Centelha por Viriato Caetano Dias ([email protected] )
Os que bons conselhos dão às vezes fazem-me rir por ver que eles mesmos, são incapazes de os seguir. Poeta António Aleixo
Quero rapidamente fazer uma advertência. Há um mal-entendido e algum oportunismo à mistura em relação as minhas reflexões. Como é do conhecimento da maioria das pessoas, escrevo estas centelhas assinando pelo próprio nome, não sendo vinculativas à instituição a que pertenço. Aliás, as instituições têm seus porta-vozes ou adidos de imprensa e eu não sou nem uma nem outra coisa. Eu não posso dizer senão aquilo que eu próprio penso, fecundado em factos e provas, algumas das quais indefectíveis. Não escrevo por encomendas. Não escrevo por coação. Não escrevo para granjear simpatias de quem quer que seja. Sou autêntico e frontal, o que, neste mundo de abelhas humanas, recomendam prudência redobrada, ter olhos nas costas e dormir como um crocodilo, sempre de olhos abertos. Por isso, estou atento a qualquer tentativa de mordaça e lutarei de forma didáctica e dentro dos preceitos legais contra os meus detractores.
Diz o brocardo popular que o crime não compensa. Em Moçambique, nos dias de hoje, este ditado parece fazer pouco sentido. Os presos têm regalias do que aqueles que são amigos do sossego e da boa ordem. Os nossos presos são transportados em carros de luxo com sirenes barulhentos para afastar, coercivamente, da faixa de rodagem os automobilistas. São acompanhados por um forte aparato de segurança. Não enfrentam congestionamentos nas vias públicas. Comem sem produzir patavina (SÃO IGUAIS AOS PÁSSAROS: NÃO SEMEIAM, MAS TAMBÉM NÃO MORREM DE FOME). Dormem em lugares seguros e em poltronas quase medicinais. Não pagam impostos. Têm acesso médico e medicamentoso gratuito. Os serviços de água e de electricidade são “mahala”. A única coisa que os presos não podem ter é a liberdade. Essencialmente a liberdade de deambular neste “Vale de Lágrimas” e com o risco de serem sequestrados ou mortos por uma bala perdida.
Em contrapartida, o pacato cidadão que não comete e nunca cometeu um único delito, que seria incapaz até de matar uma mosca, é transportado em sucatas sem estatuto de género humano, como se fossem animais irracionais. Estes também merecem o
primoroso respeito da sociedade.
Vulgarmente conhecidos por “MY LOVE”, esses improvisados meios de transportes semi-colectivos de passageiros não oferecem conforto nem condições de segurança. Para os passageiros religiosos do “MY LOVE”, as orações durante o seu trajecto não cessam até à chegada ao destino. Para alguns polícias de trânsito, parasitas, o “MY LOVE” é uma mina de diamante.
Ou seja, é uma fonte de extorsão.
Parasitas que vivem às custas do sofrimento do nosso povo. O engarrafamento de trânsito, para o pacato cidadão, é o “pão nosso de cada dia.”
Para conseguir uma razoável refeição, o pacato cidadão tem de trabalhar duro e às vezes durante longas horas de actividade forçada, em jejum. É terrível a vida de pobre.
Dorme em ramadas permeáveis ao frio, calor e chuva. Para o pacato cidadão, os impostos e as coimas são uma obrigação para sustentar as mordomias dos presos. Para conseguir pagar água e luz, o pacato cidadão tem de fazer uma autêntica ginástica de vida.
Nestas condições, pode-se afirmar sem reserva alguma que vive-se melhor estando preso do que livre.
Tenho que concordar, a esse propósito, com Gandhi quando diz “A prisão não são as grades e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão; é uma questão de consciência”. De facto, as nossas cadeias são uma academia do crime organizado. São viveiros da instabilidade. Não há correcção possível, porque falta políticas para o efeito. Entra-se suspeito ou ladrão de “pilha-galinhas” e sai-se criminoso.
Em países não muito distante do nosso, os presos produzem para comer. Não comem para produzir o crime. Produzem para suster as suas próprias necessidades básicas. Já agora, pode-se questionar o seguinte.
O que impede os nossos serviços penitenciários de produzir energia eléctrica através de excrementos dos reclusos? O que impede os nossos serviços penitenciários de abrir machambas e colocar os reclusos a produzir comida? É uma realidade irrefutável que, entre os presos, existem aqueles que possuem talento e arte, então, porque não aproveitar essa mão-de-obra? Porque é que o país continua a gastar rios de dinheiro com presos quando devia anestesiar as fomes das crianças desamparadas?
Penso que estamos a construir no país dois tipos de calabouços. O primeiro, físico, é onde os prevaricadores cumprem penas ou aguardam julgamento. O segundo, abstracto, não tem grades, não tem tribunais, não tem juízes, não há sentença. É a prisão espiritual, “…o mais severo de todos os cárceres.”
Mas o país não precisa de nenhum dos dois arcabouços. O país precisa de paz. Só com a paz efectiva e o bem-estar comum pode-se construir um país sem prisões. ZICOMO (Obrigado e um abraço nhúngue).
WAMPHULA FAX – 21.03.2016