Centelha por Viriato Caetano Dias ([email protected] )
“Percam-se as causas, salvem-se os princípios” – José Xavier Mouzinho da Silveira (1780 – 1849), político português.
É um facto indefectível que o país é pobre e o principal fito do governo é erradicar a pobreza absoluta. Também não é menos verdade que a pobreza absoluta que assola uma grande parte da população tem como causa as armadilhas militares que destruíram a prancha do desenvolvimento do país. Alguns desses doadores que cortaram ajuda internacional a Moçambique estiveram de uma maneira ou de outra envolvidos na destruição do país, através do patrocínio militar e político à Renamo. Portanto, nenhum mortal pode pôr corrector ao passado, por mais aziaga que sejam os factos. Obviamente que o povo moçambicano não é ingrato e está eternamente reconhecido à obrigação de gratidão. Gratidão sim, chantagem não. Podemos perder a principal causa da luta que é a erradicação da pobreza absoluta, nunca os princípios libertários da nossa moçambicanidade.
Estou inteiramente de acordo com a revolta da sociedade civil moçambicana quando acusa o anterior governo de empalmar a dívida pública nacional. Se a dívida anterior era por si só uma pesada cruz para os cidadãos, os empréstimos agora revelados vão reduzir ainda mais o esforço de resiliência dos moçambicanos. Penso que nenhum povo merece carregar a cruz duas vezes. Dizia o saudoso Professor José Hermano Saraiva que a potência de um motor está relacionada com a carga que a viatura tem que transportar. Se o povo fosse a potência de um motor e a carga a dívida, não tenho a mais pálida dúvida que o motor teria colapsado. Perante esta situação, o presidente Nyusi tem a responsabilidade de reduzir o peso da dívida pública do país que asfixia o povo.
Eu vejo alguns caminhos para a saída tempestiva da crise, como por exemplo, apostar no turismo da diferença que é simultaneamente o turismo do futuro, a par da agricultura e da pesca. Indo ao título desta centelha, não compreendo como é que alguns países (que ostentam a fama de serem expoentes máximos do altruísmo mundial) cortam assistência financeira a um país exaurido, mormente em sectores tão sensíveis como o da educação, saúde e segurança alimentar. Aprendi durante a peregrinação num internato, onde o erro existe por toda a parte, que mão suja não se corta, lava-se. Admitindo que o anterior governo falhou na gestão da dívida pública, os doadores não deviam em circunstância alguma cortar ajuda ao país, mas sim encontrar uma alternativa negocial que não impinjam mais dor ao povo moçambicano. O que é que os doentes de HIV/SIDA têm a ver com o EMATUM? Que culpa tem os estudantes pela dívida da PROÍNDICUS? Afinal quem são o vosso alvo: o governo ou as populações vulneráveis? Como diria um senador brasileiro aquando da votação do processo de impeachment à Dilma Rousseff, “não estarão a tentar curar a febre quebrando o termómetro?” Se são tão altruístas assim, como fazem crer ao mundo, porque é que não têm em consideração o pedido de penitência do Ministro Adriano Maleiane? A História não dá respostas aos problemas de hoje, mas permite-nos reflectir com base nas experiências do passado. E o que é que o passado nos diz? Diz-nos que as vossas sanções económicas e financeiras empobreceram o Zimbabwe; colocou a Grécia na bancarrota; deixou Portugal de tanga; conduziu o Malawi ao colapso; exauriu Madagáscar; ameaça agora falir Moçambique. Um Estado filantropo não se contenta com a tristeza dos outros, nem deixa que as populações morram por falta de tratamento de HIV/SIDA. Um Estado responsável não permite que uma nação pobre seja construída com base em analfabetos. Será que pretendem matar o povo moçambicano de fomes, para depois prestar condolências? Por isso, vejo a atitude desses Estados credores como uma autêntica vingança pelo facto de o governo moçambicano não ceder às exigências da Renamo. Credores sérios, comprometidos com a paz, ajudariam o governo moçambicano a travar as matanças da Renamo contra civis indefesos. Parar um autocarro ocupado por passageiros civis e regá-lo de tiros é terrorismo. Não condenar estas atrocidades é um acto de cumplicidade. O futuro é a paz. O meu amigo Nkulu, poeta anónimo, expressou o seguinte comentário: “Deixai-os, amigo Viriato. A areia que está em cima, nesta sementeira, na próxima ficará em baixo. Nesta vida nada é constante. Na próxima encarnação, seremos nós os patrões e eles, os actuais credores, os paupérrimos, e nem por isso haverá ajustes de conta”.
ZICOMO (um abraço Nhúngue a todos Benfiquistas).
WAMPHULA FAX – 19.05.2016