Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Grandes “deficits” de moçambicanidade atrapalham tudo.
Compatriotas, enquanto não nos considerarmos e nos tratarmos como tal, jamais fará sentido, falar de pátria e de unidade nacional.
A exclusão feroz dos que pensam diferente denota uma posição abertamente contra o discurso oficial.
E contra isso não há argumento que resista.
Cada vez que os programas governamentais falham, não que, em si, sejam mal concebidos, ou coisa que se pareça. Muitas das vezes o insucesso aparece quando se nomeiam gestores errados dos projectos. Quando os afilhados e amigos é que dominam na administração pública e no próprio aparelho de Estado, estão encontrados os ingredientes para o falhanço.
Qual é a empresa pública sustentada pelo OGE que apresenta balanço positivo? Como se pode continuar a considerar que existem moçambicanos mais importantes que os outros? Como se pode entender que a maioria pobre vivendo na indigência seja continuamente ludibriada nos seus direitos políticos e económicos?
Se cada passo dado é para excluir e mentir, fica tudo mais difícil.
Nos tempos difíceis da pós-Independência houve um período em que os moçambicanos acreditavam em palavras como “solidariedade” e não se cansavam de ouvir sobre os benefícios da unidade nacional. O tempo passou, e os que assim falavam e promoviam tornaram-se em senhores, de igual modo como acontecia no tempo colonial. Foi aí que as coisas viraram, e cimentou-se a ideia de que a nova elite é proprietária do país.
Paulatinamente, de modo quase que imperceptível, a elite política transformou-se em elite político-financeira, sem que ninguém a questionasse ou travasse.
Com o edifício montado segundo a sua concepção, assaltou-se o sistema judicial e o de administração da justiça. De gente comum que deveria responder pelas suas acções, estes moçambicanos de “sangue azul” imunizaram-se e ganharam uma visível impunidade.
Proprietários em exclusivo da terra e do mar, dos vales e montanhas, ganharam novos gostos, e a diferença com seu passado não tardou a revelar-se. Esquecidos estavam os tempos da “guerrilha” de inspiração comunista ou maoísta.
Agora estão metamorfoseados em condutores de carros de alta cilindrada. Jaguar, Benz, Range Rover e whisky de “50” anos é o que disputam entre si, quando não estão passando férias em Miami.
E estes compatriotas enriquecidos das formas mais estranhas que se possam imaginar não são dados a solidariedade. Sabem apoiar organizadores de marchas para impedir que o poder mude de mãos. As senhoras “generosas” que distribuem camisetes com “motivos nobres” são as mesmas que, na calada da noite ou em pleno dia, participam na montagem e execução de fraudes eleitorais.
Os jovens voluntariosos que frequentemente se juntam em marchas “superiormente” concebidas e organizadas são os mesmos que, volta e meia, servem ou actuam como agentes de brigadas de choque contra a oposição ao regime do dia. Existe “solidariedade ou união” para travar progressos ou desenvolvimentos democráticos, mas não se verifica o mesmo quando milhares de pessoas sofrem os efeitos de uma grave estiagem que afecta algumas regiões do país.
Um comportamento que a elite predadora exibe é de todo contrário ao que se poderia esperar de quem diz que está preocupado com o povo. As últimas aquisições de viaturas de luxo pelo Governo colocam em causa as suas declarações de querer seguir uma política de austeridade.
Faltam recursos para intervenções de vulto em sectores sociais muito importantes, mas, por outro lado, acumulam-se evidências de que a agenda é rapidamente abocanhar recursos públicos em benefício próprio.
Agora, que também se acumulam provas de que a mudança de PR está a provocar algumas fricções entre “camaradas”, tudo por causa do acesso às regalias que o poder oferece, continuamos a verificar que a solidariedade anda muito longe. Aqueles que ofereciam Mercedes Benz ao antigo PR poderiam mostrar que sentem o sofrimento de milhares de compatriotas que não têm alimentos nem água potável.
Um país só se transforma em nação com sentido de pertença pelos seus e com solidariedade activa. Não falamos daquela solidariedade mediatizada feita para se atingir fins inconfessáveis.
Nem iniciativas filantrópicas politizadas vão resolver os nossos problemas, como sabemos e temos visto ao longo dos anos.
Quem não se recusa a aprender com o seu passado corre o risco de repetir erros com consequências graves.
Andamos fingindo que não existem problemas, ou que aqueles que existem são provocados pelos outros, mas, na verdade, estamos mentindo, porque é a nossa obtusa postura de excluir os outros que provoca problemas.
De pouco valerá ser escandalosamente rico quando a maioria pobre invadir os nossos condomínios de luxo e os nossos palacetes.
Isto pode parecer metáfora, mas ninguém se esqueça que pode acontecer quando menos esperemos. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 01.02.2016