Centelha por Viriato Caetano Dias ([email protected])
As relações entre as pessoas devem manter-se até ao limite do possível. Papa Francisco
Durante os anos de vida que levo neste Vale de Lágrimas – e já não são poucos – passei as festas de Natal e Ano Novo em vários países. No entanto, nada se parece a Moçambique pela tradição em desvirtuar aquilo que é natural.
Comecemos pelo dia 24 de Dezembro. Houve uma chuva de críticas contra a ministra Vitória Diogo por não ter concedido tolerância de ponto na antecâmara do Natal. E para quê serviria a tolerância de ponto? Pura e simplesmente para “aquecimento”, uma forma de preparar o combate etílico que normalmente se prolonga noite adentro, num país subdesenvolvido onde o emprego escasseia. É, somos um país pobre que prefere o lazer ao trabalho árduo. Não sou contra os feriados ou tolerâncias de ponto, até porque reconheço que o lazer, o poder conviver, engrandece e faz parte da riqueza do Homem. O problema é a forma como o fazemos.
No próprio dia do Natal, somos os expoentes do incumprimento de regras. Não há limites da liberdade do outro. Natal é um momento de renovação do perdão e de reflexão, mas que no nosso país transforma-se em esbanjamento, bebedeira, gritaria, enfim, numa autêntica zaragata. A juventude, sobretudo, comporta-se como se o mundo estivesse prestes a acabar, e por vezes transforma-se em arruaceiros, na sua sociabilidade.
A vizinhança exibe o som do seu aparelho e o cardápio da música que, mesmo sem aliviar a alma, procura impor o seu status quo perante uma plateia em rebuliço. A poluição sonora é o segundo ingrediente, depois da droga, na vida de um bêbado. Juro, palavra de honra, desde o dia 25 que os meus vizinhos estão em bulha, sem ter em conta a violação os direitos do próximo. “O dinheiro é meu, a vida é minha” é a resposta de alguns quando são convocados a raciocinar!
Até quando o cumprimento integral da postura urbana? Que o diga Bernardino Rafael, o enérgico Comandante-geral da PRM, que até propõe uma esquadra modelo para acomodar os bêbados e os “fora da lei” em dias de festas.
Um pequeno parêntesis. Um professor da minha esposa que agora é membro do Conselho de Ministros dizia que ficava mais fácil “invadir” o país em dias festejos e/ou aos fins-de-semana, porque mais da metade dos moçambicanos estão embalsamados de álcool. Espero que a prática não confirme a hipótese.
Como educar uma sociedade inteira que está em delírio moral? O Sumo Pontífice tem apregoado, nas suas homilias de Natal, a mensagem de que as relações entre as pessoas devem manter-se até ao limite do possível. Debalde! A loucura já anda naquelas cabeças há muitos anos, cuja teimosia não tem descrição nem limite. Teimosia mortal, mania de querer ser aquilo que não são até à ruína, pessoas do mesmo sangue que se destroem por orgulho e sem perdão. Pessoas que se sentem cada vez menos “católicos” progressistas e praticantes e que não perfilham o grande ensinamento de Cristo: OS HOMENS SÃO TODOS IRMÃOS. Zicomo e um abraço nhúngue ao Rufino de Castro, leitor destas minhas centelhas.
NOTA:
Sobre a detenção de Manuel Chang, deputado da Assembleia da República, só tenho a lamentar. A ser verdade o cometimento dos crimes de que é acusado – já que o mundo vive do maniqueísmo e da especulação –, estamos perante uma calamidade institucional. Um deputado vale o que vale em qualquer estrutura do poder. Será que estamos perante falta de referências políticas ou de lideranças exemplares ou capazes de contaminar positivamente as bases. Para o meu amigo Nkulu, é muito cáustico e, simultaneamente, reducionismo falar de referências governamentais porque corruptos e pessoas de condutas censuráveis não se encontram apenas no poder executivo. Seja como for, o meu apelo é que os corruptos moçambicanos continuem a ser presos, condenados e proscritos pela sociedade. Só lamento que as penas não sejam a quintuplicar.
WAMPHULA FAX – 31.12.2018