O Supremo Tribunal Militar de Angola condenou hoje a três anos de prisão efectiva o ex-chefe do Serviço de Inteligência e Segurança Militar (SISM), António José Maria “Zé Maria”. O general foi condenado por crimes de extravio de documentos militares de carácter confidencial, tendo sido absolvido do crime de insubordinação por, na altura dos factos, já estar reformado. A defesa do réu, inconformada com a decisão proferida, interpôs recurso, com efeito suspensivo.
O general António José Maria, também conhecido por “Zé Maria”, de 73 anos, respondeu ao julgamento em prisão domiciliária, desde Junho deste ano, estava acusado dos crimes de insubordinação e extravio de documentos relacionados com a Batalha do Cuito Cuanavale.
O Ministério Público pediu a condenação do arguido, dando como provados todos os crimes de que era acusado, nomeadamente, o de desobediência às ordens do Presidente da República, João Lourenço, optando por “manter a fidelidade canina” ao ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos.
O julgamento teve início a 11 de Setembro deste ano e o caso remonta a 2018, altura em que o arguido foi exonerado do cargo e, supostamente, terá subtraído das instalações do SISM documentos secretos referentes à Batalha do Cuito Cuanavale, enquanto aguardava pelo processo da sua passagem à reforma, entretanto recuperados pela Procuradoria-geral da República após diligências judiciais.
Ao trazer a questão da batalha do Cuito Cuanavale para o epicentro do seu julgamento, o general Zé Maria ressuscitou velhos fantasmas que, para além de porem os dirigentes do MPLA em pânico, já demonstraram que a História desta batalha não é a que oficialmente nos é contada pela cartilha oficial.
O Governo do MPLA que está no poder desde 1975 continua a fazer de todos nós uns matumbos e, por isso, teima em mandar enxurradas de mentiras contra a nossa chipala. Em Maio de 2017 até arranjou 12,3 milhões de euros para pagar a conclusão do memorial sobre a histórica batalha do Cuito Cuanavale e que, de acordo com informação do MPLA, constitui uma homenagem à “bravura” dos heróis (cubanos e das FAPLA) de 1988.
A documentação que estava em posse do general Zé Maria (mas da qual existem cópias dentro e fora de Angola) é apenas uma parte do acervo da verdade ocultada, sendo que outra tem a ver com os documentos recolhidos no “bunker” de Jonas Savimbi, no Bailundo, e nos quais se comprova as ligações, entre outras, de altas patentes das FAPLA/MPLA ao fundador da UNITA.
A batalha do Cuito Cuanavale, no conflito civil angolano, foi considerado o maior combate militar em África após a segunda guerra mundial e que então envolveu sobretudo forças do MPLA, cubanos e russos, da UNITA e da África do Sul. A região insere-se no chamado “Triângulo do Tumpo”, considerado o ponto principal dos combates do Cuito Cuanavale, ocorridos a 23 de Março de 1988.
Além da evolução da situação política e militar em Angola, a batalha do Cuito Cuanavale foi considerada como decisiva na independência da vizinha Namíbia, concluída em 1990, então ocupada pela África do Sul e após ter sido colónia da Alemanha.
O Governo/MPLA, que se declarou vencedor desta batalha, propôs em 2016, numa reunião do Conselho de Ministros da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), a instituição de 23 de Março como Dia da Libertação da África Austral.
A rapaziada dirigente do MPLA continua a não tomar a medicação correcta para a sua crónica megalomania fantasista. E agora temeu (ou será que tem a certeza?) que a documentação que o general Zé Maria (e não só ele, repita-se) tem, possa revelar toda a verdade que eles conhecem mas que sempre negaram. Indiferentes aos 20 milhões de pobres, têm sempre pronta a fanfarra, os palhaços e os restantes bobos da corte para enaltecer o que chamam de “Memorial sobre a Vitória da Batalha do Cuito Cuanavale, província do Cuando Cubango”, em homenagem – dizem – à bravura dos seus heróis de 1988.
