Estava eu deslizando o chão escorregadio e de inúmeras ondulações, na famosa zona de Chibuabuare em Pemba, junto dos meus dois primos numa tarde de um Sábado de Agosto de 2018. Os meus manos abduziram-se da minha viagem e fui lá caminhando sozinho, procurando perder o meu tempo vendo aquela área mergulhada no mar do esquecimento. Era uma caminhada aventureira e meio ariscada para mim, passar nos quintais não vedados de donos sem saber se eram ou não caminhos ou simplesmente áreas reservadas para quintais. Para além de ariscada, a minha caminhada era bastantemente triste porque pude observar um modo de vida extremamente precário, devido a forma do solo, os tipos de construções das casas e a forma de alimentação. Fechei os olhos quanto a essa parte, respirei fundo para aliviar a dor que me vinha no coração considerando que era tudo normal. Mas ainda naquela caminhada, deparei-me com alguns meninos a jogar futebol, num campo também com várias lombas e de matope, seco e molhado ao mesmo tempo, um campo que posso acreditar que os meninos tenham feito a limpeza de forma necessária para que pudessem jogar quase que livremente. Aos redores do campo encontravam-se alguns tios que voltavam dos seus postos de trabalho, algumas manas que voltavam do mercado, e inclusive as mamãs carregadas de bebés nas costas, assistindo aqueles maravilhosos meninos, e eu juntei-me àquela gente. Parecia que os meninos estavam a inventar fintas incríveis por mim jamais vistas em algum campeonato internacional de futebol. Portanto, estavam aquelas estrelas a brilhar naquele campo anónimo, um campo não visto nem se quer no ‘’google maps’’, um campo claro na fotografia, mas escuro nos mapas dos campos de futebol.
Até parece que Deus criou aquele espaço para que os meninos de Chibuabuare pudessem jogar, uma área numa parte mais baixa daquela zona. Acredito que numa vista área, é possível identificar mais devidamente o tal ‘’estádio de Chibuabuare’’.
Eu ouvia a eles durante a partida, a chamarem-se por ‘’Cristino Ronaldo’’, ora ‘’Lionel Messi’’, e vários outros nomes de jogadores estrangeiros que se aplicavam, alguns dos quais eu nunca ouvira falar. Eu, dentro do coração, me perguntava: porquê esses meninos não se inspiram nos homens de futebol nacional, tal como: ‘’Dominguez’’, ou um ‘’Tico-Tico’’, etc?!…
Mas talvez seja porque não acompanham o campeonato nacional, o Moçambola ou mesmo os jogos dos Mambas. E também eu perguntava-me: “porque não assistem o campeonato nacional?”. Ficava sem resposta!...
Mas do jeito que os meninos jogavam naquele campo, parecia mais que os jogadores que desfilam nos campos de futebol europeu. Sentia-me estar num lugar escuro e que existia uma esperança de saída para a iluminação.
Eu jogo futebol, mas se tentasse jogar por ali, creio que poderia ter recebido algum ferimento, devido ao estado do chão do próprio campo, mas aqueles meninos jogavam de pés descalços e nem pensavam em algum equipamento para se sentir alegre naquele momento. A outra pergunta que aparecia-me era: “se eles jogam bem num campo ondulado e rugoso, jogarão mal num campo convencional e necessitarão de botas?”.
Prestes a sair daquela bancada de assistência ao jogo, fiz uma análise perante esta situação e tirei uma simples conclusão: na verdade, não é só em Chibuabuare que os meninos brilham escondidos ou que as estrelas brilham no anonimato; não é só em Pemba que os meninos brilham, mas em tantas outras aldeias, em tantas outras povoações dentro do nosso país que podemos encontrar tanto talento para o futebol, não aproveitado.
Se eu tivesse espaço de palavra na Assembleia da República, havia de sugerir um mecanismo legislativo de apoio imediato não só às crianças e adolescentes, mas, a todo jovem do nosso país que demonstra o talento para o futebol e outras actividades que nunca tem grandes oportunidades de sobressair e fazer a sua história no mundo.
(Recebido por email)