O tenebroso dia 27 de Maio de 1977 - Orlando Ferraz
Posted: 27 May 2018 10:21 AM PDT
Banjul/Gâmbia – Em 27 de Maio de 1977, apenas 19 meses de independência, tem lugar em Angola uma, denominada pelo então regime de António Agostinho Neto de “intentona golpista”, comandada por Alves Bernardo Baptista, vulgo Nito Alves, na altura membro do Comité Central do MPLA. O alegado ”golpe” é abortado, deixando a sua trás um pesado fardo para milhares de famílias: mais de 28 mil mortos (cáculos da Fundação 27 de Maio), inclusive o chefe dos alegados golpistas, caçado e posteriormente executado. Henriques Teles Carreira(Iko), então Ministro da Defesa, terá jogado papel importante e decisivo no julgamento extra-judicial e posterior fuzilamento do cabeçilha da rebelião armada, alegadamente feito por um pelotão de fuzileiros no Grafanil, arredores de Luanda.
Fonte: Club-k.net
Para as milhares de famílias, que perderam seus entes queridos na repressão sobre os insurretos. O segredo por parte do regime em volta desta questão, continua sendo considerado Segredo altamente de Estado, ou melhor e para citar o historiador angolano Carlos Pacheco "...o silêncio tem funcionado qual uma espécie de arca fechada a sete chaves, que se exita em abrir..."(in Carlos Pacheco: MPLA- Um Nascimento Polémico, 1997.)
Uma página negra na história de Angola
1O 27 de Maio de 1977 constitui a página mais negra que a história de Angola conheceu, por a repressão macabra sobre a mesma, registar-se em período de Independência, daí a gravidade acrescida do regime do MPLA, e isso para não citar outras eliminações físicas no período das guerras de libertação nacional, igualmente não esclarecidas. Verdades sobre os reais motivos de assassínios como os de Matías Miguéis, José Miguel Francisco [irmão do conhecido cantor angolano “Calabeto”] braços direito de Viriato da Cruz, mortos por ordens alegadamente expressas de Agostinho Neto em 1965, no regresso de uma Conferência em Jakarta na Indonésia, continuam igualmente sem culpados visíveis. E quém, e porque mataram a nacionalista Deolinda Rodrigues, considerada pelo próprio MPLA como sendo heroína nacional? Retaliação de Holden Roberto pela morte de Matías Miguéis e José Miguel Francisco? Infelizmente testemunhas oculares que bem poderiam responder a centenas de perguntas e esclarecer infinitos labirintos da verdadeira história do Nacionalismo Angolano, optam pelo silêncio cúmplice. Destes, fazem ou fizeram parte: António Jacinto, Pedro Van-Dúnen Loy (morto em condições estranhas em 1997); Hugo de Meneses, falecido no seu prolongado exílio português. Estes, são sómente alguns dos nomes, daqueles que vão partindo levando consigo, relíquias do nosso historial nacionalista.
Afinal, o que esteve por detrás do cenário do 27 de Maio? Tinha necessáriamente de existir um 27 de Maio, e a repressão teria que ser tão violenta tal como ela se deu? Que relação histórica teve o 27 de Maio com outras rebeliões e Movimentos contestatórios no seio do MPLA tais como as conhecidas "Revolta do Leste" comandada por Daniel Chipenda e a "Revolta Activa" de Gentil Viana?
Não restam dúvidas de que a falta de debates e contestações internas abertas principalmente no seio do MPLA mas também na UNITA e na FNLA, exclui até certo ponto, possibilidade de se esclarecerem alguns “pendentes” da nossa rica história nos períodos pré, durante e do pois independência.
Ao longo da história da existência do MPLA, FNLA e da UNITA, todas contestações e dissidências foram repelidas com a maior violência possivel por parte das respectivas lideranças, e muito particularmente por parte dos líderes "incontestavéls", Agostinho Neto, Holden Roberto e Jonas Savimbi. Desta forma estava excluído qualquer campo para o debate franco e aberto bem como para crítica e muito menos a auto-crítica.
