Por Roberto Tibana
No dia 2 de Outubro de 2016 publiquei um post com o título “DIÁLOGO PARA A PAZ OU MOBILIZAÇÃO PARA A GUERRA TOTAL EM MOÇAMBIQUE?”. Para quem quiser ler na íntegra o post é localizado aquí: https://www.facebook.com/robertojulio.tibana/posts/1130158640403690, e já aviso que foi longo e cheio de citações de fontes oficiais pois o assunto é delicado. Hoje volto a ribalta e mais abaixo explico porquê.
Esse post (de 02/20/2016) veio a propósito de uma decisão do Conselho de Ministros da República de Moçambique na sua 33ª sessão ordinária realizada no dia 27 de Setembro desse ano de 2016, na qual aprovou uma série de propostas de lei que na altura pretendia submeter à Assembleia da República para apreciação e eventual aprovação. De entre elas, encontra-se a proposta de LEI DA MOBILIZAÇÃO E REQUISIÇÃO.
No usual “briefing” aos jornalistas dado nas terças-feiras o zeloso porta-voz do Conselho de Ministros na altura não mencionaava a existência dessa proposta que, no entanto, constava do comunicado integral que se encontra na pagina de Comunicados no website do Conselho de Ministros resumida da seguinte maneira (cito) : “A mobilização e a requisição compreendem o conjunto de acções preparadas e desenvolvidas pelo Estado, com oportunidade e eficácia, destinadas à obtenção dos recursos humanos e materiais imprescindíveis para a garantia e realização integral dos objetivos permanentes da política da Defesa Nacional.”(http://www.portaldogoverno.gov.mz/…/Comunicados…/(offset)/30).
Chamo desde já a atenção do leitor que, como verá mais adiante, não se trata aqui do usual Serviço Militar Obrigatório.
Na altura a minha discussão centrou-se sobre as seguintes questões (outra vez resumindo o post de 2 de Outubro de 2016):
Primeiro: a ver pela citação que o Conselho de Ministros da República de Moçambique fazia da referida proposta de lei, ela era uma cópia sem diferença de vírgula nem ponto de legislação estranha às circunstâncias nacionais sem se quer dar ao cuidado de contextualizar. Não se dava nenhuma explicação aos cidadãos sobre a oportunidade e a necessidade de atos legislativos com potencial de restringir fundamentalmente os direitos cívicos dos cidadãos e o funcionamento da sociedade. Com efeito, a definição da Lei acima citada era uma cópia integral do Artigo 2 da Lei no. 20/95, Portuguesa, assinada Por Mário Soares em Junho de 1995: Lei no. 20/95 – Regula a mobilização e requisição no interesse da defesa nacional; Diário da República – I Série-A, Nr. 160 – 13-7-1995, pag. 4422; disponível em https://www.parlamento.pt/Legislac…/…/Leis_area_Defesa.aspx…).
Segundo: O Comunicado do Conselho de Ministros de Moçambique não mencionava que a “Mobilização e a requisição” estão previstos e extensivamente definidos na “nossa” LEI 18/97 DE 1 DE 0UTUBRO - Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas, através dos Artigos 12, 13, 14, e 15 (citados mais extensivamente no meu post de 02/10/de 2016), que rezam:
“ ARTIGO 12.- (Mobilização e requisição)
1. Os recursos humanos e materiais indispensáveis à defesa nacional podem ser utilizados pelo Estado, mediante mobilização ou requisição, nos termos da Constituição, da presente Lei e da legislação específica.
2. A mobilização abrange os indivíduos e a requisição tem por objecto coisas, serviços, empresas ou direitos.
3. …
4….
ARTIGO 13.- (Mobilização)
1. Para efeitos do artigo anterior, a mobilização é militar ou civil, consoante os indivíduos por ela abrangidos se destinem a ser colocados na dependência das Forças Armadas ou das autoridades civis.
2. …
ARTIGO 14.- (Requisição)
1… Podem ser requisitados os bens móveis e imóveis assim como os serviços de transportes, de comunicações ou quaisquer outros essenciais à defesa nacional, com o respectivo pessoal, material e infra-estruturas.
2. A requisição pode ter por objecto estabelecimentos industriais, a fim de laborarem para a defesa nacional.
3. …
ARTIGO 15.- (Regime da mobilização e da requisição)
1. ….
2. As pessoas mobilizadas ou abrangidas, pelas obrigações decorrentes da requisição de bens, serviços, empresas ou direitos estão sujeitas às disposições do Código de Justiça Militar e do Regulamento de Disciplina Militar nas condições fixadas na Lei de Mobilização ou Requisição.”
