Ainda que a imprensa tenha começado a elogiar docilmente a metade cheia de um copo sobre o qual cansou de avisar o quanto estava vazio, a verdade é que estamos longe de colocar a Justiça nos carris só com a prisão de meia-dúzia de Teófilos Nhangumeles e Ndambis Guebuzas.
A prisão desta quadrilha está longe de ser um feito inaudito. E Armando Guebuza por que não está preso?
Talvez esta seja a pergunta que muitos moçambicanos se fazem em surdina. Nós não estamos aqui para julgar quem quer que seja, mas dizer que Armando Guebuza é inocente neste escândalo do calote que colocou o País de rastos é imbecilizar desmesuradamente o povo. Pelo menos é isso que a Procuradoria-Geral da República (PGR) transmite-nos ao deixar o ex-Presidente da República livre.
O Despacho de Acusação da Justiça dos EUA no caso das dívidas ocultas em Moçambique assume que Armando Guebuza recebeu subornos para viabilizar o financiamento da empresa estatal ProIndicus. Esta semana, a PGR disse que o empréstimo à ProIndicus é ilegal e não deve ser pago.
Estamos a falar de 600 milhões de dólares que encheram bolsos de um punhado de gente em nome da ProIndicus. Aqui houve fraude.
E quem melhor do que Armando Guebuza para explicar isto? Qualquer Teófilo Nhangumele a esta altura já estaria preso!
E estes empréstimos, que a PGR diz hoje que são ilegais, foram transformados em dívida soberana pelo Governo actual, com apoio incondicional da bancada parlamentar da Frelimo. E por que a bancada parlamentar da Frelimo apoiou? É simples: Armando Guebuza não é um acidente dentro da trajectória frelimista; ele é a essência.
Ou seja, Guebuza não é o primeiro a empanturrar-se com dinheiros públicos. Esta é a característica do partido que governa Moçambique desde 1975. Ou seja, presos aos privilégios, os governantes da Frelimo sempre julgaram correcta a simbiose entre seus bolsos e os cofres públicos.
E o pior desta abominação toda é o facto de que aqueles que se apresentaram com credenciais para arrumar a casa são os primeiros que se esforçam para tirar as coisas do lugar! A Frelimo é que abriu a temível porta da desinstitucionalização. Agora como fechá-la? Este é que é o dilema! Dilema porque os que tanto empunharam a bandeira da chamada luta contra a corrupção são os primeiros cuja denúncia, hoje, lhes bate as portas.
Por isso que nem todos os processos correm; nem todos os réus vão presos. O paradoxo se instaura: ou a lei não é para todos ou é para todos e não sobra ninguém.
Juntou-se tudo para justificar a inusitada aliança que reuniu os maiores rapinadores deste País. Até existe uma imprensa camarada que apoia as acções do partido do poder com argumentações de baixa densidade, mas suficientes para insuflar algum oxigénio aos que empurram o País dos moçambicanos à pobreza.
Portanto, diríamos que as acções de Armando Guebuza, enquanto Chefe de Estado, não foram um factor desviante, e sim comportamento padrão no partido do poder.
E é irrelevante questionar como é que esses governantes se justificam diante do espelho? Que ginástica mental eles realizam para encostar a cabeça no travesseiro e pegar no sono? Como conseguem paz de espírito para usufruir da mansão no Dubai adquirida com o dinheiro roubado do hospital, do Mercedes de luxo que afanou da construção de uma escola pública?
Enfim, a corrupção em Moçambique não é um problema que se esclareça ou se corrija apenas com leis, com iniciativas mais ou menos intermitentes da Justiça ou com grandes campanhas de denúncia na imprensa.
Com ela acontece, geneticamente, como com o instinto democrático, o respeito às leis ou à vida: há coisas que não são aprendidas porque a lei obrigue, mas porque são mamadas desde o berço.
Pois bem, o político frelimista não mamou o desprezo à corrupção! (Laurindos Macuácua)
DN – 06.03.2019
NOTA: No inquérito que o MPT está a fazer são cerca de 97% que respondem que Armando Guebuza já deveria estar incriminado e detido. Esta é a percepção do povo.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE