Desde as primeiras horas, avisámos, aqui, neste espaço, que algo de muito grave se estava a passar com a famigerada Empresa Moçambicana de Atum, abreviadamente designada por EMATUM.
Dissemos e provámos com documentos que na EMATUM havia tudo: branqueamento de capitais, associação criminosa, abuso de poder, extorsão, incluindo um programa de embrutecimento generalizado de toda uma sociedade.
Estava claro, desde o primeiro dia da sua criação, que a EMATUM não visava capturar atum, mas, sim, capturar o Estado, para o colocar ao serviço dos agiotas amigos dos governantes corruptos com quem dividem os lucros.
O relatório lavrado pela Ernest & Young indica que a escritura pública da EMATUM decorreu no cartório privado do Ministério das Finanças. O pacto social da EMATUM indica que os Serviços Secretos subscrevem 33% do capital social da empresa. Ninguém conseguiu explicar o envolvimento da Polícia secreta moçambicana, que actualmente funciona como serviço de inteligência da Frelimo, contra Moçambique e os seus cidadãos que não são da Frelimo.
Vamos ao financiamento: são cerca de 850 milhões de dólares americanos que foram contratados por vias pouco claras, alegadamente para comprar barcos de pesca e de patrulha. Não cabe na cabeça de nenhum cidadão racional que 30 barcos de pesca do porte dos da EMATUM tenham custado 850 milhões de dólares. Isso é uma mentira grosseira.
Analisemos a maturidade dos juros e as suas taxas. O Estado moçambicano – representado pelos senhores Armando Guebuza, então Presidente da República, Manuel Chang, ministro das Finanças à data dos factos, e o então ministro da Defesa, Filipe Nyusi (que dava a cara pelos patrulheiros para a Marinha) – assumiu a contratação do “bond” na praça europeia, com um juro pouco claro, oficialmente de 6,7%, a um período de sete anos. As agências internacionais credenciadas em operações financeiras falam de juros de 8,5%. Se assumirmos a taxa que o Governo aceitou, o Governo deve pagar qualquer coisa como 30 milhões de dólares americanos por ano, a partir de 11 de Setembro próximo, segundo o contrato.
Ora, estes juros são um verdadeiro absurdo para a dívida contratada e no período em que o Estado se comprometeu. Várias agências de notação financeira indicaram que uma contratação semelhante, a um privado, onde o risco é maior, a taxa de juro nunca é superior a 2,5%, ou seja, menos que a metade do que o Estado se propôs a pagar. A possibilidade de se arranjar juros razoáveis e com prazos leves torna-se ainda maior porque o avalista é um Estado, logo diminui-se o risco de se recuperar o dinheiro. Mas, pela forma como o negócio foi feito, fica claro que a intenção de Guebuza, Chang e Nyusi não era de criar viabilidade da empresa, mas, sim, encontrar a maior quantidade de dinheiro possível.
Até aqui ainda não está claro qual é o banco que, de facto, deu o dinheiro. Há os suíços do Credit Suisse International, o PNB Paribas e os russos do VTB Moscovo. O relatório da Ernest & Young fala de comissões de 13,6 milhões de dólares só por operações financeiras.
Que tipo de negócio é este?
Uma investigação aturada do “Canal de Moçambique”, cuja primeira parte publicámos aqui, constatou que a EMATUM, SA, empresa criada em nome do Estado pelo então Presidente da República Armando Guebuza, o ex-ministro das Finanças Manuel Chang e Filipe Nyusi, então ministro da Defesa, tem uma outra sede na capital da Holanda, Amesterdão.
Mas, lá, a empresa está registada de uma outra forma.
Chama-se “Mozambique EMATUM Finance 2020”. Está localizada no seguinte endereço físico: Herikerbergweg 238 Luna Arena.
Tem a caixa postal 1101 CM, no Bairro Amstell. Segundo os registos da Câmara de Comércio de Amsterdão, a EMATUM está registada como empresa privada, com o número 58587314.
Estes dados podem ser consultados através do motor de busca comercial holandês “Drimble”.
Segundo os registos depositados em Amsterdão, na Holanda, a “Mozambique EMATUM Finance 2020” faz parte de uma “holding” internacional de finanças denominada “TMF Group HoldCo BV”, com a mesma localização que a EMATUM.
A EMATUM é, portanto, um terceiro nível dentro da estrutura corporativa da “TMF Group”. Em linguagem corporativa holandesa, equivale a um escalão mais abaixo da filial.
Nada mais cristalino do que um verdadeiro negócio de agiotagem internacional, que conta com a participação dos nossos bandidos de casa. Não deixa de ser interessante toda a tentativa falhada de Filipe Nyusi se distanciar desta burla. Mas, por mais operações cosméticas que faça – que incluem instruir Maleiane para dizer, agora, que a dívida é insustentável e deve ser renegociada – nada o pode ilibar das responsabilidades neste crime.
Quanto a nós, é hora de a senhora Beatriz Buchile, no exercício das suas funções de Procuradora-Geral da República, ser uma pessoa séria e parar de perseguir ladrões de galinhas, e seguir a recomendação parlamentar de prender preventivamente Armando Guebuza e Manuel Chang. Porque, caso contrário, e diante destas provas todas, ficamos com a impressão de que a senhora Buchile também faz parte do “pacote EMATUM” e de que a sua nomeação visa mesmo acobertar os ladrões. Deixar o caso da EMATUM morrer sem culpados e sem responsabilizar ninguém só demonstra falta de dignidade e falta de respeito próprio. Ou a senhora Procuradora-Geral da República manda prender toda esta corja de mafiosos, ou a senhora Buchile dá uma conferência de imprensa a informar-nos qual foi a sua parte neste negócio. Porque assim não podemos continuar.
Se lhe pesa a consciência de mandar prender estes ladrões, então demita-se, que fará um favor à nação.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 24.06.2015