Angola e Moçambique estão na lista de países que terão colaborado com regime de Pyongyang apesar de sanções impostas pela ONU. Organização investiga possíveis violações ao embargo por parte destes países lusófonos.
As Nações Unidas proibiram há dez anos a conclusão de contratos militares ou de fornecimento de armamento com a Coreia do Norte, devido às suas atividades nucleares. Mas apesar deste embargo onusiano, o regime de Pyongyang, continua a manter relações privilegiadas com alguns países africanos. Uma dezena de Estados africanos dos 54 do continente estarão envolvidos nas relações.
Os múltiplos testes nucleares ordenados pelo líder norte-coreano, Kim Jong-un, relançou a questão sobre a natureza desta cooperação com o continente africano, precisamente numa altura em que o Conselho de Segurança da ONU aprovou novas sanções contra a Coreia do Norte. As novas medidas atingem exportações de têxteis do país e limitam remessas de produtos petrolíferos. Essas sanções foram adotadas pouco mais de uma semana após o recente teste nucler realizado por Pyongyang.
O relatório da ONU publicado em fevereiro último afirma que vários países africanos continuam a manter relações com a Coreia do Norte. Na Namíbia, por exemplo, dois conglomerados militares norte-coreanos operam desde 2016. Casos semelhantes também são registrados na Nigéria, Guiné Equatorial, Senegal, Eritreia, além de Angola e Moçambique.
Angola e Moçambique
A este propósito, a ONU decidiu investigar possíveis violações ao embargo e sanções impostas à Coreia do Norte por parte dos governos de Angola e Moçambique. A organização apura se a guarda presidencial de Angola e outras unidades foram treinadas por pessoas ligadas ao governo norte-coreano. Diplomatas da Coreia do Norte acreditados em Angola também são investigados. Eles trabalham para a Green Pine Corporation, empresa que é alvo de sanções da comunidade internacional desde 2012 e que seria responsável por quase metade das armas exportadas pela Coreia do Norte.
Os especialistas da ONU acreditam que Kim Hyok Chan, um dos coreanos que tem visto de diplomata em Angola, "é o representante da Green Pine Corporation, responsável pela remodelação dos navios da República Democrática Popular da Coreia que violou as resoluções" internacionais e que Kim viajou com o seu colega Jon Chol Young entre Angola e o Sri Lanka numa "tentativa falhada" de vender navios militares.
Quanto a Moçambique, a ONU investiga a venda de um sistema de defesa área portátil, mísseis superfície-ar e um radar, numa operação feita entre a empresa coreana Haegeumgang Trading Corporation e a Monte Binga, que é controlada pelo Governo moçambicano.
"Moçambique ainda não forneceu uma resposta substantiva ao inquérito deste painel. Dois Estados-membros declararam que a Haegeumgang está ativa em Moçambique e na Tanzânia. Um Estado-membro especificou que a Haegeumgang forneceu o mesmo tipo de mísseis superfície-ar a Moçambique e à Tanzânia", diz o relatório.
Moçambique vai trabalhar com peritos sobre alegada violação
O Governo moçambicano afirmou esta terça-feira (12.09.) defender o desarmamento universal e disse que vai trabalhar com os peritos das Nações Unidas que estão a averiguar uma alegada exportação de armas da Coreia do Norte para Moçambique.
"O Estado moçambicano defende o princípio do desarmamento universal", referiu Ana Comoana, porta-voz do Conselho de Ministros, questionada pela agência Lusa no final da reunião do órgão.
O país é ainda signatário de vários tratados internacionais contra a proliferação de armas, nomeadamente nucleares, e subscreve as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, sublinhou. A governante considera assim que "fica claro qual o princípio" do executivo moçambicano.
Existindo uma comissão de peritos a averiguar o assunto, "o Governo vai trabalhar com essa comissão para perceber melhor quaisquer questões" que possam surgir, com vista ao "devido esclarecimento, em tempo oportuno". "Mas tudo quanto o nosso país tem feito é assegurar o cumprimento dos tratados em que é parte", concluiu.
Troca de interesses
Este mesmo relatório, dá conta de fornecimento de armas norte-coreanas ao regime de Joseph Kabila na República Democrática do Congo (RDC), nomeadamente pistolas automáticas para a guarda presidencial. Em troca, a RDC terá vendido urânio a Pyongyang. O governo de Kinshasa desmente essas informações. A RDC não mantém nenhuma ligação com a Coreia do Norte, disse à DW Lambert Mende, porta-voz do governo congolês.
"Curiosamente desde que essas histórias de bombas apareceram nos jornais começamos também a ler notícias de que fornecemos urânio à Coreia do Norte. Ninguém compra o nosso urânio e não temos programa particular ou qualquer aliança particular com a Coreia do Norte", afirmou Lambert.
Parceiro atrativo para África
Para Samuel Ramani, especialista em questões ligadas à Coreia do Norte na Universidade de Oxford, Pyongyang permanece um parceiro muito atrativo para centenas de países africanos que necessitam de equipamentos militares.
"Muitas importações de urânio da Coreia do Norte são provenientes de África. As minas de urânio da Namíbia e do Zimbabué são as principais fontes. Em contrapartida, a Coreia do Norte fornece armamento, assistência e formação militar e, principalmente, projetos de construção", explica.
O Uganda é uma das poucas exceções. Se alguns países ainda mantêm essas relações privilegiadas com a Coreia do Norte, o Uganda distanciou-se oficialmente do regime de Pyongyang.
DW – 12.09.2017