Já o histórico Viriato da Cruz, cuja figura e nome foram publicamente ofuscados e posteriormente apagados pela poderosa máquina de Informação e Propaganda(D.I.P) do Comité Central do MPLA-PT, não levou da melhor com o seu antagónico, Neto. A ambos lhes eram reconhecidas qualidades como: intelectualidade, disciplina, robustés e perfil político e outras mais. Em termos comparativos entretanto, Viariato da Cruz era, segundo seus contemporâneos, o homem que detinha o poder e influência sobre as massas aderentes ao MPLA, mais metodológico e políticamente moderado.
Alves Bernardo Batpista Alves (Nito Alves)
Tal como Viriato, no MPLA também existiu um outro homem, que pese embora e em termos de idade não fazer parte da geração dos fundadores do MPLA, conseguiu a dada altura a popularidade das massas. Sim, este homem foi Nito Alves. O politólogo e historiador congolês Jean-Michel Mabeko Tali, resumiu assim a pessoa política de Nito Alves bem como sua inserção e carreira no MPLA: “ foi um combatente de uma região que pagou caro a sua aproximidade com a capital da Colónia. O seu contacto com a direcção do MPLA passou-se practicamente no fim da guerra. Ele como outros da Primeira Região, tinham claramente feito entender a sua diferença quanto a visão que tinham não só da forma como a luta foi dirigida, mas muito rápidamente, de questões como a gestão da questão racial da sociedade [bem como no seio do Movimento] e as questões sociais”.
Pertencia ao MPLA já instalado em Luanda, antes da chegada de Neto e sua etourange em Fevereiro de 1974 na capital, Luanda Nito Alves, que, aproveitando a soberba chance de organizar o MPLA em Luanda até antes de Neto fixar residência em Luanda depois de uma longa ausência mais na Europa do que nos Maquis. Em pouco tempo Nito Alves ganhou tanta popularidade chegando mesmo a conotado como sendo líder de uma tendência pró- soviética (mais tarde provada devido sua assiduidade em Moscovo).
Com a chegada em Luanda de Neto e seu círculo restrito, de onde Nito Alves era partícipe, começam as intrigas com o objectivo de o afastar do mesmo.
As divergências internas foram crescendo, ao ponto de mais uma vez chegarem a existir pelo menos três fracções no seio do Partido:
a) Os Netistas : (Neto) entre eles também o ideológico Lúcio Lara e Iko Carreira;
b) Os Nitistas : Nito Alves, José Van-Dúnen, Bakalov e outros;
c) Os Tugas: conotados com o Partido Comunista Português-P.C.P. alegadamente mais próximos á Nito Alves.
Este cenário é prácticamente parte ou sequência de uma norma que no passado longínquo marcaram as Dicidências no seio do MPLA, sempre em forma de Trindade: Façcão Neto; Facção Chipenda - também chamada de Revolta do Leste e a Revolta Activa.
Ao se aperceber que as rebeliões no seio do Movimento visavam reduzir seu protagonismo, carisma e poder, Agostinho Neto aborta a realização de uma Conferência Nacional do Movimento proposta por dirigentes contestários da liderança de Agostinho Neto, entre eles lógicamente Nito Alves. Apatir desta altura, as suspeitas de uma rebelião por parte de Nito Alves e sua forte ala básicamente militar estava preto no branco, isto é, mais do que evidente. Aliás, segundo documentos por consultados bem como conversas que tive e tenho tido com algumas testemunhas oculares, os movimentos preparativos de Nito Alves e sua equipa, nunca passaram despercebidos pela liderança do MPLA, foram sim é menosprezados ou sub-estimados. Este status quo ganha novos e sérios contornos, uma semana antes da tentativa do alegado golpe de estado, com a agudização da situação para os revoltosos. O Comité Central do MPLA reúne-se nos dias 20 e 21 de Maio, seis dias antes da intentona golpista, e decide expulsar do grêmio central do partido, os dois que viriam mais tarde a ser identificados como sendo os “cabecilhas” do Golpe de Estado, a saber: Nito Alves e Zé Van-Dúnen.
