CRÓNICA de: Jorge Ferrão
Professor Alberto Viegas, eterno amigo, voltou a ser recordado. As razões, unanimemente, são as melhores possíveis. Uma justa e apropriada homenagem para quem, em vida, sempre foi aquilo que a homenagem pretende dizer o que ele foi. Professor. Ensinar, educar e respeitar era a trilogia que o tipificava. Estas qualidades, afinal, serão sempre o seu maior legado nesse longo e honroso percurso. Eu queria ter estado presente a mais esta cerimónia. Não o fiz de forma física. Ainda assim, sinto, igualmente, que nunca estive ausente. Os ramos nunca se separam de suas árvores.
Em 2008 lançamos, na novíssima universidade Lúrio, que ele aprendeu a amar como sua própria universidade e sob a chancela da Texto Editores, a obra O que nos dizem alguns animais. Foi o início de uma profícua e cordial parceria. Pavimentamos, mesmo sem saber, o caminho para o surgimento de outras e tantas obras na cidade de Nampula. Por conseguinte, Professor e amigo Alberto Viegas também teve culpa e foi cúmplice por este movimento.
Me recordo do lançamento da obra como se ela tivesse ocorrido hoje. Final de tarde. Nos vestimos a rigor. Os grupos culturais traduziam, pelo som, aquilo que as almas não conseguiam aceitar. Ele, preocupado, vestiu-se bem mais a rigor que todos. Era o seu livro e sua obra. Num único tom e boleia trouxe toda a sua família para a sala magna da UniLúrio. Tudo lhe parecia familiar, porem e também surpresa. Se emocionou como qualquer criança da escola que ganha, pela primeira vez, um presente natalino!
Gostaria de ter guardado os extractos do seu e de outros discursos. Não eram, apenas, agradecimentos, mas a crença de que o mundo se faz de homens e livros, tal como um dia disse Lobato. Nampula, na circunstância, acrescentou a dança. Cantou, dançou e celebrou ícones. Alberto Viegas, Justino Cardoso e Warrila. Este último e sem hesitações fez o que de melhor sabe. Alegrar os corações. Justino desenhou e recriou o momento e, ao som de Warrila, nos fez acreditar que o mundo e Nampula, em particular, também vivem de cultura e paz.
Professor Viegas guardava alguns dos meus pobres textos editados na revista Indico. Aliás, ele adorava tanto a revista de bordo que até a coleccionava. Portanto, deveria ser a revista Indico que, de alguma forma, o deveria, igualmente, homenagear. Leitor e coleccionador mor da revista.
Neste momento de recordação genuína de um dos melhores e mais talentosos filhos de Nampula, optei por reeditar o texto sobre Lunga, sua terra natal, para que esse canto não fique perdido da memória individual e colectiva desta região.
Baía de Lunga
Se tivesse que eleger um local predilecto, na costa moçambicana, teria imensas dificuldades. Moçambique tem o raro privilégio de banhar-se, ano inteiro, nas águas mais cristalinas e quentes que o Indico oferecer. O recorte da costa nortenha é tão homogénea que parece ter sido pintado pela mão do pintor mais perfeito e competente. Os recortes da costa moçambicana só surgiram depois das restantes costas, no mundo, terem sido concluídas. Foi o regalo com o qual os Deuses presentearam este povo e seus visitantes.
Existem dezenas ou centenas de praias no litoral norte, casos da baia de Pemba e do arquipélago das Quirimbas, os mais conhecidos e referenciados. Existe a praia de Guludo eleita como das melhores praias do mundo pela imprensa internacional. Angoche e as Chocas-Mar são outras referências cujas visitas parecem obrigatórias. Poucos, porem, devem conhecer a baia de Lunga.
Bafejado pela sorte, ainda este ano, tive a rara oportunidade de sobrevoar todo o litoral norte, a baixa altitude e num avião de pequenas dimensões. Que coragem viajar em semelhante aparelho. De bolsa a tiracolo e procurando os melhores tesouros, vasculhei o mais natural, belo e profundo da nossa costa. O bom tempo e a boa vontade do piloto permitiram que visualizasse cenários fascinantes, deltas e pequenos lagos e lagoas que nunca saberei se são de água salgada ou doce. Verdadeiro privilégio. Em terra e no aeródromo histórico do Lumbo, que já merece outros cuidados, tomei a decisão fina. Elegi a baia de Mukhangu, em Lunga, como o local favorito e ideal. Pelas coordenadas ainda pode reconhecer as pontas Bajon e Pilane.
A baía de Mukhangu em Lunga, também conhecida por Mocambo, situa-se a sul de Mossuril. O rio Monapo, o mais extenso da província de Nampula, separa Lunga do distrito de Lumbo.
Para felicidade dos naturalistas o lugar continua quase intocado. Natureza pura e no máximo de sua plenitude. Para os turistas e exploradores de tesouros naturais, infelizmente, o acesso por terra não é dos melhores. Ainda assim, para quem, um dia, pretender visitar o local, terá de o fazer de barco. Saindo da Ilha de Moçambique essa corrida deve demorar noventa minutos, numa embarcação motorizada. Se for a vela, um pouco mais, porem o prazer será de outra dimensão.
Um conjunto de lagoas, de águas límpidas na época seca e, mais escura na estação chuvosa, provam bem ligações amorosas entre as águas com e sem sal. Os dois pequenos rios complementam o cenário. A cor das águas, ora num tom mais azul clarinho ou mais escurecido, não deixam que ninguém acredite que se trate de pura natureza. O local dispõe ainda de águas termais, na região de Naxilokottha, nem por isso muito distante.
Já existe uma proposta para a instalação de um Lodge. Desaparecera a mística, mas o local continuara divino a mesma. Os futuros proprietários querem, sobretudo, vender estrelas. A partir da baia se podem ver as constelações, bem melhor que em qualquer outro lugar do mundo. Oxalá Lunga saia do anonimato. Ganhara o turismo e a economia nacional.
Aproveito para felicitar a todos que tiveram a iniciativa de distinguir o Professor Alberto Viegas com o merecido título de honoris causa. Este titulo não fara dele pessoa diferente. Ele sempre o foi. Porem, ganhamos nós, cidadãos deste país, um encorajamento para continuar-mos a fazer deste país, um lugar melhor e mais próspero para todos.
WAMPHULA FAX – 18.06.2015