Tal como a citação que fiz do comunicado do Conselho de Ministros, quem fôr ler a legislação portuguesa de 1995 sobre estas matérias vai rapidamente constatar que o articulado da “nossa” Lei 18/97 de 1 de Outubro de 1997 foi de lá enxertado.
O referido post (02/10/2026) suscitou muito interesse cívico no assunto incluindo por parte dos meus leitores no Facebook (225 reações, 81 partilhas, e 54 comentários). Nunca saberemos se foi por força dessa reação ou por qualquer outra razão, porém o certo é que na altura a referida proposta de Lei foi não chegou a ser debatida pela Assembleia da República, e as minhas fontes dizem-me que de facto o Executivo recuou e não a levou lá.
Como disse acima, hoje retomo o assunto porque ele volta a ribalta, desta vez por via da agenda que está a circular para a próxima sessão da VII Sessão Ordinária da Assembleia da República cujo início está previsto para o dia 28 do corrente mês de Fevereiro de 2018. Se as minhas fontes não me induzem em erro (e neste momento não tenho razões para pensar que assim seja depois dos cruzamentos feitos), a Lei de Mobilização e Requisição contará (se não for outra vez adiada) como item nr.24 da agenda da sessão da AR que está para começar.
Como muitos devem ter ouvido nos noticiários da noite de ontem (6 de Fevereiro de 2018), O Presidente da República dirige-se em Comunicação a Nação as 12:00 de hoje (7 de Fevereiro) sobre o assunto da “Descentralização” acerca do qual tem estado a negociar com o Presidente da RENAMO. A Porta-Voz do Conselho de Ministros que anunciou o evento foi clara dizendo que outros assuntos relacionados com a Paz em Moçambique ainda estão em negociação e portanto não serão o objeto principal do Presidente da República na sua comunicação de hoje. Esperemos pacientemente para ouvir, e se assim acontecer, como é que Presidente da República justificará isso.
É bom que fique desde já fique claro o seguinte, tal como o disse em Outubro de 2016 (e cito-me): “Sou contra uma Lei de Mobilização e requisição? Não! Não sou, muitos Estados decentes têm-na e devem tê-la, faz parte da preparação de um quadro legal preventivo e de preparação para a defesa da pátria e da soberania e outras emergências de extrema gravidade.
Sou por uma maior transparência nos atos legislativos do governo? Sim! Precisamente por isso escrevo sobre isto agora.
Sou pela paz e contra atos que exacerbam o espírito de violência? Sim! Sim, por isso me arrisco a falar deste assunto em público.
Sou anti-patriota e uma ameaça à segurança nacional por trazer estes assuntos a debate público? Não, anti-patriotas e ameaça à segurança nacional são aqueles que nas costas do povo subverteram as leis fundamenais para contrair dívidas ilegais e secretas, em grande parte para desenvolver uma máquina de guerra e de repressão do povo, e que agora tramam uma mobilização e requisição na penumbra.
Se há guerra que vai exigir mobilização e requisição digam-nos. Não nos venham um dia dizer que não há guerra, para no dia seguinte tramarem uma mobilização e requisição sem nos dizerem nada abertamente.
Uma política de segurança nacional necessita do apoio e participação patriótica do povo, não se faz nas costas do povo!
Por esta razão, e até prova em contrário, acreditarei sempre que as atuais negociações entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO são uma distração enquanto se elimina a oposição e se silenciam os críticos e as pessoas de opinião diferente, e se continua o esforço para uma guerra civil total.” (fim de citação).
O contexto de hoje é diferente do de Outubro de 2016. Nessa altura havia hostilidades miliares ativas entre a RENAMO e as forças do Governo da FRELIMO, com vítimas civis inocentes e uma atividade intensa de eliminações físicas seletivas através dos esquadrões da morte. Hoje existe uma trégua decretada unilateralmente pela RENAMO e aparentemente respeitada por ambas as partes. Em Outubro de 2016 não sabíamos da existência de atividades de grupos extremistas no norte da provincial de Cabo Delgado. Esse facto é hoje do conhecimento público, e pelos relatos dos populares da zona, já nessa altura (2016) o governo havia sido feito saber disso.
Leva-me isto tudo a crer que muito certamente se a dita Lei não tivesse sido adiada em 2016 a mobilização e requisição teria sido decretada com o pretexto de combater RENAMO. E os nossos filhos teriam sido enviados para combates com grupos extremistas (dos quais até bem pouco tempo o governo não falava) sob capa de combater a RENAMO!
Mas por que razão o governo teima em fazer coisas as escondidas?
Esperemos para ver se na sua Comunicação a Nação hoje o Presidente da República nos explica bem o que se passa e qual é o plano verdadeiro do Governo.
Roberto Tibana
In https://www.facebook.com/robertojulio.tibana/posts/1626768147409401