O antigo Presidente moçambicano Joaquim Chissano revelou ter “fintado” Afonso Dhlakama ao não assumir na altura a autoria dos três últimos protocolos que provocaram impasse para a assinatura do Acordo Geral de Paz, em 1992, exigidos pela Renamo.
Durante as negociações, na capital italiana, Roma, que puseram termo ao conflito armado entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) e o antigo movimento rebelde moçambicano, o líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) exigiu esclarecimentos sobre três pontos.
A assinatura do acordo de paz foi inicialmente marcada para o dia 01 de outubro, mas, antes, a Renamo quis saber como seriam geridos os protocolos sobre a administração das zonas anteriormente sob sua responsabilidade, sectores de informação e da polícia.
“É uma proposta que veio da Renamo à última da hora e eu próprio elaborei três protocolos e um deles era sobre a administração. Todos foram aceites pelos mediadores e estes não chegaram a informar a contraparte da Renamo de que os protocolos eram da nossa autoria (Governo). Se tivessem o dito, a Renamo teria rejeitado”, disse Joaquim Chissano.
A Renamo aceitou a proposta sem questionar. Contudo, nos últimos 20 anos de paz, tem denunciado a suposta violação do memorando assinado em Roma no que diz respeito à integração dos seus homens na polícia.
Numa entrevista à Rádio Moçambique, o ex-chefe de Estado moçambicano reconheceu ter havido pontos de discórdia que provocaram sucessivos impasses, nomeadamente sobre quem passaria a governar as “ditas zonas libertadas”.
Foram estes os pontos que levaram a que o acordo não fosse rubricado a 01 de outubro, data inicialmente prevista para terminar com a guerra civil dos 16 anos, que se saldou em mais de um milhão de mortos.
Hoje, Moçambique vive diversas manifestações de conflito e muitas vezes violento, como é o caso dos assaltos à mão armada a cidadãos, raptos, violação de mulheres, violência doméstica e a própria pobreza, referiu.
Mas, ao tentar debelar estes conflitos, os moçambicanos dão sinal de que todos se interessam pela paz, acrescentou Joaquim Chissano.
“Temos que ter em atenção outras formas de conflito e que são também difíceis de vencer e que muitas vezes começam com o conflito individual. Cada um de nós vive com os seus conflitos e que, às vezes, geram conflitos com outras pessoas e com comunidades. Temos que começar por nós e depois irmos para outros, incluindo ao mundo”, disse.
A 04 de outubro de 1992, Joaquim Chissano assinou o acordo de paz com o líder da Renamo, um processo iniciado ainda na altura do seu antecessor Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique.
“Não há dúvida nenhuma que a parte mais intensa da busca da paz, depois de todo o historial iniciado por Machel, foi feita por mim. As novas estratégias aplicadas também foram pensadas por mim e a própria negociação foi orientada por mim. O camarada Armando Guebuza (atual Presidente) era o mediador principal, o chefe da mediação, mas teve orientação e retaguarda feitas por mim”, reclamou Joaquim Chissano.
Para o alcance da paz, as forças beligerantes e os mediadores fizeram “convergir tudo”, afirmou Chissano, assinalando que enquanto se combatia e para não deixar que a guerra continuasse a matar gente, as partes encontraram “formas de exercer a diplomacia para que todas as forças internacionais convergissem na busca da paz”.
O Acordo Geral de Paz foi assinado com a forte intervenção do Governo italiano, as confissões religiosas moçambicanas e a Comunidade italiana Sant`Egídio.
Lusa - 02.10.2012