Em Sofala, centro de Moçambique, familiares de ex-trabalhadores da empresa de capital espanhol "Pescamar", sequestrados a bordo do pesqueiro "Vega 5", continuam à espera de informação sobre o paradeiro dos desaparecidos.
O barco pesqueiro da empresa hispano-moçambicana "Vega 5" teria sido raptado em dezembro de 2010 por um grupo de piratas somalis a seiscentas milhas da costa de Inhassouro, na província de Inhambane. Na altura seguiam a bordo 24 tripulantes, sendo cinco estrangeiros e dezanove moçambicanos. Apenas doze dos dezanove moçambicanos voltaram ao país. As dúvidas são muitas, o que preocupa as famílias dos sete moçambicanos que continuam desaparecidos há quase seis anos.
Uma história atribulada
A força de proteção costeira da Índia intercetara nas suas águas o barco moçambicano "Vega 5" com 61 tripulantes, entre eles dezanove moçambicanos, ex-pescadores da empresa Pescamar que tinham sido sequestrados em Inhambane em dezembro de 2010. O barco fora remodelado na Somália pelos piratas e passara a dedicar-se ao sequestro de outros barcos nas águas do oceano Índico.
A sede da empresa pesqueira hispano-moçambicana "Pescamar", na cidade da Beira
Na ação armada, o exército indiano resgatara moçambicanos e somalis que seguiam a bordo. Doze moçambicanos que se dedicavam à pesca, foram repatriados para Moçambique. Na altura, as autoridades moçambicanas continuavam, no entanto, a dar como desaparecidos sete pescadores moçambicanos.
Volvidos seis anos, os familiares desses ex-trabalhadores da Pescamar estão preocupados com a demora no esclarecimento do caso. O processo criminal está nas instituições da justiça há mais de cinco anos, e a empresa espanhola, recusa prestar esclarecimentos aos familiares dos desaparecidos.
A DW África localizou três famílias, cujos parentes embarcaram no "Vega 5" a partir do porto de pesca da Beira, em dezembro de 2010, e nunca mais voltaram.
Com o desespero estampado no rosto as nossas entrevistadas contam que a empresa não confirma nem desmente a morte de seus entes queridos e também não indica o seu paradeiro.
O desespero dos familiares dos pescadores desaparecidos
Joana Vicente, conta: "A Pescamar diz que estão lá, estão presos, hão-de vir um dia. Proibiam aos outros dizer que os colegas perderam a vida. Perguntámos e eles disseram que as pessoas que ainda não voltaram estão presas, mas um outro funcionário aproximou-se e disse que o nosso amigo morreu, disse que tinha visto ele a ser atirado do barco para a água. Sete pessoas que foram lançadas ao mar. Então fui pressionar a Pescamar. Só depois é que começaram a vir aqui a casa e falar comigo. Disseram que vão pagar algum dinheiro para fazer o sétimo dia."
O representante da "Pescamar" na cidade da Beira recusou prestar qualquer declaração à imprensa.
A mãe de outro desaparecido desde o sequestro em 2010, também perdeu as esperanças de um dia voltar a ver o seu filho: "Eu não acredito que ele esteja vivo, já não acredito que hei-de ver mais este meu filho", afirma a mãe que pede o anonimato.
Um ex-trabalhador da Pescamar, que falou à DW, também na condição de anonimato, recorda que os piratas exigiram o pagamento de um resgate para a soltura dos vinte e quatro tripulantes que estavam a bordo no "Vega 5".
"Apenas foram resgatados tripulantes espanhóis"
"O Vega 5 fez-se ao mar dois ou três dias antes do Natal, ainda estava nas águas moçambicanas, concretamente em Bazaruto, Inhambane. De repente apareceram os piratas e levaram o 'Vega 5' atá ao seu território, a Somália. Chegados lá entraram em contato com a empresa Pescamar, sedeada na Beira, pedindo resgate. A Pescamar da Beira manifestou impossibilidade de resgatar todos, apenas disponibilizando dinheiro para resgatar os espanhóis."
O trabalhador recorda que hoje estão vivos a trabalhar para a Pescamar, a pescar nas águas onde foram sequestrados em 2010: "Dois espanhóis foram resgatados mediante o pagamento de dinheiro na Somália, doze moçambicanos foram resgatados com vida pelas tropas indianas, um indonésio e dois portugueses foram mortos pelos piratas, não se sabendo até agora nada sobre o paradeiro dos sete restantes moçambicanos."
Tentativas de contatar a direção da Pescamar foram infrutíferas. O chefe dos recursos humanos, Eduardo Rodrigues, negou entrevista à DW África porque, alegadamente, não dispunha de autorização.
Rodrigues, avançou no entanto que não haverá indemnização para as famílias que perderam seus parentes, e que o processo criminal, instaurado em 2011, só este ano é que deu entrada no tribunal provincial de Sofala.
Entretanto uma das mães desconfia das intenções da empresa espanhola Pescamar, assim como do próprio Governo moçambicano: "Fazem tudo para adiar o esclarecimento deste caso", afirma: "Fui ao tribunal e disseram-me que este processo é complicado porque envolve muitas pessoas. Dizem que está a ser gerido em Maputo. Maputo é que vai responder o que pode fazer com este nosso problema. Não acredito que vão julgar mais este problema, se eles não quiserem falar a verdade nós vamos fazer denúncia, porque aquelas pessoas que perderam familiares deveriam ser indemnizadas. Mas eles não nos dizem que os nossos filhos morreram, só dizem que estão desaparecidos, tudo isso para não nos indemnizarem."
DW – 04.08.2016