Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Sem garantias democráticas, investimento directo estrangeiro é uma farsa.
Vimos chegar muitos megaprojectos, e somam-se alguns instalados e funcionando.
Primeiro, talvez por ignorância sobre os contornos fundadores e operacionais de tais iniciativas, muitos moçambicanos aplaudiram.
Depois, até vimos pessoas das nossas relações conseguindo emprego mais ou menos bem remunerado, quando não mesmo bem, em relação ao que o patronato moçambicano público e privado pagam.
Mas depois da bonança, veio a desgraça. O ouro negro, carvão viu os seus preços no mercado internacional baixarem para níveis assustadores. Uma depois de outra, empresas mineiras abandonam Tete e o Eldorado ficou apenas com a VALE. Depois de tantas facilidades e incentivos, depois de tantas falcatruas de compra e venda de activos carboníferos longe do escrutínio das autoridades moçambicanas, hoje nem gratuitamente se consegue interessar alguém para ocupar os lugares vagos. Ficaram as populações prejudicadas por esquemas de reassentamento incompleto e injusto.
Ficaram os buracos e os danos ambientais, alguns deles irreversíveis, ficaram estabelecimentos hoteleiros, construídos na “febre do carvão”, vazios. São muitos sonhos desfeitos.
Os políticos que decidiram a forma como as operações seriam realizadas terão tirado alguns proveitos e visto suas contas bancárias crescerem mais alguns zeros, mas, no computo geral, a aventura carbonífera moçambicana foi um autêntico fiasco. Vendeu-se ao desbarato o que existia, e tudo sujeito a avaliação de reservas feita pelo interessado e não pelo Estado moçambicano.
Eram os concessionários que informavam que existe isto e aquilo nesta e naquela quantidade.
Dizer que se está investindo na diplomacia económica tem a sua lógica e razão de ser, mas há que equacionar outras vertentes e variantes.
Sem um Governo com tecnocratas de alta craveira técnica e com sentido patriótico apurado, teremos as nossas reservas minerais e recursos de solo sendo explorados para benefício quase que exclusivo das corporações internacionais.
Trazer farmeiros sul-africanos ou de outro país para produzir nos ricos solos moçambicanos faz muito pouco sentido, como se viu com a Mozagrius. Trazer Prosavanas e outros projectos do mesmo tipo vai significar aumentar o número de assalariados agrícolas e de sem-terras. E não digam que é falta de visão e de sentido prático das coisas reais da economia. As multinacionais chegam cheias de boas intenções, mas, passados alguns dias, o que realmente foi negociado entre o Executivo de Maputo e tais multinacionais começa a ser conhecido.
E depois da história das companhias majestáticas, repete-se o fenómeno, com algumas variantes.
Esta é a realidade que os políticos não querem os cidadãos saibam.
Faz sentido organizar fóruns como a MOZEFO em Maputo ou em Lisboa, mas que realmente se ganha com tais eventos? O que ganham os milhões de moçambicanos que alguns governantes dizem que têm de esperar mais uma década para terem benefícios das descobertas de gás em Cabo Delgado? Que ganham os cidadãos que viram suas terras expropriadas para a implantação de eucaliptais ou para o estabelecimento do Prosavana?
Quais são os reais benefícios dos camponeses retirados da área concessionada para a exploração de rubis?
As largas extensões de terra entregues a companhias mineiras de ouro, ferro e outros minerais, como as areias pesadas, têm um valor muito superior às contrapartidas que o Governo recebe. E como quase tudo é opaco, quase ninguém sabe o que se passa e para onde vai efectivamente o dinheiro recebido pelo Governo, e é óbvio que torna-se difícil avaliar ganhos ou mais-valias relacionadas com tais operações.
Existe uma atmosfera cheia de parasitas voadores e outros terrestres aproveitando-se da “ingenuidade” e visão curta de governantes para sacarem benefícios bilionários como está acontecendo com a energia eléctrica de Cabora Bassa, oferecida quase que gratuitamente aos sul-africanos.
Há que repensar a diplomacia económica e o investimento directo estrangeiro no sentido de potenciar o que fica no país e o que se faz com isso.
Não podemos fechar Moçambique ao mundo, mas não faz sentido voltar a ter companhias majestáticas impondo e decidindo o que se faz e como pagam o que retiram de Moçambique.
Depois de anos de abraço de iniciativas propostas por lobistas como Lula da Silva ou José Sócrates, ficámos a saber que algumas das empresas que estes senhores trouxeram para Moçambique estão metidas em sérios problemas nos seus países de origem. Ou que, pelo menos, não houve transparência e justiça económica em algumas operações propostas e aprovadas.
Fomos enganados? Ou alguém deixou que fossemos enganados para seu benefício individual? E como o nosso Parlamento é o que o que é, inoperante e pouco investigativo só nos resta lamentar que estamos a ser roubados a olhos vistos.
Se a diplomacia económica continuar a ser perseguida como uma forma de enriquecer pelo “poder da assinatura”, não deixaremos de ser o paraíso para as multinacionais e inferno para milhões de moçambicanos.
(Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 30.06.2016