Acto contínuo, Neto autoriza a temível máquina repressora da DISA moldada ao estilo e eficácia da PIDE e com métodos repressivos comparados aos da GESTAPO de Hitler e da STASI da antiga RDA, para que se fizesse um acompanhamento milimétrica e literalmente severo e consequente da preparação de uma provável insurreição. Com os russos e cubanos a jogarem com o pau de duas pontas , pois estavam informados do Golpe e o apoiavam até certo ponto, e ao mesmo tempo em estado de alerta e prontidão para abortá-lo, em caso de solicitados pelo regime de Neto. Resultados preliminares da alegada intentona golpista: mais de 28 mil mortos, milhares de desaparecidos, mais de metade dos oficiais superiores do Exército no activo (Majores e Comandantes na sua maioria) foram abatidos da forma mais selvagem. Nito Alves, o homem mais procurado em Angola nos meses de Maio e Junho de 1977, viria a ser preso algures na actual Província do Bengo, para onde se refugiara em busca de refúgio. Entregue ás autoridades em Luanda, foi submetido á um longo e rigoroso interrogatório. José Eduardo dos Santos, ex-Presidente da República e ainda Presidente do MPLA, preside a comissão criada para julgamento de tão “ilustre” réu. Para legitimar a sua própria execução, Alves foi finalmente forçado a redigir uma nota, uma espécie de sentença de morte, legitimando sua cumplicidade primária nos acontecimentos do 27 de Maio de 1977.
Com o aborto da rebelião armada de 27 de Maio de 1977, fechava-se um cíclo recém iniciado como bem o descreve Jean-Michel Tali “Nito queria uma revolução pura e dura, do tipo bolchevique, o seu discurso pró soviético não deixara dúvidas sobre isso. [...] O importante na minha opinião, é entender a dinâmica sócio-política que desemboca nesta tragédia. Parece-me importante colocar a questão em termos das lutas sociais que sustentam o discurso político de Nito e sua convicção quase messiânica, de que a história tinha colocado nos seus ombros um papel fundamental neste processo revolucionário angolano”.
*Politólogo
Advogado propõe ao novo PR comissão para trazer as verdades do 27 de Maio
Posted: 27 May 2018 07:39 AM PDT
EXMO SENHOR
GENERAL JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO
PRESIDENTE DA REPÚBLICA DE ANGOLA
VICE PRESIDENTE DO MPLA
L U A N D A
Excelência,
Queira, antes de mais, aceitar os meus respeitosos cumprimentos.
Sou Miguel Francisco, vulgarmente conhecido por “Michel,”, advogado, sobrevivente da tragédia do triste mas célebre e histórico 27 de Maio de 1977 e venho expor e sugerir o seguinte:
É minha firme e forte convicção, de que Vossa Excelência tem plena consciência das consequências nefastas resultantes dos trágicos acontecimentos do dia 27 de Maio de 1977, que vestiram de vergonha, interna e externamente, o Estado Angolano que Vossa Excelência actualmente dirige.
Senhor Presidente,
41 anos passaram desde àquele fatídico dia. Enquanto sobrevivente, julgo ser chegada a hora do MPLA e do Executivo Angolano na pessoa de vossa Excelência instituir uma Comissão, cuja designação julgo não importar, para que se dê início ao processo de apuramento do que realmente se passou, dando assim também início a uma verdadeira e genuína Reconciliação entre as vítimas e os responsáveis pela tragédia, muitos deles ainda em vida.
É que sem que haja um processo que tenha como base a descoberta da verdade, não será possível sarar as feridas que ainda sangram nas mentes dos familiares das vítimas da tragédia, com especial realce para os filhos e as viúvas, pois, muitos nem sequer certidões de óbito lhes foram dadas, até o momento.
Salvo opinião diferente dos que ainda teimam em minimizar essa questão do dia 27 de Maio, entendo que pela sua magnitude e profundeza, a discussão num fórum apropriado, sem quaisquer ressentimentos e muito menos julgamentos de quem quer que seja, os ganhos serão manifesta e inegavelmente superiores do que a sua simples minimização.
