A ocorrência de uma eventual falha catastrófica na barragem de Kariba, localizada no rio Zambeze, fronteira natural entre o Zimbabwe e a Zâmbia, poderá colocar em risco a vida de cerca de três milhões e meio de pessoas e destruir mais de 40 por cento da capacidade de produção de energia hidroeléctrica na região da África Austral, revela um relatório recente sobre o assunto.
Elaborado pelo Instituto de Gestão de Risco da África do Sul e intitulado Impact of the Failure of the Kariba Dam (Impacto da Falha da Barragem de Kariba, tradução em português), o relatório adverte que no caso da ocorrência de uma falha catastrófica na barragem poderão ser libertados 181 bilhões de metros cúbicos de água. Oito horas mais tarde, esta parede de água poderá atingir e destruir a barragem de Cahora Bassa, na província central de Tete, em Moçambique.
O documento refere que a barragem de Kariba criou a maior albufeira existente no mundo inteiro. Inaugurada em 1960, aquela infra-estrutura é de vital importância para suprir a demanda de energia no Zimbabwe e Zâmbia. A mesma possui uma capacidade instalada para a produção de 1.839 megawatts (MW). Mais a jusante do rio Zambeze encontra-se a barragem de Cahora Bassa com uma potência máxima de 2.075 MW.
No entanto, a massa de água que jorra das comportas da Barragem de Kariba provocou um desgaste na parte inferior da rocha onde assenta aquela infra-estrutura. Inicialmente, a água tinha apenas uma profundidade de 10 metros na base da barragem, mas a erosão acabou aumentando para 90 metros, provocando um desgaste na rocha próxima das fundações da barragem.
Já foram elaborados vários planos para remediar esta situação, aumentando o tamanho do lago, algo que envolverá a movimentação de 300.000 metros cúbicos de rocha. Além disso, serão realizados vários trabalhos nas comportas da barragem e inspeccionado o betão para analisar o grau de danos infligidos na sua estrutura como resultado das reacções químicas que ocorrem naturalmente. Para a conclusão deste trabalho serão necessários cerca de dez anos, porque apenas será possível reparar uma comporta de cada vez.
O relatório também faz referência a um artigo publicado no jornal Business Day a 17 de Fevereiro último, afirmando que 'o consenso dos engenheiros de todo o mundo é que Kariba tem uma vida útil de três anos se não for feito nenhum trabalho para a sua reparação imediata. Segundo o mesmo jornal, já foram mobilizados cerca de 300 milhões de dólares norte-americanos junto dos doadores internacionais para a execução dos trabalhos de reparação, que deverão ser concluídos dentro de uma década.
Falando em entrevista a AIM, a autora do relatório, Kay Darbourn, advertiu que a probabilidade da ocorrência de uma falha catastrófica da barragem de Kariba aumenta a medida que o tempo passa sem nenhuma reparação. Ela frisou que, se a actual seca continuar haverá menos riscos, mas questiona se a barragem será capaz de lidar com um aumento drástico do volume de água durante a estação chuvosa.
Esta opinião é partilhada por Richard Beilfuss que, num relatório sobre mudanças climáticas para a organização não-governamental International Rivers, afirma que 'inundações extremas e mais frequentes ameaçam a estabilidade e operação segura de grandes barragens. Se barragens tiverem sido 'subdimensionadas' isso poderá traduzir-se em graves riscos de segurança para as milhões de pessoas que vivem ao longo na bacia '.
Embora Darbourn não seja especialista em engenharia, ela possui uma grande experiencia na área de gestão de riscos, que envolve a identificação, avaliação e tratamento de riscos e oportunidades.
Algumas das suas propostas poderão ser implementadas com uma relativa facilidade e com um potencial para salvar milhares de vidas humanas, tais como envio de mensagens de texto SMS e uso de redes sociais como Twitter e Facebook para avisar os residentes com a devida antecedência sobre eventuais ameaças ou perigos. Por exemplo, já existem serviços internacionais de SMS que avisam as pessoas sobre o risco de tsunamis no Oceano Pacífico.
Darbourn disse a AIM que ainda não possui informações sobre a data provável para o início dos trabalhos de reabilitação. Por isso, lamentou a falta de resposta para os seus pedidos de informações endereçados a autoridade do Rio Zambeze e ao Banco Mundial.
Darbourn revela uma preocupação profunda com a devastação humana e económica que será causada por uma eventual falha catastrófica na barragem de Kariba. Isso ficou claro no tom da sua voz quando ela ressaltou 'não se pode permitir que isso aconteça'.
jhu/SG/FF
AIM – 08.10.2015