Cumprimentos ao General Comando Júlio Oliveira e aos elementos da mesa dignos representantes do Programa Fim do Império (Liga dos Combatentes, Comissão Portuguesa de História Militar e o anfitrião – Câmara Municipal de Oeiras) e ao coordenador Cor. José Manuel Montês.
Cumprimento a outras entidades e restante público.
Agradecimentos ao ausente Cor. Manuel Barão da Cunha, pelo trabalho que teve na elaboração dos acertos desta edição, tal como aos Coronéis Montês e José Banazol. Também agradeço aos elementos da editora referenciados no livro e representados pelo seu chefe, o Dr. Batista Lopes, aqui presente.
Sobre esta edição actualizada do livro antes publicada há cerca de 15 anos, na extinta Editora Prefácio, acho que o Sr. General Comando Júlio Oliveira já destacou o essencial.
De qualquer modo gostaria ainda fazer referência a dois ou três tópicos, deixando de lado os dois controversos casos a que dediquei um capítulo cada: a vida e morte de Eduardo Mondlane e o assalto ao navio mercante Angoche e que poderão ser tratados no sempre possível debate.
Em primeiro lugar desejo destacar o referido na introdução acerca do sucedido com os arquivos da PIDE/DGS, quer em Moçambique, quer em Lisboa no pós-25 de Abril. Considero que esta Polícia de Informação e Segurança, no território moçambicano desenvolveu um trabalho bastante eficiente, através das várias redes de informações montadas, incluindo nos países vizinhos e na própria FRELIMO, sendo também notável a instabilidade que provocou na Zâmbia e na Tanzânia, com a sua brigada de operações especiais.
Recordo que, ao longo dos dez anos de guerra, a FRELIMO montou uma razoável máquina de propaganda, que é salientada ao longo deste trabalho. O que afirmavam então até extravasou para o pós-independência, de tal modo que, por exemplo, no caso do dito massacre de Mueda em 1960, ainda há poucos anos, o actual Presidente da República de Moçambique, num discurso comemorativo, em Cabo Delgado afirmava que tinha morrido 600 pessoas numa “banja”, abatidos pela tropa portuguesa. Saliento que esse número concretamente apenas se situa entre as 20 e 30 vítimas, conforme consta nos arquivos oficiais de Maputo, e já referido em várias publicações. Posso acrescentar que de acordo com a versão do actual General Silvestre Martins, que comandou o pelotão interveniente, apenas os dois graduados tinham armas (pistolas metralhadoras) em condições de disparar, além dele próprio, até que a sua arma se encravou. Os cabos e soldados eram portadores de Mauser, sem qualquer munição, já que ao abrirem os cunhetes, verificaram que todas estavam ferrugentas e inutilizadas.
Destruição e extravio dos arquivos da PIDE/DGS
Ainda sobre a PIDE/DGS recordo que os seus arquivos de Moçambique foram mandados destruir pelo então Alto-Comissário Almirante Vítor Crespo, no pós 25 de Abril de 1974, de acordo com as suas declarações, em entrevista que me concedeu em 20-11-2001. Os dados correspondentes a esse período da nossa guerra contra a FRELIMO poderão, no entanto, ser consultados na Torre do Tombo.
Quanto aos arquivos dessa organização, que se encontravam na sede (Rua António Maria Cardoso) lembro que seguiram para Moscovo (474 Kg) numa operação de elementos afetos ao PCP e ao KGB, de acordo com dois livros publicados:
- “Primeiro Directório” de Oleg Kalugin. Lisboa, 1994.
- “O Arquivo Mitrokhine; O KGB na Europa e no Ocidente” de Christopher Andrew e Vassil Mitrokhine; Lisboa, Ed. D. Quixote, 2001.
Terá havido uma outra ocasião em que mais um lote de arquivos da PIDE/DGS, foram igualmente transportados para Moscovo num avião da Aeroflot, em Agosto de 1975, de acordo com o testemunho do então Comandante da PSP de Lisboa, TCoronel José Aparício, (declarações ao vivo e posteriormente publicadas no Expresso por José Pedro Castanheira, há alguns anos).
