... da margem do Rio Pitamacanha Por: António Matabele - [email protected]
...de seu nome oficial – Escola Industrial e Comercial Neutel de Abreu – EIC era mais que uma abreviatura incompleta de uma grande marca que tinha o pendor de formar jovens para o mercado de trabalho, dotados de valências técnicoprofissionais susceptíveis de serem imediatamente absorvidos pelos empregadores públicos e privados ou estabelecerem-se por conta própria como empresários.
Para a EIC entravam jovens para fazerem, durante dois anos, o então chamado Ciclo Preparatório. Depois deste grau propedêutico, os alunos ingressavam no ensino específico técnico profissional, nomeadamente, o Curso Geral do Comércio, Curso de Serralheiro Mecânico, Curso de Formação Feminina, o Curso de Montador Electricista e o de Habilitação Preparatória para ingresso no Instituto Comercial e Industrial, que existiam somente dois em Moçambique, na Beira e na ex-Lourenço Marques.
Sem ser escola modelo, muitos Homens de hoje, profissionalmente bem sucedidos, espalhados pelo mundo, foram bem construídos na EIC.
No período coberto por esta reflexão foram seus mui competentes Directores, pela ordem cronológica que são enumerados, duas vetustas figuras, o Dr. António Zagalo e Dr. António Garrido Garcia, este último quadro sénior do Almoxarifado de Fazenda (Finanças), comissionado, temporariamente, para a área da Educação.
Um aluno que concluísse o Ciclo Preparatório na EIC jamais poderia transitar para o então denominado Segundo Ciclo dado no Liceu. Mas o contrário já era possível.
A EIC começou a funcionar em instalações próprias, construídas de raiz e inauguradas no ano lectivo de 1960/61.
A EIC veio aliviar, sobremaneira, o sofrimento de muitos pais que experimentavam a tristeza de, em virtude de serem economicamente débeis – era assim que o colonialismo eufemizava os cidadãos de parcos rendimentos – terem os seus filhos ainda meninos, de menos de doze anos, impossibilitados de prosseguirem os seus estudos secundários, dado que as propinas no ensino liceal eram caras.
Antes da EIC, a assim chamada escola técnica, funcionava nas instalações do Colégio semi-internato do Professor Dantas, alcunhado não sei porque, com o nome de Pisco. Pisco era homem de austera disciplina, sóbrio no falar, com métodos pedagógicos algo arcaicos, mas que resultavam em pleno quando se tratava de meninos com alguma propensão para serem malandrinhos.
A EIC funcionava segundo o mesmo diapasão em termos de moral, disciplina, prática do desporto, o bom convívio possível entre os estudantes apesar do racismo que caracteriza toda a sociedade moçambicana de então.
Apesar do manto do colonialismo e do fascismo que tudo obstruía, na EIC era-nos ensinado a sabermos esgrimir a enxada para a machamba do amanhã como guarda-livros (contabilistas), escriturários, serralheiros, mecânicos, electricistas e professoras educadoras, no caso vertente das meninas.
A par das disciplinas técnicas, tínhamos as gerais. As disciplinas curriculares eram condimentadas por aulas de moral e educação cívica, onde nos eram ministrados conteúdos de moral, ética, coleguismo e deontologia, regra geral dadas por um padre católico. De entre estes padres destacou-se pela sua forma de saber estar com a juventude o Padre Agostinho Rodrigues.
Na EIC havia bons executantes do desporto – atletismo, natação, futebol de salão, basquete, vólei, aeromodelismo – de tal maneira que o Liceu levava sempre “tareia” nos confrontos desportivos com aquela.
Sem chegarem a raiar no banditismo, havia, na EIC, os meninos mandriões, que faziam os cinco anos lectivos em 10, porque chumbavam pelo menos uma vez em cada ano lectivo.
Assim, alguns saiam dos bancos da escola para a tropa, aos 21 anos de idade.
A EIC era, no bom sentido da palavra, um autêntico santuário de lindas e bem prendadas donzelas, que à hora do intervalo maior e da saída era um incessante rodopio de rapazes do Liceu, militares e jovens em geral, todos buscando uma namorada e, quiçá, a mulher, mãe dos seus filhos e companheira até que a morte os separasse.
Por ocasião dos 60 anos de existência daquela escola, parece-me não estar a pedir muito que a Direcção Provincial da Educação e do Desenvolvimento Humano, o Conselho Municipal de Nampula e os antigos estudantes organizassem uma festa com circunstância e sem pompa para celebrarem, condignamente, a efeméride.
WAMPHULA FAX – 29.07.2015