Assim, mesmo que vossa Excelência por hipótese (apenas hipótese), por razões pessoais tenha aplaudido a forma como os responsáveis pela tragédia levaram a cabo o massacre, o que não ouso admitir, nem mesmo nas profundezas do meu subconsciente, mas, enquanto Chefe de Estado, em funções, e vice-presidente do MPLA, tem a obrigação de tratar este Dossier que pela sua magnitude é, sem sombra de dúvidas, um assunto de Estado que deve figurar na vossa agenda como prioridade de mandato.
Não queira cometer o erro de minimizar essa questão como sempre se tentou durante estes anos todos. Esta atitude em nada vai abonar a vossa reputação enquanto Chefe de Estado. Porque? Porque as consequências resultantes da tragédia são tão transversais que angolano algum, nenhum mesmo, quer dentro como os da diáspora, não tenha sido atingido directa ou indirectamente com os “estilhaços” do massacre.
Daí que sugiro a vossa Excelência, senhor Presidente da República e actual vice presidente do MPLA, que em nome da verdade e da justiça que foi negada às vitimas da tragédia, ao menos tenha a ombridade de ordenar a institucionalização da Comissão que proponho, para que nos possamos verdadeiramente reconciliar.
Valho-me da ocasião, para expressar, antecipadamente, os meus sinceros agradecimentos, subscrevendo-me com elevada estima e consideração.
Luanda, 27 de Maio de 2018.
MIGUEL FRANCISCO “Michel”
(Sobrevivente)
27 de Maio: Esquecer ou rememorar ? Eugénio Costa Almeida
Posted: 27 May 2018 07:35 AM PDT
Lisboa - Recordam-se 41 anos do “Golpe de 27 de Maio de 1977” ou “Fratricídio do 27 de Maio de 1977” entre militantes do MPLA, então MPLA-Partido dos Trabalhadores; recorda-se, rememora-se ou há quem persista em mantê-lo para que, sem coragem, de outra forma, o conservar sempre na memória do colectivo um Processo que persiste em estar na anamnese da sociedade?
Fonte: Folha8
Há uns anos, no portal Notícias Lusófonas, por ocasião dos 30 anos desta data, escrevia sobre uma entrevista, a um jornal português, creio que o Público, sobre este tema, de um dos comandantes cubanos que, na altura, estava em Luanda – Rafael del Pino, autor de “Proa a la Libertad” (Rumo à Liberdade) – a um jornal português, onde aquele apresentava o “Golpe de 27 M” como tendo sido um “jogo de poder” entre cubanos e soviéticos (algo que parece vir-se confirmando, cada vez mais, em recentes investigações académicas).
Ora, escrevi na altura – como agora –, que aquela entrevista parecia reforçar a ideia que Agostinho Neto não teria morrido, em Moscovo, devido à doença de que padecia e que levou à mesa de operações, mas que teria sido vítima de um eventual macabro jogo de interesses soviéticos (um assunto nunca cabalmente esclarecido e que, ainda hoje, é assunto tabu, nem mesmo nos documentos desclassificados do KGB e já – alguns – transcritos por autores diversos, este assunto é tratado).
Nesse mesmo texto recordava – e mantenho – que sobre o 27M, talvez fosse altura de todos os que nele participaram se juntarem num conclave nacional, tipo Comissão de Reconciliação e de Verdade, e todos, mas TODOS, expiarem as suas culpas – aqueles que participaram no Golpe e os que purgaram no pós-golpe –, permitir às famílias fazerem o luto oficial – muitas hão que desconhecem onde estão enterrados os seus entes queridos vitimados (foram cerca de 30 mil as vítimas) nas purgas posteriores ao Golpe – e, finalmente, reconciliar a sociedade.
Há que dar oportunidade de milhares de famílias obterem as certidões de óbito dos seus familiares desaparecidos. Não basta dizer que a Guerra acabou quando na Sociedade ainda persiste uma ferida muito grave por sarar; (vários depoimentos recentes, no Folha 8, sobre este persistente assunto, assim o demonstram)!
Citando, Rafael Marques, em entrevista ao referido jornal português que entrevistava del Pino, que só quando isso acontecer haverá um processo “genuíno de reconciliação” e, finalmente, os mortos poderão “repousar na memória colectiva da sociedade, ser emocionalmente enterrados pelos seus entes queridos e justificar o perdão a mandantes e carrascos”.
