Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo, “COMBATE À POBREZA” e “AUTO-ESTIMA”(Repetição)
Beira (Canal de Moçambique) - Os políticos que proclamam o fim da pobreza absoluta como um objectivo a ter em vista não estão errados quanto ao alvo. Mas estão bem errados quanto à metodologia. Estão errados quanto aos procedimentos e quanto aos aspectos culturais e filosóficos da batalha em que dizem estar engajados pois não se combate a pobreza com esbanjamento de recursos como todos os dias qualquer cidadão pode ver os mais altos dignitários do Estado em afrontas militantes à miséria de quem os rodeia.
Também não se combate a pobreza sem respeitar as recomendações do Tribunal Administrativo quanto à Conta Geral do Estado e dando votos para as fazer passar na Assembleia da República.
Não se pode ser bem sucedido a combater a pobreza sem o cultivo de altos valores éticos e morais na função pública.
Sem uma cultura de trabalho e de combate cerrado contra conflitos de interesse entre a coisa pública e a privada também não faz nenhum sentido falar-se de combater a pobreza absoluta porque isso é «pregar no deserto»...
É simplesmente caricato que quem beneficia das posições na esfera governativa para fazer avançar negócios privados venha a público declarar que está combatendo a pobreza e ainda mais caricato é se ouvirmos esse alguém falar-nos do combate à pobreza absoluta. Aí é a hipocrisia das hipocrisias. E para cúmulo ainda nos vem tentar enganar alegando que existem moçambicanos com inveja dos que enriqueceram. É preciso ter muita lata e muita falta de respeito pelos pobres artificialmente produzidos deste país. E ainda mais lata tem quem enriqueceu sem que haja quem os tenha visto a trabalhar para ter tanta riqueza como a que hoje ostenta. E pior ainda: quem ficou rico com participações em empresas em percentagens que configuram as margens da corrupção.
Não fica bem a quem tem culpas no cartório querer aparecer feito santo.
Não quero defender puritanismo nem de coisa que se pareça. Só quero que não haja alguém que pense que os outros moçambicanos são parvos. Numa situação de campo nivelado e de igualdade de oportunidades decerto que outro galo cantaria. Muitos dos ricos de hoje ficariam a olhar para quem enriqueceu com mérito em vez de quem tem mérito andar a olhar para as fortunas exibidas por quem passa os dias a falar em combate à pobreza absoluta... Se as declarações de bens fossem públicas ninguém teria dúvidas de quem estou a falar…Os sem vergonha meteriam a cabeça na toca!…
Os promotores da auto-estima que só eles conseguem ter sabem disso. Sabem que numa situação em que não tenham os recursos públicos a disposição não vencem batalha alguma. Sabem bem porque se agarram aos tachos e cada vez que há eleições não param de tentar enganar os eleitores.
Onde é preciso trabalhar não se vêem esses moçambicanos. Tem apenas por hábito e tradição beneficiar e enriquecer com as posições e cargos que a política lhes vai oferecendo. Se não são PCAs disto e daquilo então são directores ou ministros. Tudo isso não acontece por acaso. É preciso garantir que determinados recursos estejam à disposição do partido na altura certa para que a máquina que neste país faz com que sejam sempre os mesmos os ricos e sempre os mesmos o pobres e os extremamente pobres, não pode parar. É preciso afinal garantir que os que combatem a pobreza absoluta sejam sempre os mesmos e os pobres absolutos idem. O sistema está assim montado e só se houver outro tipo de determinação será possível mudar de facto o que os que nos têm vindo a falar de mudança só o tem feito para enganar parvos.
As nomeações para cargos públicos mostram bem isso. Não fazem qualquer sentido com a experiência e conhecimentos de gestão. Os escolhidos não são os mais capazes de fazer melhor aos outros. Esta coisa de colocar a política no posto de comando tem objectivos concretos. Os nomeados estão lá para fazer o que uns quantos há muitos anos precisam que se faça para se irem perpetuando com os votos dos que se deixam enganar.
Alguns moçambicanos dirão que fazendo-se o que temos vindo a ver que se combatem as assimetrias no país. Só que essas mesmas assimetrias são cada vez mais acentuadas e o que se vê de bom é apenas o que não se pode evitar que quem trabalha de facto consegue fazer. O que se vê é o que os cidadãos laboriosos salvam das mãos dos predadores.
O acumular de evidências merece de todos nós uma outra atitude. Está em jogo agora algo que não pode ser adiado. O jogo sujo tem de merecer o tratamento adequado sob o risco de se estar sucessivamente a adiar a realização daquilo que a maioria dos moçambicanos de facto necessita.
Queremos todos ser ricos mas o país precisa de uma moralização urgente.
É preciso que todos aceitem pôr termo à “cegueira”. As incongruências manifestas e a recusa em aceitar-se compartilhar este país precisa de que, com a coragem necessária saibamos todos dar, cada um o seu contributo para que se ponha finalmente o país a caminhar de outra maneira mais adequada. Não podemos continuar a ajudar constantemente este estado de coisas a reproduzir-se.
Obedecer às orientações, repetir como papagaios domesticados a voz de chefias que sabemos estarem envolvidas em exercícios de enriquecimento próprio em detrimento da causa pública não pode ser a única política que os moçambicanos sabem fazer.
Temos um país sendo governado ao sabor de demagogias e mesmo face a resultados negativos força-se todo um povo a engolir baboseiras de políticos que já não tem nada a oferecer aos seus concidadãos.
Revolucionar a sociedade moçambicana, colocar a moral e a ética no posto do comando é mais importante e necessário do que prosseguir com uma ofensiva destinada a obliterar a oposição política do país.
Cosmética, e outras operações estéticas não convencem. No dia a dia nem o Conselho de Estado nem o PR se pronunciam perante as atrocidades que começam agora a aparecer e são o resultado prático de uma governação desastrosa para a maioria dos moçambicanos. A miséria indigna em que vivem milhões de moçambicanos não tem justificação moral nem política. Num país onde se ostenta tanta riqueza ainda é mais humilhante.
Quando existe incapacidade e negligência como convém aos políticos que se nos apresentam como a nossa única salvação, cabe a cada cidadão dar o seu contributo para se acabar com o que está a acontecer.
Uns e outros, todos podemos fazer muito mais por Moçambique mas não é seguramente com as políticas de quem está esgotado de ideias e obcecado pelo enriquecimento fácil que isso vai suceder.
É um imperativo nacional que deixemos de mentir a nós próprios. É preciso impedir que a mentira continue a perpetuar a miséria. É preciso impedir que nos continuem a enganar.
(Noé Nhantumbo)
CANAL DE MOÇAMBIQUE - 21.04.2009