Encargos com juros da dívida com impacto negativo num contexto de deterioração do metical
No décimo ano da sua reversão para a gestão moçambicana, a Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) tem estado a queixar-se de falta de dinheiro para concluir o financiamento do processo de reversão, iniciado em Novembro de 2007.
A informação vem contida no relatório anual da empresa referente ao exercício económico de 2015.O relatório da HCB mostra também que os resultados financeiros atingidos em 2015 se cifraram nos 198,6 milhões de meticais negativos, representando um decréscimo de 14,2, se comparados cem os que foram registados em 2014 (231,7 milhões de meticais).
Segundo o documento, produzido pela firma “Ernest & Young”, contribuíram para a deterioração verificada nas contas daquele empreendimento os encargos financeiros e juros da dívida, que se fixaram em 749,6 milhões de meticais, agravadas pela depreciação do metical face ao rand sul-africano (em 5,88%), moeda de escrituração do empréstimo contraído para o financiamento da reversão.
Ainda segundo o relatório, em 2015, “as amortizações atingiram 2.270,3 milhões de meticais, representando um acréscimo de cerca de 30,4% relativamente ao ano anterior de 2014 devido fundamentalmente ao aumento dos investimentos em activos tangíveis, em resultado dos projectos desenvolvidos no âmbito da modernização da Cendal e Subestação do Songo”, lê-se no documento.
A Ernest & Young” afirma que emitiu uma opinião com reservas sobre o relatório e contas da HCB e explica: *A exemplo de exercícios anteriores, subsiste a impossibilidade de confirmação externa do financiamento do D.M.E.A - RSA, transferido para a empresa aquando da sua constituição, que à data de 31 de Dezembro de 2015, ascendia a 3.065.374 mihares de meticais, o o que nos impede de confirmar se todas as responsabilidades relacionadas com este financiamento, se encontram adequadamente divulgadas nas demonstrações financeiras”.
Irrealismo nas previsões de Paulo Muxanga e Max Tonela
Concretizar o plano de amortização antecipada do empréstimo da reversão no decurso de 2016 era um dos objectivos de Paulo Muxanga, ex-presidente do Conselho de Administrados que foi destituído em finais desse ano, após nove anos à frente da Direcção máxima da HCB.
"Implementar uma estratégia financeira pós-financiamento da reversão, orientada para a maximização do produto financeiro, para a gestão prudente dos vários riscos financeiros e operacionais a que a empresa esteja exposta e para a criteriosa planificação dos investimentos de capital a curto, médio e longo prazos", diz o documento, que retrata um dos anos em que Paulo Muxanga dirigiu o Conselho de Administração
Em 2013, Max Tonela, que era, na altura, administrador financeiro da HCB, foi citado pela revista publicitária da empresa, "Nlthany*, dizendo que "a dívida contratada pelo Estado moçambicano junto do consórcio financeiro denominado 'Calyon', para garantir a reversão da Hidroeléctrica de Cahora Bassa a favor de Moçambique poderá ser liquidada com uma antecedência de 12 meses”.
Segundo a mesma publicação, citando Igualmente Max Tonela, actual Ministro da Indústria e Comércio, até Dezembro de 2013 tinham sido amortizados cerca de 60% do valor financiada para o trespasse do empreendimento. Temos pago as prestações por antecipação e estimamos que o pagamento final ocorra no prazo de um ano antes da data Inicialmente aprovada nos bancos”, afirmou Max Tonela. Porém, quatro anos depois a HCB continua a mostrar problemas no pagamento.
Accionistas reúnem-se este mês em Maputo
Um anúncio da empresa, que foi publicado na Imprensa, indica que os accionistas da HCB reúnem-se este mês em Maputo, para debater, aprovar ou modificar o relatório de gestão e de contas do exercício económico de 2016, produzido pelo actual Conselho de Administração, que, desde Outubro do ano passada, é dirigida por Pedro Couto
Apesar de os dados referentes ao desempenho do ano económico de 2016 não estarem ainda aprovados, especialistas na matéria dizem que é remota a possibilidade de, em 2016, a gestão da empresa ter conseguido resultados satisfatórios nas amortizações, dado o difícil contexto económico que caracterizou Moçambique nesse ano, que atingiu níveis de inflação acima dos 100%.
