Por denunciar violações de direitos humanos em Montepuez
A Zam Magazine, uma publicação internacional, acusa a multinacional Gemfields Limited de estar a perseguir e denegrir a imagem dos seus jornalistas que investigaram e tornaram público a violações dos direitos humanos levados a cabo pelo estado moçambicano
Para além dos jornalistas, também um procurador da República, na altura afecto ao distrito de Montepuez foi vítima de calúnia e difamação por parte da Gemfields Limited e a sua sócia Ruby Mining Montepuez.
“Vários meses atrás, a ZAM publicou um relatório com nuances sobre as operações de ruby da multinacional Gemfields em Moçambique. Embora destacando remoções forçadas de aldeões e assassinatos de garimpeiros pela polícia local, o artigo teve o cuidado de fazer justiça a Gemfields. A mineração ética em um país governado por um regime criminalizado e implacável foi certamente um desafio. Para nossa surpresa, em vez de se envolver nos problemas, a Gemfields sempre nos atacou e aos nossos repórteres desde então”, refere uma nota publicada no sítio de internet da Zam Magazine, para depois prosseguir “foram as elites gananciosas de Moçambique que colocaram a polícia nos aldeões para expulsá-los dos campos de rubi; foram as Forças Especiais de Moçambique que atiraram nos garimpeiros. Não a Gemfields”.
A mesma nota refere que, com o artigo a que se refere, foi possível expor a Gemfields Limited e ao estado moçambicano na prática de actos criminais de violação dos direitos humanos. “Aqui estava, finalmente, uma tentativa de entender o problema da Responsabilidade Social Corporativa em um contexto de governação local completamente maligna”, lê-se na mesma nota, cujo conteúdo temos vindo a citar.
Mas, uma investigação sobre a mineração de ruby em Moçambique mostra que é difícil culpar apenas um lado quando os governantes do país “parceiro” abusam dos seus próprios cidadãos. No mesmo sítio lê-se que “em Montepuez, o mais rico depósito de rubys do mundo, um general local deposita seus lucros em uma parceria de mineração de rubi entre o Reino Unido e Moçambique, enquanto mineiros artesanais são fuzilados pelas Forças Especiais locais.
E enquanto a sede da multinacional responde a perguntas e preocupações, o governo moçambicano simplesmente se cala”. A Zam Magazine diz ainda que na tentativa de ouvir a Gemfields, a multinacional colocou um contingente de advogados e seu pessoal de relações públicas contra a publicação.
Mais de 1500 famílias viram-se obrigadas a perder seus hábitos e costumes, práticas culturais e outras formas de estar porque a multinacional implantou um sistema terrível de violação dos direitos humanos na região. “Não sei o que uma multinacional poderosa pode fazer quando confrontada com abusos de direitos humanos no país onde ganham muito dinheiro. Talvez Gemfields poderia tentar descobrir por que os moradores dizem que eles estão sendo baleados. Tal vez eles pudessem ter reuniões urgentes com o governo moçambicano. Talvez pudessem iniciar um processo para se libertarem do seu accionista e representante moçambicano, General Pachinuapa, por todas as contas um grande senhor da guerra local em Montepuez, das suas operações. Talvez eles possam criar uma política de Responsabilidade Social Corporativa que faça uma diferença real”, diz ainda a Zam na sua nota.
A firma de advogados Simmons & Simmons foi contratada pela Gemfields para cuidar do caso e, por várias vezes, solicitaram os jornalistas Estácio Valoi e Gesbeen Mohammad para darem esclarecimentos de forma intimidatória. “Simmons & Simmons, também, convocaram Gesbeen Mohammad e Estácio Valoi (que mora a duas horas de carro dos campos de rubis de Montepuez, onde as forças do estado abusam e roubam mil e quinhentas famílias diariamente), para nunca mais escrever sobre Gemfields. Não satisfeitos em fazer apenas essa demanda bizarra, eles também, ordenaram que os dois “fizessem uma doação para a caridade moçambicana de sua escolha”, aponta a publicação.
Mesmo depois de volvido algum tempo de silêncio, a Gemfields voltou a atcar. “Por um tempo, não ouvimos nada. Gesbeen Mohammad concentrou-se em seu trabalho. Em Agosto, Estácio Valoi voltou aos campos de ruby de Montepuez, para descobrir que "o General" visitou a vila danificada de Naune para fazer um pagamento por uma fazenda comunitária de frango - parte do notável programa de responsabilidade social corporativa da Gemfields - de exactamente 147 mil meticais: US $ 2000. Ele também fez o check-in com as famílias de dois mineiros que haviam sido assa ssinados na concessão da Gemfields, para descobrir se eles tinham ouvido falar da empresa depois que Ian Harebottle, CEO da Gemfields, os visitou em Janeiro e prometeu investigar as mortes de seus filhos. Mas os pais de Artur Pacore e Manuel Artur disseram que não ouviram nada nos oito meses que se passaram desde a visita de Harebottle”, relata a Zam.
“Adivinha quem ouviu falar de Gemfields novamente. Depois que uma publicação foi feita sob licença da ZAM na revista suíça Sept.Info, o departamento de Relações Públicas da Gemfields escreveu a eles sobre Estácio e Gesbeen, chamando-os de coisas mais terríveis e exigindo mais desculpas e doações para instituições de caridade em Moçambique”, diz ainda a Zam na sua nota.
A publicação conclui que “mas o pior foi que, na carta a Sept.Info - que foi copiada para Valoi e Mohammad - eles exigiram da revista que escrevesse que uma das fontes mencionadas em nossos relatórios estava "envolvida no comércio ilegal". Se você insistir em confiar (comentários de X) em seu artigo, nós consideramos que os leitores devem estar cientes das sérias alegações que foram feitas contra ele”. (Aunício da Silva)
Jornal IKWELI – 19.06.2018