Porquanto numa sociedade, onde todos os anos o espectro do 27 de Maio de 1977 renasce e sempre com cargas emocionais traumáticas e, por vezes, descompassadas, porque numa sociedade onde não haja entendimento nem reposição da verdade, reabilitação da injustiça, reconhecimento das responsabilidades individuais e colectivas, do pedido genuíno do perdão – e este deve ser feito por todos os que estiveram no processo – temos que concluir que será sempre uma sociedade castrada.
É altura de todos olharmos para Angola como um País que enterrou todos os seus dramas.
É altura do MPLA abrir-se, de vez, à comunidade e criar, internamente ou mesmo através do Governo nacional, na linha do que fez, e muito bem, a África do Sul e, mais recentemente, o Brasil, a tal Comissão de Verdade onde tudo pudesse ser transmitido à comunidade e libertar todos os fantasmas.
Recordemos que o MPLA está a caminho de uma nova direcção em Setembro, data prevista para a passagem de testemunho na liderança do MPLA entre José Eduardo dos Santos e João Lourenço – se não houver surpresas de última hora;
Se João Lourenço, que já está à frente dos destinos do País, e que – tudo o parece estar a mostrar nesse sentido – deseja ser um reformador (já que não quer ser o Gorbatchov nacional, como eu alvitrei num artigo no Africa Monitor e numa entrevista ao jornal Público) do tipo Deng Xiaoping;
Então que, se não for antes, haja – como ainda ontem alguém, com pertinência, o referir – uma Setembrina e, nessa altura, o partido se abra, de vez, à sua comunidade interna e ao País e o tema 27 Maio de 1977, passe, descansadamente, à História.
Ou seja, todos os que participaram neste processo se juntem num conclave nacional, numa Comissão de Reconciliação e de Verdade, e todos, mas TODOS, redimirem os seus erros e culpas, permitir às famílias fazerem o luto oficial e, finalmente, reconciliar a sociedade.
Quando isso acontecer Angola será mais forte, mais una, mais fraterna, mais solidária! Têm a palavra o “donos o processo 27M”!
(*) Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e Pós-Doutorando da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto.
27 de Maio: Manuel Aragão, Ambrósio Lemos assim calados não estarão á cuspir na nossa própria história ? – Fernando Vumby
Posted: 27 May 2018 07:05 AM PDT
Luanda - INTRODUÇÃO: Quem viveu os acontecimentos do 27 de Maio e não aceita falar dele , é o mesmo para mim como se estivesse á cuspir na sua própria historia e estar de acordo que aqueles dias que vivemos mergulhados no sangre caiam na escuridão do esquecimento.
Fonte: Club-k.net
Com a nossa reflexão hoje dia 27 de Maio sobre aqueles acontecimentos , nós todos que sofremos e ainda tempos voz , temos sim a obrigação de fazer sangrar algumas feridas nossas jamais cicatrizadas para honrarmos os nomes daquelas muitas centenas de pessoas que foram caladas para sempre.
Vamos refletir para que se deixe de optar pelo autoritarismo , pela lei da força ( trungungo ) pois ele só fomenta o lado escuro das nossas vidas , o medo , a mesquinhez , a mediocridade , a mentira , a hostilidade , as vinganças , os ajustes de contas e o isolamento pela desconfiança entre angolanos irmãos da mesma terra.
MORREM UM DIA SEM CONTAR NADA ?
Tenho medo sim que eles um dia morrem já que a morte é a única certeza que temos , como vitimas também daquele acontecimento sem dizer nada do que passaram e viram com os seus próprios olhos na cadeia .
Para um povo e país como o nosso já pobre sem si , sem bibliotecas , sem livros e com tantos factos ate históricos manipulados por maldade política , ser muito triste para os nossos jovens famintos e curiosos em saber as verdades sobre o 27 de Maio de 1977.
Pois , sempre que morre alguém que esteve detido nos acontecimentos do dia 27 de Maio sem antes ter contado nada , é o mesmo como se decretasse uma espécie de castigo aos nossos jovens lhes condenando á não saberem nada do que se passou na realidade naquele dia.
