Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Apelos ao “desarmamento unilateral” são politiquice nojenta.
Há razões para estarmos todos preocupados pela guerra que teima em ceifar vidas inocentes.
Há razões para que moçambicanos se levantem contra uma guerra fratricida associada a apetites ditatoriais.
Há razões para se duvidar dos interlocutores, quando se apresentam à mesa de negociações com posições inflexíveis.
Agora que se dão os primeiros passos concretos para a obtenção de um acordo sólido para o restabelecimento da paz, preocupa também o surgimento de “pronunciamentos” mais ou menos “colados” sobre a legitimidade de um possuir armas e a ilegitimidade do outro beligerante ter o direito às mesmas.
Observe-se a oportunidade utilizada pelo Conselho Superior de Comunicação Social e a Comissão Nacional dos Direitos Humanos e veja-se o paralelismo destas duas instituições quando a questão é a guerra. O ataque que as duas fazem é contra a Renamo, deixando de parte a Frelimo, que também é partido armado.
Em Moçambique, assim como um pouco por toda a África, os povos estão fartos do formalismo democrático e de regimes constitucionais fora de prazo.
Alegar razões constitucionais seria bom de ver, se as partes respeitassem tal Constituição.
Já muito se disse e se escreveu sobre as razões da guerra civil em Moçambique, e convém repetir que não são as proclamações ao estilo do “Café da Manhã” da RM que vão alterar o quadro de guerra que se vive.
Uma vez “entornado o caldo” por causa de posições reducionistas e inflexíveis, convém ter a sanidade política de “remendar o pano” e promover um ambiente que nos traga uma paz que não envergonhe as partes e que constitua uma “saída airosa” para as partes em conflito.
De nada ou pouco vale voltar à verborreia do passado, como apareceu um veterano da luta de libertação a manifestar-se recentemente.
O que era “verdade oficial” em 1984 não pode continuar sendo o “cavalo de batalha” numa situação difusa como a de hoje.
Não é uma questão de ceder a soberania nem de defesa da integridade territorial de Moçambique o que se passa, pelo que cai por terra o argumento de rearmamento secreto.
Em termos claros e correntes, é uma “guerra pelo tacho” que separa irmãos.
O poder corrompe, como já foi, por diversas vezes, sabiamente dito.
E a ganância desmedida tem a capacidade de cegar “muito boa gente”.
Se havia alguém que duvidava que a RM e a TVM prestam muito mau serviço público, uma pequena análise de seus programas de cariz informativo ou opinativo deixa ver que pouco diferem dos tempos em que o DTIP reinava e decidia o que se podia dizer ou noticiar. Esta dupla está abertamente trabalhando contra a reconciliação, perdão e inclusão.
E o agravante é que fazem exactamente o que não deveriam, sendo órgãos da comunicação social públicos, numa situação em que se está discutindo a despartidarização do aparelho de Estado.
Se antes era fácil e inquestionável alguém aparecer outorgando “infalibilidade” aos dirigentes do partido no poder, devido ao ambiente de intolerância que reinava, hoje importa que as pessoas e instituições se situem e projectem uma imagem que respeite o pluralismo político vigente.
Não se pode aceitar que a TVM e a RM funcionem como célula do partido Frelimo. Isso seria um recuo catastrófico que tem o potencial de “gasolina na fogueira”
O momento é de contenção discursiva e de respeito pelo público.
Seria bonito e oportuno que se concedesse amnistia a alguns “mbavas”, de modo a que não sentissem necessidade de defender arduamente o indefensável. Uma argumentação tosca e cheia de laivos de uma política que se tornou num aborto já faz tempo não pode servir de produto para intoxicar os moçambicanos.
Tem sido a inflexibilidade de políticos que muitas vezes deita tudo para a fogueira.
Arrumem a casa e cheguem a acordo sobre o que realmente querem para o país.
Se ainda não estão preparados para discutir os pontos agendados e “consensualizados”, marquem um intervalo, mas não surjam com desmentidos pueris e de muito mau gosto.
Aqui não se deve dar oportunidade ao esbanjamento de recursos, como fez a anterior comissão de revisão da CRM, que só pariu “pontos e vírgulas” no texto.
Também não se deve repetir o espectáculo “indecoroso” acontecido no Centro de Conferências “Joaquim Chissano”, aquando dos tristemente famosos impasses negociais.
Acusações deste ou daquele sobre este ou aquele ataque, sobre assaltos a centros de saúde ou postos administrativos, sobre ataques a colunas deveriam ser acompanhados de acusações sobre ataques a sedes de partidos políticos da oposição, do impedimento de actividades políticas, do sequestro e assassinato de membros de partidos da oposição, sobre violência política documentada que levou milhares de pessoas a refugiarem-se no Malawi e no Zimbabwe.
Dos órgãos de comunicação social exige-se rigor e isenção.
Existe uma percepção que não deixa de fazer sentido que se refere ao posicionamento da academia, dos comunicadores sociais, dos fazedores de opinião e dos chamados intelectuais moçambicanos quanto aos assuntos de interesse político nacional, estão quase que na maioria apresentando ou oferecendo-se como propagandistas do partido no poder.
Em períodos eleitorais, aceitam servir de consultores, e em períodos pós-eleitorais mantém-se em função, mesmo que sem salário ou recompensa directa.
Reina uma expectativa de que, a qualquer momento, poderão ser pescados ou repescados para algum cargo de relevo ou, pelo menos, bem remunerado. E aí aparecem estrategicamente empresas públicas ou comissões disto ou daquilo.
Quanto às “comissões disto ou daquilo”, estamos falados: são irrelevantes no verdadeiro sentido da palavra. São um fardo desnecessário para as finanças públicas, já de si depauperadas. Irrelevantes, porque nada fazem de concreto para cumprir a missão atribuída por lei.
É como a Comissão Olímpica Nacional... Depois da brilhante e inesquecível Lurdes Mutola, tornou-se num antro de “comissionistas e boladores”.
Acreditamos que existem moçambicanos que querem a paz, e estes são membros de todos os partidos. Acreditamos que é necessário dar um impulso sério e reflectido às discussões que estão acontecendo em Maputo com as partes assumindo que é necessário e urgente encontrarem caminhos alternativos à presente guerra.
Não à “democracia do fogo”, não à “democracia das fintas”, não à “democracia adiada”.
Quem pretende arrastar tudo até 2019 está agindo de má-fé e sem patriotismo. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 24.08.2016