XICARA DE CAFÉ por Salvador Raimundo
O ELEITORADO sul-africano acaba de forçar o partido maioritário, Congresso Nacional Africano (ANC), à reflexão profunda, na sequência da derrocada sofrida nas eleições provinciais de há semanas na África do Sul.
As principais cidades sul-africanas, Joanesburgo, Pretória e Port Elizabeth, deixaram de ter o domínio do ANC.
Muitas são as eventuais razões que levaram o eleitorado a apostar na Aliança Democrática (DA) e no recém criado partido de Julius Malema, Combatentes da Liberdade Económica (EFF).
Entre as causas do virar de costas do eleitoral, sobretudo os escândalos que envolvem Jacob Zuma não correctamente esclarecidos pelo próprio e pelo ANC.
Aliado a isso, a arrogância do partido ao manter determinados candidatos contra a vontade do eleitorado, que inclusive fez ecoar o voz da discordância recorrendo a violentas manifestações.
Nem com tais protestos o ANC foi capaz de recuar nas suas decisões de indicar candidatos que à partida não seriam (como se viu) votados.
Ao votar na DA e na EFF, o eleitorado declinou entregar de bandeja a votação aos rejeitados do ANC.
Há quem teme que a experiência sul-africana pule o arame farpado para o lado moçambicano, onde neste preciso momento se debate em torno da descentralização que leve ao exercício similar ao que na África do Sul acaba de tramar o ANC.
Por cá, o governo-Frelimo diz que não está para invenções e que somente nas próximas eleições, lá para 2019, é que haverá espaço para votar governadores provinciais.
Ideia contrária tem a Renamo, que em negociatas com o governo insiste na indicação já de governadores nas quatro províncias do centro e duas das três lá mais para o norte de Moçambique.
Para fazer valer as suas intenções, a guerrilha invade neste e naquele posto administrativo, numa correria que a tropa é incapaz de se lhe seguir o rasto.
O único que a Renamo já conseguiu nas negociações, conjunto das duas frentes de actuação – plano militar e diplomático – é que a mediação elabore um texto consensual a ser levado à Assembleia da República, a ver se a preocupação apresentada tem ou não tem enquadramento legal suficiente para acomodar as pretensões renamistas...agora.
Estranho como tudo se precipitou, sabido que a Assembleia da República é dominada pela Frelimo e esta já deu lições precisas de que não está para cedências ou facilitarismos sejam quais forem, sobretudo vindo de onde vêm...da Renamo.
Não cabe na cabeça de ninguém que a Renamo esteja tão distraída ao extremo de dar mão a torcer com o transferir da decisão dos governos autónomos, já, para o parlamento.
Ou a Frelimo será orientada a facilitar, votando a favor de emendas pontuais da Constituição, ou está iminente o chumbo.
Cá para nós, a consertação de posições que levem à aprovação de mexidas constitucionais parece na forja, numa altura em que a Renamo das matas dá uma ajudazinha, atacando aqui e acolá, coisa que Dhlakama mais sabe fazer...
EXPRESSO – 16.08.2016