Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Sem que tenha havido propriamente uma transferência pacífica do poder, pode-se dizer que houve um equilibrismo exitoso, na medida em que não jorrou sangue entre os envolvidos.
A equipa governamental escolhida foi a possível, num claro acordo de cavalheiros para assegurar a manutenção de vantagens adquiridas- Também se pode dizer que aí houve negociações de cedências de parte a parte.
Mas, passado o período de transição e avançando-se já para a realização de importantes realizações políticas como congressos de partidos políticos e pleitos eleitorais, é importante que se afinem as máquinas e se tomem decisões. Até por que governar se pode definir como capacidade de tomar decisões.
Uma das decisões tomadas recentemente pelo PR, a nomeação de Licos Lidimo para chefiar o SISE, trouxe efeitos imediatos. Abrandou e praticamente parou o assassinato de políticos e opositores. Da noite para o dia, o PR ganhou espaço de manobra que lhe permite contactar AMMD e negociar tréguas que os moçambicanos agradecem.
Agora que se vislumbra uma saída airosa para as partes beligerantes, é importante que se aproveite a oportunidade para aprofundar o Estado de Direito democrático de maneira efectiva e sem subterfúgios.
Uma das causas da crise profunda que mina o desenvolvimento nacional tem sido a partidarização de tudo o que sejam as oportunidades.
A teia clientelista montada para assegurar a reprodução do modelo político-económico escolhido engloba diversas iniciativas, e uma delas é sem dúvidas a CTA. Há que desassociar esta instituição do Governo e, sobretudo, desmamar o seu funcionamento dos dinheiros públicos.
Ninguém se deve esquecer de que são os moçambicanos pagadores de impostos e na sua maioria indigentes que alimentam a opulência insultuosa das nossas sumidades empresariais. Uma CTA que pouco difere de uma célula de partido deve ser desmantelada e refundada como organização apartidária em defesa dos interesses de um patronato que não sobrevive da subserviência ao poder político. Não nos esqueçamos que parte das empresas que ganham sempre o "procurement" eleitoral são declaradamente de membros da CTA, que até chegam a perder contentor com material eleitoral. Também não nos esqueçamos de que alguns dos mais brilhantes empresários de sucesso jamais o seriam sem o apadrinhamento político, mas também ilícito, dos detentores do poder.
Poderemos alcançar a democracia política formal, mas, se não formos capazes de avançar para a democracia económica, teremos falhado.
O que trava a concórdia tem sido uma concepção errónea de modelo político. Reduzir tudo para um grupinho de pessoas ligadas por amizade e alianças já se demonstrou inviável e promotor de crises.
Quando se fala de guerra de pequena intensidade está-se no domínio do eufemismo político tanto na moda do jargão político ocasional e convenientemente escolhido por algumas chancelarias internacionais e logo rapidamente abraçado pelos comunicadores sociais locais. Quando há perda de vidas humanas até costumam dizer que são danos colaterais. Claro que os seus filhos e filhas jamais se encontram na linha de combate.
Os milhões que morrem de fome e de doenças não são contabilizados como vítimas de uma beligerância politicamente motivada. Alguns membros da CTA consideram que a guerra que se procura terminar foi uma fonte de enriquecimento rápido transportando militares e logística militar.
Muitos comerciantes enriqueceram vendendo carapau e arroz para as FDS durante o período das hostilidades.
Moçambique precisa de ver os seus políticos e governantes abraçando o realismo e abandonando a retórica barata e desonesta.
E não tenhamos receio de dizer que a opção de ministros-amigos e ministros impostos segundo uma estratégia de divisão do poder e equilíbrios étnico-políticos já esgotou a sua utilidade. O país sofre de uma hemorragia de recursos aprofundando a miséria que é atroz para milhões de moçambicanos só por causa dos apetites insaciáveis de uma elite vampiresca e predadora.
Não serão os ministros-amigos nem a opulenta CTA que nos tirarão da crise. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 08.03.2017