não sabe português. E quando não se sabe, dificilmente se consegue transmitir correctamente. Daí o descalabro.
A notícia do fórum organizado pelo Ministério de Educação para debater a qualidade de educação e a intervenção da Dr.ª Graça Machel fizeram a manchete dum jornal da nossa praça. Em letras garrafais e a vermelho, o jornal titulava: “O OLHAR DA GRAÇA MACHEL À EDUCAÇÃO”.
Mão amiga, que comprou o jornal, por saber do meu interesse por estas coisas de escrever e falar correctamente a nossa língua oficial, enviou-me o recorte, com o seguinte comentário:
“João, será que o editor desta publicação foi coleguinha de escola da Sr.ª Graça Machel para poder dizer publicamente ‘da Graça’ em vez ‘de Graça’ ou o domínio da língua e da comunicação deste editor é um exemplo concreto das razões alegadas pela Sr.ª Graça Machel?”
Dir-me-ão que errar é humano. Claro que é. Mas há erros e erros. Como admitir um erro desta natureza num prestigiado jornal da nossa praça? Onde estava o revisor, se é que essa figura ainda existe? Onde estava o chefe de Redacção? Onde estava o director de Informação? E o editor? Este erro passou por toda esta gente?
A propósito deste título pergunto-me, tal como uma amiga minha perguntou: será que eles (o editor do jornal e a Sr.ª Graça Machel) “escolaram” juntos? Claro que não. Então por que razão se trata a Dr.ª Graça Machel por “tu”? Pelos vistos a conjugação verbal de modo imperativo, principalmente quando se trata do uso de “tu” e de “você”, ainda é um problema.
Não pensem que os exemplos de escrever e falar mal a nossa língua oficial que tenho vindo a apresentar ultimamente nos meus escritos se circunscrevem ao que se passa no nosso espaço moçambicano. Na diáspora também se cometem barbaridades destas.
Sentado na minha sala de visitas, ouvindo um noticiário da RDP África, um locutor (que segundo alguns entendidos na matéria é a grande estrela lá do sítio) diz assim: “protesto” (em vez de pretexto), “irrupção” (em vez de erupção) ou “pratinência” (em vez de pertinência). E tudo isto em Portugal, terra-Mãe da língua oficial que usamos.
Por estas e por outras continuo a pensar que há por aí (cá e lá) muito boa gente a precisar de voltar aos bancos da escola primária, porque afinal “uma Nação educada é o bem-estar do amanhã”. Mas qual escola primária? Esta que temos, ou aquela que tivemos quando Samora Machel fez a “ofensiva política e organizacional”?
PS: Os livros de gramática rareiam nas nossas livrarias e quando os há são a preço que comem três terças partes do salário mínimo nacional. É chegada a altura de, com base nos benefícios da “Lei do Mecenato”, em prolongado e incómodo sono letárgico, o livro fundamental, tal como o é o da gramática, começar a beneficiar de preço subvencionado, assim como o pão, o arroz, etc. O livro é um produto de “primeira necessidade” e por esta importante razão deverá chegar a preço subvencionado pelo Estado às mãos dos consumidores.
CORREIO DA MANHÃ – 25.03.2015