.Somos hoje um país de maioria jovem muito curiosa , interessada , com fome permanente em saber ate ao mais pequeno pormenor tudo que aconteceu no dia 27 de Maio de 1977, vocês não imaginam quantos jovens me escrevem por semana me aconselhando á escrever um livro o mais rápido possível sobre aquele acontecimento.
Tenho medo sim , que tudo que eles memorizaram se perde e não haja transmissão para estes jovens de hoje e gerações vindouras num país onde não há quase nenhuma forma de registos para preservação de documentos , antes pelo contrários raramente até não se queimam por ordens superiores para salvar nomes de criminosos glorificados e seus crimes.
Muito embora nenhum deles deve ser obrigado á fazer daquilo que viveram nas cadeias um livro aberto como eu e outros fizemos , mas quando o que está em causa são as paginas mais sangrentas da história de um povo , aceitar levar mesmo tudo consigo para o caixão como já fez muita gente , se calhar porque nunca acreditaram que um dia iriam morrer não é um ato de covardia e antipatriotismo ?
ARAGÃO , AMBRÓSIO LEMOS E BRITO JÚNIOR
Alguma vez tinha que falar deles , pois o que está em causa não é aquilo que eles são hoje no governo ou foram , mas sim a verdade histórica dos acontecimentos do 27 de Maio de 1977 .
E como pessoas que foram meus companheiros de cela ( F ) na cadeia de S.Paulo e depois campo de concentração do Tari na kibala não estaria a fazer justiça se não os mencionasse.
BRITO JÚNIOR
O mais velho Mateus Morais de Brito Júnior de quem eu já lia antes as suas cronicas eletrizantes carregadas de verdades que muitos não se arriscariam á escrever no tão famoso " Angolense " de que foi ele mesmo o fundador e primeiro redator principal , só conheci pessoalmente ao longo da viagem de Luanda á Kibala vindo da casa CR / Casa da reclusão onde esteve detido e não na cadeia de S.Paulo como no caso dos outros dois..
Já na Kibala entre mim e o mais velho Brito Júnior se forjou uma relação de betão , muito especial que se foi consolidando e fortificando ao longo dos anos que mesmo depois da cadeia quando deu em ministro e deputado pelo seu seu querido e sempre ( MPLA ) não mudou nada.
Ele já é daquelas pessoas com quem eu ate mesmo no silencio me comunico , reservei uma crónica exclusivamente sobre ele , também para lhe agradecer pela a atenção , compreensão e forças que sempre me deu com as suas palavras que eram para mim autenticas e verdadeiras lições da vida.
No Tari já parecia meu pai , meu irmão mais velho , a luz que me iluminava o meu caminho e o travão na hora dos meus xinguilamentos sem papas na lingua contra as chefias do campo que me custaram quase ate mesmo a própria vida.
MANUEL ARAGÃO , AMBRÓSIO LEMOS E MATEUS MORAIS DE BRITO JÚNIOR
Estes três mais velhos como pessoas que passaram por minha vida num momento de transcendente importância histórica , cada um deles deixou as suas marcas , e eu mesmo é que decidi ficar com as boas lembranças ate porque não me recordo alguma vez ter notado uma atitude ruim de nenhum deles contra mim ou contra qualquer outro detido.
Claro que orgulho-me em os ter conhecido e convivido com eles mesmo apesar de ter sido no momento mais brutal , horrível e cruel da historia da minha vida , assim como também me orgulho do nosso passado onde cada um dava á sua mão ao outro .
O triste é hoje não construirmos o futuro com muito amor e atenção uns nos outros.
ARAGÃO / NA CADEIA DE S.PAULO
Era bom de bola , na hora do sol corria como um leão , embora magrito tinha boas fintas de corpo , joguei sempre na equipa dele , pois grande parte das partidas eram celas contra celas ou seja caserna . Também gostava de leituras o que sempre soube é que tinha sido estudante de economia .
AMBRÓSIO LEMOS / NA CADEIA
Era um mais velho já batido , já tinha sido policia no tempo colonial , morou no meu bairro nas Cs , mataram-lhe também um irmão nos acontecimentos do 27 de Maio e estava na cela com mais um cunhado o mais velho Vieira nem sei se ainda vive.