Ele presenciou o carregamento de duas camionetas de carga da Marinha, com pastas retiradas pelas traseiras da sede da PIDE/DGS, no Largo de S. Carlos, em Lisboa e mandou-as seguir por um seu subordinado. Esse carregamento terá sido igualmente visto pelo jornalista Andrade Guerra, do grupo dos 24 saneados do Diário de Notícias, por José Saramago e os seus “compinchas” e que se reuniam no sindicato dos jornalistas, nas imediações do referido local. E o seu destino terá sido o aeroporto militar de Figo Maduro (ao lado da Portela) onde foram carregadas num avião da Aeroflot.
Um detonador do 25 de Abril
Outro aspecto que refiro nas considerações finais deste livro e que desejava destacar é o relacionamento feito por vários investigadores e analistas, entre a manifestação da Beira, em meados de Janeiro de 1974, com grupos de brancos a apedrejar a Messe de Oficiais da Beira, na sequência dos ataques da FRELIMO ocorridos a sul do Rio Zambeze, com a intenção dos militares de derrubar o regime de Marcello Caetano.
De facto, depois de um período de acalmia na contestação do Movimento dos Capitães, a notícia transmitida para Portugal pelos oficiais da futura “coordenadora” moçambicana, acabaria por ser um factor muito importante e estimulador para que o golpe militar fosse desencadeado em Lisboa.
Foi esta a gota de água que fez transbordar o copo, nas relações entre portugueses sediados e até nascidos em Moçambique, e os militares que, da Metrópole, iam em missão de serviço para o território, desde 1961.
E apesar da derradeira tentativa de resolução negociada do problema do Ultramar, através dos últimos contactos directos de representantes daquele Movimento com Marcello Caetano, em Janeiro/Fevereiro de 1974, a ruptura seria inevitável com a imposta demissão dos generais Costa Gomes e António de Spínola, em 14 de Março seguinte.
Destacando afirmações do prefácio do Gen. Chito Rodrigues
Por último desejava agora ler parte do designado exórdio do Presidente da Liga dos Combates e que convidei para fazer esse texto.
E passo a citar:
(…) A análise da situação política e da guerra e da consequente actuação das forças armadas no ultramar, aparece por vezes feita esquecendo que as forças armadas contiveram e reduziram as acções violentas nos territórios garantindo o normal funcionamento das instituições e proporcionaram o tempo estratégico à decisão política durante catorze anos. Cai-se mesmo no julgamento das acções finais resultantes do próprio 25 de Abril. para se culparem as forças armadas do descalabro e da hecatombe do Império.
A política atribuiu missões as Forças Armadas, mas centralizou e condicionou sempre o seu emprego.(…)
E mais frente dizia:
(…) Quando surge a revolução, em que um movimento das Forças Armadas diz basta e a população portuguesa aplaude dizendo já chega, é tarde para controlar as consequências catastróficas de uma descolonização não planeada que deu origem a um cessar-fogo descontrolado, a um abandono da população branca evitável e a duas guerras civis prolongadas e destruidoras, nos países que acabavam de se tornar independentes.(…)
De facto, como também refiro nas “Considerações Finais” do meu livro, em 1973, Marcello Caetano não apresentou qualquer alternativa à situação de guerra nos três teatros de operações – continuava com a tese “Do Minho a Timor”.
E apenas depois do 16 de Março de 1974, resolveu encetar algumas desgarradas iniciativas para a negociação da paz com os movimentos de libertação, sem qualquer sucesso. Como salientei em trabalho anterior (Marcello e Spínola; a Ruptura; com 3.ª ed. 2012), a última hipótese deste governante enveredar por uma via negociada para o problema do Ultramar foi perdida em 1972, com a sua proposta de manter o almirante Américo Thomaz na Presidência da República e assim não conseguir libertar-se do núcleo duro do regime. E, como é do conhecimento geral, Marcello Caetano teve o desplante de dizer ao então general António de Spínola, que preferia um desastre militar como na Índia em 1961, do que negociar com terroristas. Tal ocorreu em Maio de 1972 após este general se ter sentado à mesa com o Presidente do Senegal, Leopold Senghor, por proposta do director da PIDE/DGS local, Fragoso Allas, e neste país vizinho da Guiné.
Assim, o conflito entre os combatentes militares e o poder político tornou-se insanável, com nefastas consequências para as populações brancas e negras do Ultramar.
E terminei. Muito obrigado pela atenção dispensada.
Manuel Bernardo
15 MAI 2018
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