O ultramar como tragédia.
As campanhas portuguesas em África entre 1961 e 1974 representaram o maior esforço militar alguma vez feito por um país europeu depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Cerca de 800 000 portugueses europeus prestaram serviço militar no ultramar. Perto de 6000 morreram lá, dos quais c. 3000 em combate. Ao seu lado estiveram milhares de africanos, então portuguesas. Em 1974, quase metade dos 150 000 homens do exército português em África eram recrutas locais.32 Sobre tudo isso, há décadas que em Portugal se repetem ideias feitas como se fossem orações. Para uns, tudo não teria passado de um capricho suicida, arbitrariamente imposto aos portugueses pelo delírio imperial de um ditador. Para outros, tratou-se da malograda defesa de um idílio tropical, contra a intromissão subversiva de potência estrangeiras. É tempo de renunciar à tentação de marcar pontos em velhas polémicas políticas, e tentar perceber o que se passou. Foi a guerra o simples resultado da natureza do regime político português em 1961, ou da idiossincrasia do seu chefe? Não. Nenhum governo português poderia ter feito outra coisa em Março de 1961 senão enviar tropas para proteger as populações ameaçadas de limpeza étnica no noroeste de Angola. Quando o corpo expedicionário chegou a Angola, os seguidores do partido armado clandestino chamado União dos Povos de Angola tinham chacinado milhares de pessoas entre as quais c. 500 brancos, naquele que foi o maior massacre de civis europeus em África no século XX. Não se tratou de um excesso acidental. Os chefes da UPA eram amigos de Frantz Fanon. Fanon, uma das coqueluches da esquerda revolucionária mundial, recomendava a violência contra os «colonos» como forma de resolver o problema do «colonialismo»: segundo disse num dos seus momentos mais líricos, «para o colonizado, a vida só pode surgir do cadáver em decomposição do colono».33
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