CARTA A MUITOS AMIGOS
No continente, na África Austral e nos países limítrofes do nosso e, claro cá na terra, vivemos tempos muito perturbados.
No Norte a Tunísia, a Líbia e o Egipto estão atacados por terroristas fundamentalistas. A Argélia liquidou-os, mas ainda enfrenta a eternidade de um chefe que se arrasta de hospital em hospital e nunca nem como se sabe como terminará a crise.
O Marrocos desde que o saudoso rei Mohamed V desapareceu, levou a cabo agressões contra a Argélia, tentativas de anexação da Mauritânia e, até hoje, embora as condenações da União Africana e das Nações Unidas persiste em ocupar o Saará Ocidental.
A sul desta faixa Norte, da Nigéria ao Chade, dos Camarões ao Sudão Norte e Sul em toda a parte atacam os fanáticos fundamentalistas discípulos do terror e que ignoram o ensinamento do Profeta que matar um inocente é matar a Humanidade.
Testemunhamos o mesmo na pobre Somália dilacerada e exportadora de crime nomeadamente para o Quénia.
Na vizinha África do Sul detiveram dois irmãos gémeos que preparavam atentados terroristas.
Há que perguntar qual a muralha, o pára-raios que nos vão proteger?
Diz-se que quando as barbas do vizinho estão a arder põem-se as nossas de molho. Estão mesmo as nossas de molho?
Cá na terra já existem mesquitas fundamentalistas que enviam gente nossa para certos países, dizem para estudar em escolas e instituições reputadas não pela qualidade do ensino, mas sim pela difusão das histerias do fanatismo.
Já vemos burcas nas nossas cidades o que jamais aconteceu durante mais de mil anos do Islão em Moçambique. O horror e mortandade vão-nos surpreender? Que precauções tomam as autoridades encarregues da vigilância?
Por favor, nada de cantilenas sobre o respeito dos usos e costumes recém-importados e que jamais por cá proliferaram. Querem preservar o primitivismo, que o façam nas suas terras.
Na Guiné-Bissau desde a luta de libertação nacional e o assassinato de Amílcar Cabral sucedem-se as lutas de clãs, de tribos, regiões, localidades, mandam os traficantes de droga e, em termos práticos o país e o Estado tornaram-se uma manta de farrapos. Cabral morreu por isso e o PAIGC jamais lutou contra esses males.
Em São Tomé, onde tantos dos nossos morreram deportados para as roças, persiste a luta entre duas famílias que se disputam o poder. Não começou hoje e vem de longe. A passagem do testemunho ou ceptro governamentais fazem-se de pai para filho. Há perigo.
Depois temos aqueles que se eternizam no poder, fazem dos apaniguados e familiares realeza, dona de todos os recursos do país, sacrificando o grosso da população.
Mencionamos já o caso argelino.
Há quanto tempo se conserva no poder o Presidente Obiang da Guiné-Equatorial, membro da CPLP? Como coloca no poder e até como Vice-Presidente o seu filho? Outros próximos, todos bem colocados.
Fortunas colossais que estão sob investigação em várias instituições e países.
O que nos mostra o Congo (B)? Como se revoltarão as cinzas do grande Marian Ngouabi?
Contra membros da presente realeza não existem processos em França e noutros países por suspeita de desvios de fundos do Estado?
Estará melhor o martirizado Zaire?
A pátria de Lumumba, Kanza, Soumialot tudo entregue à ganância e aos chefes até que a morte os separe do poder?
Ajudamos o Uganda a libertar-se da tirania de um malfeitor. Mas há que nos perguntarmos se uma ditadura não se viu substituída por outra, embora diga-se, menos sangrenta, mas igualmente predadora.
Na África Austral, nos países limítrofes do nosso e na região SADC, com as excepções muito honrosas e nobres da Tanzânia, da Namíbia e do Botswana o que testemunhamos?
No Malawi depois da queda de Hastings Banda que se declarara Presidente por Toda a Vida, clãs e tribos disputam-se o poder num país completamente arruinado e com apetites brutais de extensão do seu território, em detrimento da Tanzânia e de Moçambique. Buscarão nas expansões territoriais a solução? Querem ficar com todos hidrocarbonetos do Lago? Fábulas para enganarem o povo martirizado.
O despudor chegou ao ponto de unilateralmente mudarem o nome do Lago Niassa, banhado por três países, para Lago Malawi!
Na Zâmbia, aliás como no Malawi, criou-se o costume estranho de prenderem o Chefe do Estado cessante. Até fizeram isso ao Presidente Keneth Kaunda, herói da causa da libertação nacional e da solidariedade com Moçambique e Angola, o primeiro presidente da Zâmbia.
Na Suazilândia mais que arruinada o reizinho há mais de 20 anos e com pouco mais de 40 de idade, já dispõe de uma quinzena de esposas. Todas com direitos a palácios, a escoltas e carros de luxo. Anualmente acrescenta uma ao seu harém durante a chamada dança das canas (reed’s danse).
Este ano um autocarro que transportava um grupo de moças para a tal dança, sofreu um acidente e uma quinzena de raparigas morreram. Não se adiou a dança, não se observou qualquer luto.
No Zimbabué recentemente paralisado por greves e manifestações e até repressões violentas, o cenário é desolador. Por falta de dinheiro não se pagam salários. A moeda nacional há muito que desapareceu; guardei uma nota de cem mil milhões de dólares do Zimbabué (100.000.000.000.000), nesse tempo comprava-se com ela um maço de cigarros, uma Coca-Cola, talvez ainda uma cerveja e pouco mais.
O Presidente já passa dos 93 anos de idade. Está no poder desde 1980. Regularmente várias vezes por ano, vai a Singapura tratar-se. Falar-se de sucessão? Nem pensar, dá disputas e até prisão. O antigo Chefe do Estado-Maior-General, Rex Nhongo, na época esposo da Vice-Presidente do país, morreu queimado na casa em que vivia. Ninguém o protegia e como a esposa pretendia candidatar-se, muito ficou por explicar.
Em Angola o Presidente no poder desde 1979, na sequência da morte do grande herói e poeta Agostinho Neto, aparece como único candidato para a presidência do MPLA cujo congresso se realiza no próximo ano. A sua família faz parte da realeza, uma das suas filhas considera-se a mulher mais rica de África.
Mesmo na nossa terra houve tentativas e goradas pelo CC da FRELIMO, de se alterar o limite de mandatos ou de fazer de alguém próximo o sucessor. Considera-se que a mulher mais rica do país é uma filha desse que se queria monarca.
Parabéns à coragem do CC.
P.S. Os pequenos países marcaram o campeonato europeu, Glória a uma Islândia, País de Gales, Croácia.
De empate a em empate, prolongamentos e penalizações lá se arrastou Portugal à final com a França e ganhou! Curiosamente a imprensa portuguesa e outra fala mais do joelho do Cristiano Ronaldo do que do preto da Guiné que marcou e deu a vitória a Portugal! Parabéns ao nosso pretinho.
SV
O PAÍS – 25.07.2016