Era um mais velho que vivia a sua vida e deixava cada um viver a sua , simpático na altura , sorria com os pulmões , no campo do Tari na Kibala joguei na equipa dele ( Primeiro de Maio ? ) era uma espécie de presidente da equipa ) , fui o ponta de lance daqueles que nunca se lesionava tipo galinha rija .
Também teve iniciativas como alfabetização de presos analfabetos e semi - analfabetos , de política não se fala e foi melhor assim , numa fase em que alguns já caminhavam como bois proibidos de olharem para esquerda ou para direita porque á frente é que interessava porque estava o MPLA que tanto garantia soltura como fuzilamento ou enquadramento nas fileiras dos seus serviços de bufaria nacional.
Fórum Livre Opinião & Justiça
Fernando Vumby
Antônio Gaspar, o governador que no 27 de Maio, não aceitou ser solto sem que soltassem os seus colegas
Posted: 27 May 2018 06:38 AM PDT
Lisboa - As celebrações do 41 aniversario dos massacres do 27 de Maio, protagonizado pelo MPLA, no ano de 1977, em Angola trouxe, ao lume - um caso nunca mencionado pela imprensa – relacionado ao primeiro governador provincial do Kwanza Sul, Antônio da Conceição Gaspar, desaparecido misteriosamente e sem explicação até aos dias de hoje.
Fonte: Club-k.net
Na década de 70, Antônio da Conceição Gaspar fora um escrivão colocado em Cabinda, onde depois passou a colaborar para a fuga de combatentes do MPLA, para as matas do Mayombe e nos Congos. Com Angola, independente, Presidente Agostinho Neto, deu-lhe, a missão de dirigir a província do Kwanza Sul que na altura havia se ter tornado no maior produtor e exportador de Café.
Estaria a caminho de Luanda, quando ele mais dois colegas, os então governadores de Malanje e Benguela, foram emboscados e detidos. De acordo com testemunhos, quando tentaram soltar-lhe insurgiu-se dizendo que só sairia se soltassem os seus companheiros como Zeca Vandunem, Mussolo e Andrade. Dizia-se inocente acrescentando que só sairia com a presença do Presidente Neto. Terá sido pela ultima vez pelo seu amigo de cela Fernando Torres da Conceição “Mussolo” e posteriormente ninguém mais soube dele.
Tão misterioso foi o seu desaparecimento que, aos dias de hoje, fontes na província do Kwanza Sul, atestam que o malogrado Antônio da Conceição Gaspar foi o único governador que não tem o seu retrato na gala de galeria do palácio do governo provincial ilustrando todos os governadores que por ai já passaram.
A nível do regime, Antônio Gaspar é tio da actual Secretaria do Conselho de ministro Ana Maria da Silva e Silva e do ex-ministro do Urbanismo e Habitação, José da Silva “Salú”. A sua primogênita é Marelina da Conceição Gaspar, uma cidadão nascida ao tempo em que esteve em Cabinda. Já em Luanda, teve outras duas filhas, Analise Raimundo Gaspar e Massoxi Raimundo da Conceição Gaspar, esta última, professora de psicologia que tem aparecido em programas de saúde educacional na televisão angolana.
Em solidariedade as vitimas do 27 de Maio, o advogado e sobrevivente Miguel Francisco “Michel”, escreveu uma carta ao Presidente João Lourenço para não cometer o erro do seu antecessor e avançar com a institucionalização de uma comissão para a descoberta da verdade sobre estes casos.
Para este sobrevivente “É que sem que haja um processo que tenha como base a descoberta da verdade, não será possível sarar as feridas que ainda sangram nas mentes dos familiares das vítimas da tragédia, com especial realce para os filhos e as viúvas, pois, muitos nem sequer certidões de óbito lhes foram dadas, até o momento.”
“Daí que sugiro a vossa Excelência, senhor Presidente da República e actual vice presidente do MPLA, que em nome da verdade e da justiça que foi negada às vitimas da tragédia, ao menos tenha a ombridade de ordenar a institucionalização da Comissão que proponho, para que nos possamos verdadeiramente reconciliar.”, le-se na carta.