Canal de Opinião por Adelino Timóteo
A justiça de Moçambique independente foi tão célere em arbitrar que o réu Rufino deverá pagar à sua vítima uma indemnização de duzentos milhões de meticais (três milhões de dólares), pelo olho que esta perdeu, em resultado de uma suposta agressão de que foi vítima por parte dele.
A mesma justiça de Moçambique independente foi tão célere em arbitrar, com o mesmo foco em indemnizações milionárias, o ressarcimento por parte do réu Zófimo à família da vítima Valentina, em cinquenta milhões de meticais.
A justiça deste mesmo país, tão célere, nunca arbitrou indemnizações em favor das vítimas de Samora Machel nem de Armando Guebuza, que se saiba, são aos milhares.
Se a compensação pela perda do olho de Josina Machel custa duzentos milhões de meticais, se a compensação pelo assassinato de Valentina ronda os cinquenta milhões de meticais, é mais um aviso à navegação a todos os que tropeçarem com os parentes e alegados, próximos ao regime, com os nacionais da corte e de sangue azul.
A vida de todos os elementos do regime e alegados está protegida por cima, assegurada para quem tropeça a meter-se pelo meio, como nos exemplos acima. Mas já não têm a mesma sorte nem o mesmo valor a vida de um cidadão comum morto numas manifestações em Mocímboa da Praia, numa cadeia em Mocímboa da Praia. Não tem o mesmo valor a vida do meu pai assassinado pela Frelimo na cadeia, sem julgamento nem um processo formado, de pois enterrado num lugar escondido.
Não tem o mesmo valor a vida de Uria Simango, de Joana Simeão, de Gwengere, de Unhai, de Kavandame, porque a célere justiça deste país nem sequer se digna a intimar o Estado a descobrir as valas comuns onde as referidas vítimas estão enterradas.
Vimos recentemente como o advogado de uma vítima esgrimiu a sua defesa, imputando factos a um réu, como se os visse através de uma bola de cristal, acusando-o de ter planeado um crime continuado, cujo cume seria assassinar o pai de uma determinada vítima.
Disse-o com todos os dentes num tribunal e junto da justiça de uma instituição “independente”, sobre um cidadão (veja-se como tem a vida protegida, nem sequer sofreu um beliscão, nem arranhão), que em casos semelhantes e piores, levou a milhares de moçambicanos a operação produção, trinta e cinco mil destes morreram à fome, comidos por leões e abutres, nos campos de reeducação.
Um cidadão que conta com todos os luxos do Estado e que a mesma justiça abstrai de o levar a responder por uma dívida assumida pelo mesmo Estado, em duzentos milhões de euros. Vimos como a justiça “independente” de um Estado sofre de desmemória no caso de uns, e recorda-se de tudo, quando é para punir uns.
Não só favorável aos crimes hediondos que se cometeram contra os parentes de alegados do regime.
Mas tomamos os casos de Uria Simango, Celina Simango, Gwengere, Unhai, Casal Ribeiro, como se sentirão os familiares, perante estes casos? Graça Machel, cujo marido foi o assassino daquelas vítimas, veio ao terreiro reclamar justiça sobre o olho milionário da filha. É conhecida activista dos direitos humanos. Tem sido agraciada em todo o mundo. Alguma vez Graça Machel pensou em que já é tempo de apelar para que se restaure as feridas e dores causadas pelos excessos de Machel, Guebuza, Vieiras e companhia, se é de verdadeira reconciliação que a família moçambicana necessita?
Repudio todas as formas de violência e assassinatos, mas jamais me esquecerei que dirigi à Procuradoria da República deste país dois requerimentos apelando que me sejam restituídas as ossadas do meu pai, que, como Moçambicano, tendo participado na luta armada, não merecia o vexame reiterado que tem sofrido desta mesma justiça, periclitante quando se trata de se manter em silêncio e ágil, quando se trata de punir “exemplarmente”.
É tempo desta mesma justiça “independente” velar pelos proscritos, que conhecem de leis, mas não são amparados pelos princípios de igualdade e justiça social pugnado pelo nosso “Estado de Direito”.
Dito sem pretensão revanchista, mas em solidariedade com outros. Pelo amor ao próximo, acima de tudo.
A bem da Nação!
(Adelino Timóteo)
CANALMOZ – 25.01.2018