Centelha por Viriato Caetano Dias ([email protected] )
Eu falaria da falta de referências políticas ou falta de lideranças exemplares ou capazes de contaminar positivamente as bases. É muito cáustico e, simultaneamente, reducionismo falar de referências governamentais, porque corruptos e pessoas de condutas censuráveis não se encontram apenas no poder executivo. Extraído de uma conversa com o amigo Nkulu
A baixa auto-estima dos moçambicanos ou mesmo a sua inexistência tem uma causa: a descrença nos dirigentes. Enquanto não houver clareza sobre o papel dos dirigentes, o povo procura e promove outros “deuses”, estrangeiros, para os admirar. Ou até mortos. Neste caso, os clássicos estavam certos: “os mortos governam os vivos”. Quantas vezes, perante situações de violações dos direitos humanos, a sociedade não evoca o nome de dirigentes finados que actuaram em defesa dos mais pobres? Quantas vezes não ouvimos dizer, com ou sem razão, que no estádio de Samora as coisas eram diferentes! É sempre mais fácil reinventar o passado quando o presente é fraco.
De facto, de algum tempo a esta parte tenho vindo a dizer que apagou-se a chama da Unidade Nacional. Faltam líderes que consigam unir a família moçambicana, que agreguem valores e que despertem o patriotismo adormecido. O mesmo que nos recoloque a sonhar colectivamente, como de resto o fizeram as gerações que nos antecederam, as de 25 de Setembro de 1964 e do 8 de Março, na dura e longa caminhada para a liberdade, defesa e reconstrução nacional. Dizem que os grandes homens despontam nas crises. As crises continuam a fustigar os moçambicanos, mas ainda não surgiu uma figura arrojada capaz de coalescer vontades para o bem de Moçambique.
O país apressou-se em defender a ideia da criação de riqueza, sem fortificar as instituições de justiça. Isto é, sem limpar a alma dos que prevaricam os interesses superiores do Estado moçambicano. O resultado disso é que o povo caminha dividido e sem confiança. Aqui está a grande diferença entre o “ontem” e o “hoje”. Ontem a fome era para todos. Mas com a directiva de que os moçambicanos devem ser ricos, assiste-se, actualmente, uma nova e dura realidade: enquanto uns comem, outros fazem calendário de jejum imposto pelas vicissitudes da vida.
A situação de instabilidade como a de Cabo Delgado, em que parte do nosso corpo (Moçambique) está a ser destruída, levaria a mobilização voluntária de milhões de almas de moçambicanos para a defesa da pátria. Infelizmente, nem uma passeata, nem uma marcha, nem mesmo um grito de solidariedade. Assobiam para o lado e atiram à responsabilidade ao governo da Frelimo. Os terroristas não escolhem governos, partidos políticos, etc., o que eles querem é destruir uma ordem, para implementar outra, com base no terror. Há muitas formas de luta, uma delas e, quiçá a mais eficaz, é a demonstração de repúdio, o que falta a esta sociedade quando o mal está instalado.
Concordo que a auto-estima é o remédio para reacender a chama da Unidade. Mas a questão central é: como resgatar a unidade nacional com a pobreza? E mais: como promover a auto-estima se os preços das passagens aéreas são exorbitantes? Como resgatar a auto-estima se a comida que comemos é produzida no exterior? Como resgatar a auto-estima se os livros com que educamos as nossas crianças e as nossas leis que defendemos o nosso país vêm do estrangeiro? Como resgatar a auto-estima com uma oposição que está em constante oposição? Por exemplo, quando a oposição se opõe ao Orçamento de Estado, mas não ao salário? Quando a oposição abandona a sala das sessões da Assembleia da República, mas não as regalias? Como resgatar a auto-estima como a proliferação de igrejas que empalmam os crentes? Como resgatar a auto-estima com a bagunça da sociedade? Será que a auto-estima é comestível?
Zicomo e um abraço nhúngue ao José Castigo, leitor assíduo destas centelhas.
WAMPHULA FAX – 25.02.2019