Critérios duvidosos nas nomeações das chefias
Segundo os dados do relatório anual da HCB, em 31 de Dezembro de 2015, faziam parte do quadro de pessoal da empresa 742 trabalhadores, dos quais menos de 20 são estrangeiros. Mas mesmo com o aumento assinalável do número de moçambicanos que trabalham no empreendimento, alguns sectores continuam a questionar os critérios para a ocupação de cargos de decisão na HCB, pois apenas Indivíduos próximos do poder fazem parte da Conselho de Administração, por exemplo.
No ano passado, analistas e outros sectores atentos da opinião pública questionaram insistentemente a indicação de Francisco Itai Meque e Manuel Jorge Tomé como administradores da empresa. Ambos são indivíduos com fortes ligações e interesses no partido no poder em Moçambique, alegadamente, ainda não deram provas de maturidade na direcção e capacidade para garantir que a HCB sirva os interesses da totalidade dos moçambicanos-
Francisco Itai Meque foi Indicado para administrada da HCB na última Assembleia-Geral da empresa, realizada no ano passado, depois de, com fracasso, ter sido Governador da província da Zambézia e vice-ministro da Educação. Manuel Jorge Tomé está já há mais de dez anos como administrador não executivo, depois de ter sido secretário-geral da Frelimo, e deputado da Assembleia da República.
Produção de energia eléctrica
A produção de energia eléctrica atingiu 16,978,39 GWh cm 2015 (correspondente a 93,4% da capacidade instalada) sendo superior em cerca de 6,9% em relação àa registada no ano anterior (15.892,06 CGWh).
A HCB diz que o volume de produção alcançada resultou da disponibilidade do parque electroprodutor dei 7.620,99 GWh,correspondente a 96,94% da capacidade instalada. A HCB diz que atingiu, em 2015, o valor máximo anual de produção de energia em toda a história da empresa, desde a sua criação em Junho de 1975, ao registar uma produção de 16.976,39 GVAh. O último pico de produção (ora atingido no ano de 2009, quando a produção se fixou em 16.574,14 GWh,
Há 10 anos que "a HCB é nossa"
Foi em 2007 que as condições do contrato de concessão do empreendimento, que vigoravam desde 23 de Junho de 1975, foram alteradas, em resultado da transferência de parte das acções detidas pelo Estado português para o Estado moçambicano, a 27 de Novembro, em que o Estado moçambicano passou a deter uma participação de 85%, e o Estado português passou a deter 15%
O contrato de concessão actualizado vigora por um período de 25 anos, podendo, a pedido da concessionária, ser prorrogado por um período de 10 anos, no máximo, mediante a verificação cumulativa de determinadas condições.
Com a alteração dos termos do contrato de concessão, a empresa passou ao regime de tributação normal, vigente em Moçambique, e, consequentemente, sujeito ao pagamento de todos os impostos aplicáveis, para além do pagamento mensal da taxa de concessão, correspondente a 10% da sua receita bruta.
Em 2012, procedeu-se à alteração da estrutura accionista, em resultado da alienação da participação detida pelo Estado português, onde metade foi adquirida pelo Estado moçambicano e a outra metade alienada à Rede Energética Nacional, S.A. (REN). O Estado moçambicano passou a deter 92,5% das acções e a REN passou a deter 7,5% do capital da empresa, O acordo da reversão foi assinado pelo presidente da República de Moçambique, Armando Guebuza, e pelo primeiro-ministro português, José Sócrates. (Eugénio da Câmara)
CANALMOZ – 11.05.2017