Editorial
O Presidente da República, Filipe Nyusi, em tão pouco tempo que assumiu o leme da governação do País, habituou-nos a uma pessoa afável, atenciosa, que até se deixa fotografar ao lado do Mr. Bow ou de qualquer comerciante anónimo.
Todavia, obriga-nos a pensar que tudo isto tem um duplo sentido. Há sempre lados escondidos.
Ou seja, o essencial da mensagem de Filipe Nyusi inclui duas atitudes antagónicas. Por um lado afirma com veemência que é pela paz e reconciliação nacional, por outro lança fogo ao barril de pólvora que é este Moçambique actual, desde que teve em Armando Guebuza o alto magistrado da nação.
Eventualmente, a melhor maneira de definir Filipe Nyusi seria dizer que se trata de uma pessoa que tem uma névoa de mistério intrigante, desafiante. É que não é possível que no seu discurso inaugural, como Presidente da República, haja dito que o seu Governo há-de ser “prático e pragmático. Com uma estrutura o mais simples possível, funcional e focado na resolução de problemas concretos do dia-a-dia do cidadão, na base da justiça e equidade social. Será um Governo orientado por objectivos de redução de custos e no combate ao despesismo” e no terreno mostrar o oposto.
Não é possível que o Chefe de Estado tenha o mesmo estribilho de que é pela paz e reconciliação e que, acima de tudo, está disposto a dialogar com Afonso Dhlakama para que essa paz se efective, quando, por outro lado, manda atacar o seu mais directo interlocutor para a paz.
Nós temos razões, até de sobra, para dizermos que Filipe Nyusi é que manda atacar a Renamo e o seu líder, Afonso Dhlakama. É que não conhecemos nenhum outro alto magistrado da nação moçambicana a não ser Filipe Nyusi. Não conhecemos nenhum outro comandante- em- chefe das Forças de Defesa e Segurança de Moçambique a não ser Filipe Nyusi. A não ser que Filipe Nyusi queira dizer que foi desobedecido pelo exército!?
Se a Renamo diz constantemente que quem a ataca são as Forças de Defesa e Segurança, não precisamos nós de nenhuma bola de cristal para decifrarmos que quem mandou as tais Forças de Defesa e Segurança atacar foi Filipe Nyusi. O que nos preocupa, no entanto, é que esta demonstração de força, por parte do Governo, não nos vai levar a lado nenhum a não ser empobrecer cada vez mais este pobre País.
Já aqui o dissemos que a aparente paz que se vive em Moçambique assenta sobre pilares débeis, corroídos por desconfiança, ódio, exclusão social e tantos outros males e que só espera por um simples safanão para cair.
Não queremos aqui dizer que foi o Governo da Frelimo que mandou alvejar, a tiro, o secretário-geral da Renamo, Manuel Bissopo. Mas temos razões de sobra para desconfiarmos do Governo da Frelimo.
É que o Governo liderado por Filipe Nyusi já nos deu motivos fortes para o desconfiarmos. Tudo o que diz é meia verdade. Desmintam-nos se estivermos enganados. Não foi o Governo da Frelimo que mandou o exército cercar a residência do líder da Renamo, na Beira? Não foi o Governo da Frelimo que mandou cercar a sede da Renamo, em Maputo? Então, quem mandou alvejar Manuel Bissopo? Quem, além da Frelimo, quer mal a Renamo?
Já ouvimos discursos de incitação à violência de alguns ministros do Governo de Nyusi, tipo Basílio
Monteiro, a dizer que “qualquer ameaça da Renamo, por mais mesquinha que pareça, vai ter a melhor resposta da nossa parte.” Quem mandou o ministro do Interior dizer isto? De que melhor resposta estava ele a falar? É que nos consta que a vida de Manuel Bissopo foi atentada quando acabava de dar algumas palestras aos membros da Renamo. E nessas palestras, evidentemente, Manuel Bissopo disse que a Renamo iria governar às províncias onde venceu a eleição. A Frelimo, em diversas ocasiões, disse que tal discurso incita à violência. Em que ficamos?
É irrefutável que nos últimos tempos, a Associação dos Combatentes da Renamo, em Maputo? Então, quem mandou alvejar Manuel Bissopo? Quem, além da Frelimo, quer mal a Renamo?
É irrefutável que nos últimos tempos, a Associação dos Combatentes da Luta de Libertação Nacional (ACLLN) tem vindo a fortalecer a sua posição de tal sorte que até supera a organização-mãe, a FRELIMO. Tem sido ela a ventiladora dos valores mais retrógrados da diplomacia de canhoeira. De onde vem tanta força?
Afinal quem manda na Frelimo?
É perturbante a indiferença e o disfarce com que as autoridades governamentais deste País lidam com questões sensíveis de manutenção da paz e estabilidade política. Filipe Nyusi colocou alto a sua fasquia de promessas aquando do seu discurso inaugural. A sua lua de mel com o povo moçambicano já acabou, até foi longe demais. Um ano. É hora de mostrar trabalho sob risco de alicerçar, de uma vez por todas, as
palavras daquele que um dia disse que políticos bons são como discos voadores. Todo mundo diz que viu, mas ninguém tem como provar.
DN – 22.01.2016