O ex-presidente Armando Guebuza não estranha a ameaça da Renamo de tomar o poder pela força em seis províncias de Moçambique, considerando que o principal partido de oposição “sempre funcionou com ultimatos”.
“A Renamo [Resistência Nacional Moçambicana] sempre funcionou com ultimatos”, disse, em entrevista à Lusa, o antigo Presidente de Moçambique, negociador do Acordo Geral de Paz, em 1992, e que assinou, a 05 de Setembro do ano passado, o Acordo de Cessação de Hostilidades, com o líder do maior partido de oposição, Afonso Dhlakama, para terminar 17 meses de confrontações militares na região centro do país.
O acordo foi alcançado a pouco mais de um mês das eleições gerais de 15 de Outubro, cujos resultados a Renamo não reconhece, propondo-se governar nas seis províncias no centro e norte de Moçambique onde reclama vitória eleitoral, num modelo de autarquias provinciais já rejeitado pela maioria parlamentar da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), e sob ameaça de tomar o poder pela força.
“Quando é que a Renamo não fez dessa maneira?”, questiona Armando Guebuza, que atribui a actual crise política à “impaciência” na busca de soluções para o país, mas apelando por outro lado para uma revisão de atitudes.
Para o ex-chefe de Estado, “o processo de concórdia nacional também passa por uma mudança de atitudes” e as reivindicações da Renamo não devem pôr em causa “o muito que se alcançou”, instando as partes a “lutar com paciência” para evitar a repetição de “erros de percurso”.
“Nós compreendemos as atitudes da Renamo”, afirmou o ex-presidente da República e da Frelimo, embora também defenda que o principal partido de oposição também tem de mudar o seu comportamento “naquilo que sabe que é inadmissível”.
Depois de uma guerra civil de 16 anos que devastou o país, e que Guebuza considera ser “o maior dos retrocessos” em quatro décadas de independência, o antigo estadista revisitou o Acordo Geral de Paz para concluir que há “outras formas de manifestar opiniões e de modo pacífico”, porque “o destino é comum e tem de se avançar”.
Na primeira parte da entrevista, divulgada pela Lusa há uma semana, o ex-presidente considerou que, em 40 anos de independência, Moçambique encontrou uma identidade, a capacidade de tomar as suas opções e até de cometer erros, apontando por outro lado a guerra como o maior dos retrocessos.
“O nosso maior sucesso foi termos adquirido uma identidade, podermos ter as nossas próprias opções e até cometer os nossos próprios erros”, declarou Armando Guebuza em entrevista à Lusa por ocasião dos 40 anos da independência de Moçambique, que se assinalam a 25 de Junho.
Para o ex-chefe de Estado, que cessou funções em Janeiro, ao fim de dez anos distribuídos em dois mandatos, tem sido através da aprendizagem dos erros que Moçambique encontra “soluções para os problemas gravíssimos que acontecem em qualquer país”.
Guebuza elencou também “a caminhada para o desenvolvimento” entre os principais sucessos das últimas quatro décadas, quando o país é agora desafiado pela descoberta de um dos maiores depósitos de gás natural do mundo.
Por oposição, a guerra que o país conheceu durante 16 anos é apontada como “o maior dos retrocessos” desde a independência.
“A guerra, a guerra, a guerra é inaceitável, sobretudo num mundo moderno como este em que vivemos”, declarou, lamentando que “pessoas morreram, a economia parou, famílias foram desfeitas”, mas salientando por outro lado “uma vitória”, porque o país “conseguiu vencer essa guerra”.
Lusa – 21.05.2015