EUREKA por Laurindos Macuácua
Bom dia, meu Presidente. Indulgência por lhe não ter escrito sexta-feira passada.
Nada propositado. É que tive que dar prioridade ao meu primo. Precisava de um ombro amigo. Na quinta-feira, à semana passada, ele dormiu, pela última vez, o sono dos justos. Apesar de o País estar a contorcer-se em leito terminal, ele tinha umas migalhas guardadas- bem “seguras”- no Nosso Banco. Ele é carvoeiro, sabe?
Foi juntando até que dava para alguma coisa. Talvez até para montar um negócio digno. Porém, na sexta-feira acordou alvoraçado: o banco onde ele guardou as suas parcas economias faliu. E nos 350 mil meticais que havia depositado, só terá direito a 20 mil meticais. Foram rios de lágrimas até os seus olhos ficarem enxutos.
Abraçámo-nos. Chorei junto com ele. E até fomos juntos ao Nosso Banco para crermos: estava tudo lacrado. Mesmo assim, permanecemos horas a fio defronte do banco. Chorámos. Todavia, nada mudou. Neste País já se não respeitam as lágrimas de um pobre coitado!
E o culpado de toda a sua desgraça sou eu. Eu é que lhe incentivei a guardar o seu dinheiro no banco. Comummente, guardava-o debaixo do colchão ou então o enterrava. Nunca antes havia sofrido nenhum roubo. Ocasionalmente ia lá ao esconderijo e via que as suas moedas estavam saudáveis. Nenhuma malária.
Muito menos queixumes. E lá vim eu, munido desse discurso populista nde bancarização da economia, depósito seguro e blá, blá. O meu primo cedeu e deu-se mal. Como é que o Presidente esperava que eu lhe escrevesse nessas condições?
Aliás, mesmo hoje, se o faço, é porque me é introspectivo. Varre-me a alma.
Tenho alguma esperança, no entanto, que algumas mudanças implementadas pelo novel governador do Banco de Moçambique, vão forçar alguns indivíduos a desmamar. Têm cabelo branco mas não querem ser desamamentados. Sugam as tetas do Estado como parasitas, sanguessugas.
Até hoje me pergunto como é que um País sério, com um Governo que se diz sério, cria-se um banco para viver à mama do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS)?
Quem não sabe que o Nosso Banco era um banco nado e criado no seio da elite política. São os seus camaradas os criadores desse banco, Presidente. E foram eles que desgraçaram o meu primo.
Acha que o meu primo ainda está em condições de engolir essa de que é seu patrão? Ele é seu eterno empregado, Presidente. Quando querem até tiram-lhe o pouco que tem sem direito a reclamações.
Onde é que o meu primo se vai queixar? Que experimente até ir chorar de fronte da Presidência da República ou das residências dos ladrões que lhe roubaram o dinheiro. Há-de ter a Força de Intervenção Rápida em cima de si.
Esta Polícia penaliza os fracos, espezinha-os. É subserviente da nomenklatura política. Contudo, igual a nós. Sem uniforme também passa pela mesma crise em suas casas. E é bem provável que muitos deles não tenham nada para comer. Espezinhamnos e esquecem que os umbrais do
poder são estreitos. Até a Polícia fica de fora.
Há que haver reformas, Presidente. Temos que separar a política dos negócios. Um político é um servidor público. Temos que limpar o pântano. O Presidente prometeu mudar tudo, mas não mudou nada. O meu primo e eu somos os próximos prováveis dissidentes. Temos motivos.
O nosso voto? Só Deus sabe para quem irá às próximas eleições. Estou aborrecido, Presidente. Muito aborrecido….
O primo e eu já não queremos ser seus patrões. Não lucramos nada!
DN – 18.11.2016