Lawe Laweki
O Padre Michael Lapsley foi recebido em audiência pelo Papa Francisco em Roma no dia 15 de junho de 2019. Na ocasião, o sacerdote entregou ao Santo Padre um livro sobre a vida e a obra do Padre Mateus Pinho Gwenjere escrito por Lawe Laweki. O Padre Lapsley também entregou ao Papa Francisco duas mensagens do autor, que apelam ao Santo Padre para encorajar o governo da FRELIMO, durante a sua visita a Moçambique, a seguir o caminho de sarar as feridas e de enveredar por uma reconciliação genuína. Por seu turno, Lawe Laweki entregou a ediçao portuguesa do mesmo livro ao Presidente da República de Moçambique, Sua Excelência Filipe Jacinto Nyusi, incluíndo uma carta que igualmente apela para o sarar de feridas no seio da família Moçambicana.
O encontro entre os dois homens de Deus foi descrito num comunicado de imprensa como "uma experiência bastante comovente". Foi visto como um re-encontro entre dois irmãos que não se viam há muito tempo. Depois de um grande abraço, eles, em pouco tempo, se deram bem: “O mesmo sentido de humor, a mesma linguagem, a mesma capacidade auditiva, e as mesmas prioridades ”.
Padre Michael Lapsley em Viena, na Áustria, em 2015 - assinando o seu livro “Redeeming the Past” ("Resgatando o Passado"). Fonte: Dr. Josef Pampalk
No livro “Mateus Pinho Gwenjere: Um Padre Revolucionário”, o Dr. Josef Pampalk, que foi missionário da África no centro de Moçambique durante muitos anos, explica no seu Prefácio quem é o Padre Michael Lapsley. É um sacerdote anglicano nascido na Nova Zelândia, que chegou à África do Sul em 1973, no auge da repressão do apartheid. Pelas injustiças que encontrou no país, ele posicionou-se em defesa de alunos que eram detidos, torturados e assassinados pelo regime do apartheid. Por esta ousadia, ele foi expulso da África do Sul pelo regime do apartheid em 1976, tendo ido morar no Lesoto.
No Lesoto, tornou-se membro do Congresso Nacional Africano (ANC) assim como seu capelão no exílio nos 16 anos que se seguiram. Durante este período, viajou por todo o mundo, mobilizando comunidades da fé para apoiarem a luta de libertação e oporem-se ao regime do apartheid, que abusava da fé cristã para justificar a opressão interna. Em 1982, após uma incursão policial na capital do Lesoto, Maseru, na qual muitas pessoas foram mortas, o Padre Lapsley mudou-se para o Zimbabué onde, em 1990, três meses após a libertação de Nelson Mandela da prisão, o Departamento de Cooperação Civil, uma unidade secreta das forças de segurança do apartheid, lhe enviou uma carta-bomba escondida dentro de duas revistas religiosas. Ele ficou gravemente ferido na explosão, perdendo as duas mãos e a visão do seu olho esquerdo.
O Padre Lapsley lutou para voltar à vida normal e, depois de um longo tratamento médico; foi para a Cidade do Cabo onde trabalhou em apoio à Comissão da Verdade e Reconciliação (TRC) da África do Sul. O seu trabalho levou ao estabelecimento do Instituto de Cura de Memórias (Institute for Healing of Memories – IHOM) em 1998. O IHOM permitiu que muitos sul-africanos contassem as suas histórias e traumas. Este Instituto tem realizado workshops em todo o mundo nas regiões afectadas por conflitos não resolvidos.
Como as cicatrizes do passado continuam a moldar as atitudes das pessoas, o trabalho do Padre Michael Lapsley continua a ser importante, não apenas na África do Sul, mas também em muitos outros países em conflito, incluindo Moçambique, como será demonstrado no seu testemunho que segue este artigo.
Tendo partilhado esta parte da sua história, em que uma carta bomba lhe explodiu as duas mãos, o Papa Francisco ficou visivelmente comovido.
A popularidade do Papa Francisco. Fonte da fotografia: Günther Simmermacher, Editor da revista Católica Sul-africana “Southern Cross”
Na ocasião, o Padre Michael Lapsley louvou o papel desempenhado pelo Santo Padre na edificação de uma Igreja Profética de Cristo “principalmente pela forma como o Santo Padre tem reconhecido a dor da família humana, insistindo sempre na misericórdia, compaixão, e solidariedade, particularmente para com as pessoas mais desfavorecidas”.
O Padre Lapsley referiu-se depois ao encontro que o papa Francisco teve no dia anterior com os representantes da indústria petrolífera e ao facto de os ter repreendido pela sua continua exploração dos recursos fósseis, tendo em conta o seu impacto prejudicial. Com um largo sorriso, o Papa Francisco disse que lhes deu um puxão de orelhas.
De igual forma, o Padre Lapsley exprimiu o seu profundo apreço pela oposição do Papa Francisco à pena de morte, conforme presentemente consta no Catecismo da Igreja Católica. Esta posição é fruto de anos de campanha de organizações como a Amnistia Internacional e a ACAT (Ação dos Cristãos pela Abolição da Tortura).
A conversa envolveu igualmente momentos de humor, com o Papa Francisco e o Padre Lapsley partilhando o seu elevado sentido de humor. O Santo Padre disse que o sentido de humor é provavelmente a coisa mais próxima da graça Divina, tendo revelado que ele ora diariamente a oração de bom humor do Santo Thomas More.
O Padre Lapsley disse ao Papa Francisco que, se tivesse sido possível, teria levado com ele, ao Santo Padre, milhares de pessoas, incluíndo muitos de seus amigos do Facebook. Disse que essas pessoas estavam a seguir o encontro e queriam saudar o Santo Padre. O Papa Francisco respondeu com um grande sorriso, acenando com os braços e dizendo que estava a saudá-los de volta.
O Padre Lapsley entregou ao Santo Padre dois exemplares do seu livro, "Resgatando o Passado", um em inglês e outro em espanhol. Até a presente data, o seu livro foi traduzido em 14 línguas, incluíndo alemão, espanhol, francês, árabe e tailandês, demonstrando assim que a sua história e o trabalho da sua fundação, IHOM, têm uma ressonância universal.
A audiência do Padre Michael Lapsley com o Santo Padre foi facilitada por George H. Johannes, embaixador sul-africano junto à Santa Sé, que compartilha com o Padre Lapsley um passado comum na luta contra o apartheid. O Papa Francisco é o primeiro papa latino-americano e o primeiro papa jesuíta desde 1541.
O texto integral do comunicado de imprensa pode ser obtido no seguinte site:
https://www.scross.co.za/2019/07/what-sa-cleric-told-the-pope/