O Presidente da República realizou uma reunião com vários quadros envolvidos na promoção do desenvolvimento agrícola.
O desenvolvimento incluindo agrícola, nunca depende de um único factor, ela resulta da combinação de vários ingredientes, tal como um prato saboroso se faz combinando vegetais, alho, cebola, tomate e outros componentes.
Como então cozinhar a promoção da agricultura?
Fazemos face a uma concorrência desleal devido aos acordos mal pensados na SADC.
A livre circulação de produtos agrícolas na região da comunidade apenas beneficia a agricultura sul-africana, altamente subsidiada e permitam acrescentar, essencialmente branca e bóer, uma vez que desde a vitória em 1947 do partido Nacionalista, a terra se confiscou aos não brancos, se criaram os ditos bantustões, em zonas sem água e sem terra. Precisamos desse tipo de bens?
Poderá o produtor moçambicano sem crédito e seguros agrícolas, sem casas agrárias verdadeiras, sem meios de processamento e comunicações muitas vezes difícil fazer face à concorrência do vizinho, que além do mais oferece um incentivo para as exportações? Que livre circulação?
Precisamos de crédito e seguros agrícolas, se necessário com garantia do Estado, mais valeria isso do que pescar atum no lodo das docas.
Não creio que 20% de juros possam apoiar a agricultura, sobretudo havendo o risco de secas e inundações e zero de seguros contra as intempéries. Obviamente que falar em apoiar o produtor agrícola sem começar por responder a este item essencial não passa de um slogan como qualquer outro e bem vazio.
O Presidente Nyusi visitou em Namacurra uma fábrica de processamento do arroz, com uma capacidade de 20.000T, nova mas parada faz alguns meses, porque não se importou uma peça estragada.
Conheço várias fábricas novas que nunca funcionaram na prática, a quem retiraram para não se sabe onde, os tractores, camiões oficinas, camiões cisterna, motocultivadoras, charruas todos os equipamentos que deveriam ir tanto para as fábricas como para as suas cinturas, destinadas aos técnicos médios e superiores que desejassem cultivar a terra e aos camponeses já capazes de ascenderem à mecanização.
Para que serve então o discurso sobre o desenvolvimento agrícola?
No final da década de 70 e inícios de 80 haviam-se criado as Casas Agrárias, onde haveria insumos, máquinas e técnicos extensionistas para apoiarem os camponeses a evoluírem nas suas práticas. Parece-me que todas feneceram e o que resta não passa de uma caricatura tão barata como inútil.
Quantos agrónomos e técnicos médios agrícolas, veterinários existem nos distritos? Não pulula um número bem superior nos corredores e gabinetes de ministérios? Quantos os técnicos florestais que instalados nos distritos zelam pela conservação e reflorestamento? Como levar o conhecimento às bases se os portadores dele vivem no ar condicionado da capital do país e, um ou outro, quanto muito numa sede provincial?
Repito, para que serve o discurso mais que repetido sobre o desenvolvimento agrícola? Quem acredita nele?
Construíram-se silos em diversos locais. Óptimo. Quem compra o que deve ir para os silos? Quem processará o que lá se encontra? Silos vazios promovem a produção agrícola? Temos que esperar que Bretton Woods e os estrangeiros dêem um destino e vida aos silos? Qual a manutenção para um silo vazio ou uma fábrica parada? Onde vivem os gestores desses empreendimentos, quem controla o que fazem?
A produção, testagem e disseminação de sementes com qualidade faz parte essencial do progresso agrícola.
O INIA no Ministério da Agricultura cumpria esta tarefa com muita qualidade. Entre as sementes provadas de milho encontrava-se a variante Matuba, muito desejada, houve ainda sementes de qualidade como a Angónia, Mocuba, etc.
A Matuba hoje compra-se no Quénia, as outras evaporaram, tal como os quadros e investigadores do INIA, lá vão bons anos. Reforma-se investigadores, com muita qualidade apenas porque atingiam os 65 anos de idade ou trinta e cinco de serviço? Este o único critério, se sim, boa estupidez!
Não precisamos então do saber e saber fazer, apenas da idade e anos de serviço, por mais incompetente e incapaz que se mostre o tal quadro.
Então há que insistir na pergunta, para que servem os discursos sobre o desenvolvimento agrário? Para embalar criancinhas enganar o freguês, neste caso o cidadão, o camponês?
Precisamos de sementes aqui produzidas, necessitamos de cessar a importação de sementes de um modo geral, mas até se pode importar para testar e verificar que mudanças operar para melhor servir a nossa agricultura.
Fala-se muito de mecanização agrícola. Sim e com certeza, mas:
Porque não começar pela tracção animal, ensinando o camponês a treinar o gado, alimentá-lo na época seca, mostrar onde recorrer se detecta alguma doença?
Passar depois para a motocultivadora, mas garantindo o combustível na localidade e o mecânico onde reparar, não vá o desgraçado percorrer centenas de quilómetros para a assistência.
O tractor, a carrinha seguem-se no processo de crescer de pequeno para grande, no calo já adquirido com máquinas, mas de novo haver pelo menos em cada distrito um camião oficina e claro o óleo e o diesel ali na localidade.
Depois vêm os armazéns, silos, fábricas de processamento.
Tudo requer o saber e o saber fazer. Menos secundárias e pré-universitárias nos distritos e mais escolas médias de agricultura e veterinária, menos universidades nas províncias ensinando direito e gestão, mais escolas superiores de agricultura e veterinária.
O Estado conhecendo as prioridades do desenvolvimento e neste caso o futuro do ouro verde deve orientar e impor sempre que necessário a natureza e objectivos dos estabelecimentos de ensino post primários e universitários. Não se trata de ditadura, mas de racionalidade e necessidade nacional.
A verdadeira riqueza encontra-se no conhecimento. A seca e a inundação não destroem o saber e saber fazer, as variações de preços não afectam a nossa inteligência. Quadros médios e superiores devem com o apoio do Estado instalarem-se nas zonas rurais, um T2, um tractor e alfaias, uma carrinha ou camião e um armazém. Pagam em 20 anos com juro entre 0 e 5%, em contrapartida devem fazer a extensão do conhecimento aos vizinhos, comprar-lhes a produção nos armazéns, progressivamente processá-los e com os demais produtores locais partilhar as mais-valias. Instalar o conhecimento no campo e não nas cidades e escritórios.
Para isto o meu abraço e empenho para o sucesso,
P.S. Em quem devemos confiar para proteger os interesses dos cidadãos? Leio nos jornais que a Procuradoria está a gastar rios de dinheiro a comprar casas, para quem não fazia parte dos sem-abrigo. Fizeram-se compras sem concursos. Negociatas entre amigos? A prioridade da Justiça está em albergar luxuosamente quem já vivia bem? A opacidade e ignorância das normas escancaram as portas de todo o tipo de especulação, desprestígio e desconfiança. Por favor, o meu abraço a quem puser o guizo ao gato.
SV
O PAÍS – 25.08.2015