Os distritos produtores de feijão bóer nas províncias moçambicanas de Nampula, norte do país, e Zambézia, centro, enfrentam uma crise económica devido à superprodução desta cultura na Índia, refere um estudo da ONG britânica International Growth Centre (IGC).
O estudo, intitulado "Todas as fichas num único feijão: lições da crise de feijão bóer de 2017", refere que o excesso de produção na Índia, único mercado internacional deste alimento, provocou uma queda de mais de 50% no preço e erosão do poder de compra dos produtores, desencadeando uma crise económica nos respectivos distritos.
"Mais de 1,2 milhões de produtores da zona centro e norte do país apostaram nesta cultura na campanha 2016-17 como fonte de rendimento", assinala o estudo.
Contudo, desde os primeiros dias da colheita, registou-se uma queda drástica do preço de feijão bóer, de uma média de 45 meticais o quilo (seis cêntimos de euro), em 2016, para cinco meticais o quilo (0,068 cêntimos de euro), em 2017, ao ponto de não permitir que os agricultores recuperassem metade do valor investido na produção.
"A falta de poder de compra por parte dos produtores precipitou uma crise económica nos distritos onde investiram mais no feijão bóer, sem outras culturas de rendimento", refere a avaliação.
Na última década, o crescimento robusto da produção de feijão bóer em Moçambique resultou da procura indiana, impulsionada pela assinatura de um memorando de entendimento entre os governos dos dois países em 2016.
O acordo foi assinado por ocasião da visita do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, a Moçambique, recorda o IGC.
Da colheita de 2016, o país exportou mais de 170 mil toneladas de feijão bóer, o correspondente a 125 milhões de dólares (102 milhões de euros).
O memorando de entendimento previa que a Índia importasse 125 mil toneladas de feijão bóer na época 2017-2018, aumentando esta quota gradualmente para 200 mil toneladas até 2020-2021.
No entanto, em 2016, além de promover a produção em Moçambique, a Índia estimulou a produção doméstica de feijão bóer.
"A combinação deste factor com a boa época chuvosa e os altos preços praticados na anterior campanha agrícola fez com que a colheita indiana de 2017 atingisse um recorde de todos os tempos, suficiente para satisfazer a procura interna e criar um excedente de mais de um milhão de toneladas", destaca o estudo.
O IGC acusa as autoridades moçambicanas de ineficiência na gestão da situação, o que paralisou as exportações.
"A campanha de 2017 constituiu uma prova irrefutável do perigo que existe em fazer-se um investimento sem um conhecimento prévio das dinâmicas do mercado", refere o documento.
Em Setembro de 2016, dois a três meses antes da sementeira em Moçambique, já estava disponível a previsão de que 2017 iria testemunhar uma colheita recorde de feijão bóer na Índia, afirma o estudo.
Com base nessa informação, prossegue, o cenário actual no meio rural moçambicano podia ter sido antecipado.
"O Governo de Moçambique deve apostar numa unidade de monitorização das dinâmicas do mercado internacional, principalmente da Índia, principal destino do feijão bóer", acrescenta o estudo.
LUSA – 21.01.2018