A TALHE DE FOICE
Por Machado da Graça
As histórias são muitas e, infelizmente, estão permanentemente a chegar novas, cada uma mais trágica do que a outra.
Um dos últimos casos passou-se, segundo notícias publicadas, em Nampula: um chapa, cheio de passageiros, terá cometido alguma irregularidade e começou a ser perseguido por um carro da Polícia. Sem ter em conta que o chapa levava passageiros um dos polícias começou a disparar contra as rodas do chapa e rebentou um dos pneus. Como resultado disso o chapa capotou e vários passageiros foram parar ao hospital com ferimentos entre graves e ligeiros.
Ora, o que salta à nossa atenção, imediatamente, é a irresponsabilidade de se disparar contra as rodas de um chapa cheio de gente.
Mas isso é, creio eu, resultado de um problema muito mais fundo. E esse problema é o facto de a nossa Polícia ser formada como uma unidade militar, com instrutores militares, e ser comandada por militares.
Ora, a Polícia não é um órgão militar do Estado. É um órgão civil. E isso deve reflectir-se na formação que os seus agentes recebem e no equipamento com que são dotados para o exercício das suas funções.
Durante muito tempo (não sei se ainda continua assim) os polícias britânicos andavam nas ruas desarmados.
A sua eficiência derivava do respeito que os cidadãos lhes tinham.
Só em casos excepcionalmente graves eram chamadas as unidades policiais armadas que, depois de resolvido o problema, regressavam aos seus aquartelamentos, deixando as ruas aos colegas desarmados.
Não me recordo de ver em parte nenhuma do mundo civilizado os polícias, a que nós chamamos Polícia de Protecção, andarem na rua com armas de guerra. E, ao que tudo parece, com a cabeça cheia de guerra.
Quando um militar está numa guerra, em princípio, quem está do outro lado é um inimigo do seu país, como tal definido pelas autoridades competentes.
E o tratamento é um.
Quando um polícia actua, quem está do outro lado é um cidadão do seu país que poderá, ou não, ter cometido alguma infracção. E, se cometeu, essa infracção poderá ser ligeira, média ou grave. E os tratamentos terão de ser diferenciados, de acordo com as circunstâncias de cada caso.
Na nossa Academia Policial tem de se ensinar, com larga prioridade, que a Constituição do nosso país consagra o Direito à Vida e que, ao matar alguém, por motivos fúteis ou que não o justificam, o agente policial está a ir contra a Constituição e por isso deve ser pesadamente responsabilizado...
Com punições exemplares, amplamente publicitadas.
Mas tudo isto tem de partir de cima.
Tem de se substituir os comandos militares da Polícia por gente civil, o mesmo acontecendo com os professores das academias policiais. Que haja aulas de conhecimentos militares, especialmente para unidades especiais, é uma coisa. Que todos os polícias tenham uma formação essencialmente militar é outra totalmente diferente.
Voltarei a este tipo de temas oportunamente.
SAVANA – 01.05.2015