Centelha por Viriato Caetano Dias ([email protected])
A língua afiada e desenfreada é a arma de destruição massiva mais utilizada. Todos somos vítimas de todos; e todos somos carrascos de todos. A inveja e o desdém jogam a sua cartada nas mais improváveis situações. As vítimas são atacadas na sua dignidade e honra, por comentários desagradáveis, desajustados e maldosos. Padre Manuel Maria Madureira da Silva
Este é mais um daqueles assuntos que não aumentará, nem em quantidade, muito menos em qualidade, o meu círculo de amigos, visto que, o Balanço Geral da Miramar é, provavelmente, um dos programas de televisão mais vistos do país e o seu apresentador, Jorge Matavel, um dos mais carismáticos pivôs.
Quando um jornalista consegue reduzir e “domesticar” o vírus do exibicionismo que mina a carreira de muitos jornalistas (passe o pleonasmo forçoso) do país e consegue, por perícia própria, comunicar-se com toda a simplicidade, sem a recorrente utilização de complexos vocábulos que comportam a língua portuguesa, encontra no povo um amigo.
Matavel, que assumiu o comando do programa depois de receber o testemunho de outros apresentadores, conseguiu introduziu uma narrativa poética e crítica própria em suas reportagens, tornando-se, assim, um chamariz de audiências. Este feito fez com que o Balanco Geral conquistasse a sua territorialidade, identidade e a sua marca, afastando-se, destarte, do modelo original do Balanço Geral da Rede Record (subsidiária da Miramar).
Como qualquer ser humano, Matavel é falível e, portanto, condenado a cometer erros. Contudo, qualquer erro que Matavel for a cometer terá sempre maior impacto na sociedade por se tratar de um jornalista (apresentador) e o facto de pertencer a uma televisão de cariz religiosa. Vale a pena lançar o olho sobre um dos erros, na minha opinião, crasso, de Matavel.
Por exemplo, chamar alguém de “Bandido, Malandro e Preguiçoso” quando o suspeito nem sequer foi condenado, com sentença transitada em julgada, é um comportamento deplorável. Não é, do ponto de vista ético, religioso e legal, recomendável atribuir apodos a indivíduos que perante a lei gozam do princípio da presunção de inocência (ou princípio da não-culpabilidade).
Matavel, aos olhos da audiência que conquistou, pode ser um herói, mas, à luz da lei, é um prevaricador. Para a concorrência, que deve andar a perder vinténs por culpa quiçá do seu sensacionalismo jornalístico, Matavel pode estar a comprometer a mais nobres das profissões considerada por muitos o 4º poder. De facto, este comportamento pode ser entendido como o amordaçamento dos valores étnicos e profissionais da classe jornalística.
O pior de tudo, acontece quando Matavel arrasta consigo uma multidão de “fantasmas falantes” que, abertas as linhas telefónicas, apedrejam possíveis inocentes e assassinam o carácter de pessoas idóneas, violando, assim, os direitos humanos. A polícia apresentou o presumível “criminoso”, não significa ser ele o assassino.
Foi presente a um juiz, não significa ser ele o culpado. Foi linchado pelos populares enfurecidos, não quer dizer que ele era um cadastrado. Confessou o crime? Quem poderá garantir que não o fez (confessou) por coacção física ou psicológica? Configura-se essa agravante ainda quando a imagem dessa pessoa é colocada no ecrã de televisão para ser chacinada pelos “fantasmas falantes”, esquecendo-se de que não apedrejam apenas a imagem do “pobre homem”, mas também a da sua família, instituição e do círculo de amigos a que essa pessoa pertence.
A tarefa de um jornalista não é a de julgar e condenar pessoas, sejam elas inocentes ou não, mas sim informar a verdade para o público. Deve fazê-lo com rigor e isenção. Perder de vista estes princípios, por causa da audiência e de alguns vinténs sempre necessários para amortizar as feridas da crise que ameaça encerrar algumas televisões, é reduzir à insignificância o papel dos tribunais.
Não estou a vedar o direito à expressão e à informação a ninguém, até porque sou dos que gosto de ver o Balanço Geral e a forma peculiar como Matavel organiza e introduz as suas reportagens, sem nenhuma “cesariana” (esforço adicional), expressa-se espontaneamente, e, como já referi, sem complicados vocábulos. Contudo, deixa-se embalar pelos coros dos “fantasmas falantes” (telespectadores, repito).
Às vezes, algumas palmas, comentários, elogios e gratificações, podem minar o sucesso de um grande profissional. Eu sei que Matavel é crente, talvez não fosse extenuante aconselhá-lo o seguinte: Antes de chamar de “Bandido, Malandro e Preguiçoso” a alguém, é imperioso examinar com muita cuidado os factos. Uma imagem e um insulto não se desfazem nem com mil pedidos de desculpas, tão-pouco com dinheiro. Com a honra das pessoas não se brinca. A propósito, corre um vídeo nas redes sociais de um pastor quiçá de uma igreja pentecostal angolana que lucubravelmente nos ensina: “não permita que o sucesso que você está a ter leve as pessoas a te colocar no lugar de Deus. Alguns elogios são bomba, alguns aplausos é armadilha. Cuidado”.
Está a empalmar à Deus a função de julgar e condenar as suas criaturas.
Zicomo e um abraço nhúngue ao Mambirisse.
WAMPHULA FAX – 20.03.2017