Canal de Opinião por Adelino Timóteo
O nosso país está a correr com os calções na mão, devido ao nosso estado de aflição.
Em tão pouco tempo éramos o Eldorado, mas esbanjámos tudo o que tínhamos, em excessos. A corrida que agora lançamos para o FMI é sintomática de que o nosso país está à rasca, portanto de rastos. O nosso país está a bater no fundo do poço.
Não esperava que fossemos tão cedo pedir de joelhos, pois, durante os últimos dez anos, a palavra que mais caracterizou os discursos dos nossos governantes foi a auto-estima.
Agora que o nosso país corre desenroupado, imitando a composição perfeita de um galo depenado, dá para reflectirmos a ver onde foi que mais nos excedemos, a tal ponto de a previsão indicar que, este ano, teremos o crescimento do produto interno bruto mais baixo dos últimos quinze anos.
Esbanjámos muito na oratória, nos discursos elogiosos a uma determinada figura que o fascizou, resultando em duas guerras. Esbanjámos muito na compra de armas. Esbanjámos muito do pouco em treinar, armar e pagar os esquadrões da morte.
Esbanjámos em treinar, equipar e pagar a praga dos G40, cúmplices da saga arrogante e criminosa da máfia que endividou o país e depauperou o erário público, através de campanhas contra os mais elementares direitos humanos e constitucionais.
Temos que recordar que os G40 esbanjaram muito do seu enunciado contra a mão externa, num delírio tal, que nós, os que os alertámos para o perigo para o qual o país estava a resvalar, fomos acusados de sermos financiados com fundos externos, o mesmo fundo externo que o país, agora, de calças na mão, vai em sua busca, atravessando misericordiosamente o Atlântico nu e sem a auto-estima de que os corifeus do regime vinham propagando.
Esbanjámos muito a pensar arrogantemente que “já tivemos situações de crise que conseguimos ultrapassar” e que “é mais um desafio e ajuda a pensar naquilo que já foi referido pelo Presidente da República anteriormente, que é a redução da dependência externa”, tal como Manuel Chang chegou a dizer.
Como demonstrado, esbanjámos a nossa curta inteligência crentes da nossa grandeza, com que enchíamos os pulmões, fazendo-nos crer numa auto-estima que nos subiu à cabeça, a ponto de pensarmos que o petróleo, o gás e o carvão se tornariam a fonte de financiamento do Estado, que somos um Éden, quando somos um dos cinco países mais pobres do mundo. Esbanjámos muito na nossa vaidade colectiva, que não nos permitiu o discernimento, enquanto alguns países do G19 iam deixando de financiar o Orçamento Geral do Estado.
Esbanjámos muito a falar de “intromissão demasiada” de doadores nos assuntos domésticos, com a tal apologia de que as receitas regulares da indústria extractiva significavam autodeterminação económica do país, e fazendo tábua rasa dos conselhos do FMI sobre a necessidade de promovermos políticas de inclusão.
Esbanjámos muito no desprezo, a ponto de olharmos com desdém os doadores, aos quais acusámos de “intromissão demasiada” quando nos instavam sobre a necessidade de aprofundarmos a democracia, a boa governação e o combate à corrupção.
Só a nossa cegueira, enquanto propagávamos sobre a auto-estima, não nos deixou ver que à nossa frente estendia-se o abismo.
Só a nossa cegueira é que agora nos faz parecer tresloucados, atrás do prejuízo, que bem advertimos antes a essa gente mesquinha, armada em valentões, que estávamos em vias de corrermos desenroupados, com uma mão à frente e outra atrás, a pedirmos esmolas.
Uma figura ridícula para nós, que tanto vemos falando de auto-estima.
Uma figura ridícula para um Governo que, em 2011, desdenhou o conselho do FMI, o qual chamou a atenção do Governo para o declínio da produtividade agrícola, a incapacidade da economia de criar empregos e o aumento da dívida pública.
Em suma: somos um país rico que contamos demasiadamente com o ovo no ventre da galinha, e o resultado é que esbanjámos a auto-estima e a arrogância, a contarmos com esse ovo que ainda não temos, esse ovo da indústria extractiva, que nem sequer chegou a gestar, e já faz com que andemos aos tiros uns com outros, irmãos do mesmo país, sangue do mesmo sangue, em desrespeito comum. (Adelino Timóteo)
CANALMOZ – 25.04.2016