Este Memorial, tal como foi concebido e idolatrado pelos mercenários do MPLA, mais não é do que uma (mais uma) enorme mentira do regime de José Eduardo dos Santos (subscrita por João Lourenço) e restantes malandros que, assim, continuam a tentar reescrever a história.
Segundo o insuspeito órgão oficial de propaganda do regime, o Jornal de Angola (a versão mais Pravda do que o Pravda), “um imponente edifício de aproximadamente 35 metros de altura, sob a forma de pirâmide, erguido de raiz logo à entrada da sede municipal do Cuito Cuanavale, com a denominação de “Monumento Histórico”, é sem margem de dúvidas a maior dádiva do Governo angolano para honrar a memória de todos aqueles que lutaram para defender aquela localidade da ocupação sul-africana”.
Não se sabe, embora eles saibam, onde é que o regime do MPLA (por sinal no poder desde 1975) quis e quer chegar ao construir monumentos que enaltecem o contributo dos angolanos que consideram de primeira (todos os que são do MPLA) e, é claro, amesquinham todos os outros. Mas agora que as comadres (do MPLA) se zangaram – ou parece que se zangaram – talvez venhamos a saber que a mentira está no ADN do MPLA.
Talvez fosse oportuno, e aí sim verdadeiro, construir um monumento aos milhares e milhares de vítimas do massacre que o MPLA levou a cabo no dia 27 de Maio de 1977, com o inigualável contributo e comando do genocida Agostinho Neto. Ou fazer uma adenda à versão que o MPLA escreve sobre a batalha do Cuito Cuanavale, dizendo que Agostinho Neto comandou as FAPLA nessa batalha ou, ainda, dizendo que ou os angolanos aceitam a verdade do MPLA ou os massacres do 27 de Maio podem repetir-se.
Importa, contudo, desmistificar as teses oficiais que não têm suporte histórico, militar, social ou qualquer outro, por muito letrados que sejam os mercenários contratados para vender lussengue por jacaré. Apenas têm um objectivo: idolatrar uma mentira na esperança de que ela, um dia, seja vista como verdade.
De acordo com o pasquim oficial do MPLA, “logo à entrada do pátio do monumento histórico, o visitante tem como cartão de visita uma gigantesca estátua de dois soldados, sendo um combatente das ex-FAPLA e outro cubano, com os punhos erguidos em sinal de vitória no fim dos combates da já conhecida, nos quatro cantos do mundo, “Batalha do Cuito Cuanavale”, que se desenrolou no dia 23 de Março de 1988”.
Não está mal. A (re)conciliação nacional não se solidifica glorificando apenas e só os angolanos de primeira (MPLA/FAPLA) e os seus amigos, os cubanos. Mas, também é verdade, que o regime angolano está-se nas tintas para os angolanos de segunda (afectos à UNITA ou simplesmente distantes do MPLA). Até um dia, como é óbvio.
Dizia o Pravda que a batalha do Cuito Cuanavale terminou “com uma retumbante vitória das FAPLA e das FARC (Forças Armadas Revolucionárias de Cuba)”.
Importa por isso, ontem como hoje e amanhã, perceber o que leva o MPLA a comemorar esta batalha como uma grande vitória das suas força, temendo (e têm razão para isso) agora que a documentação recolhida pelo general Zé Maria prove o contrário.
Visivelmente, o regime continua a ter medo da verdade e aposta na criação de focos de tensão na sociedade angolana, eventualmente com o objectivo de levar acabo uma das suas especialidades: massacres gerais (tipo 27 de Maio de 1977) ou selectivos como em Junho de 1994, quando a aviação do regime destruiu a Escola de Waku Kungo (Província do Kwanza Sul), tendo morto mais de 150 crianças e professores, ou quando entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994, bombardeou indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Kaluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.
Sabendo que a UNITA considera ter vencido essa batalha, comemorá-la como se fosse uma vitória das forças do MPLA, russas e cubanas visa provocar a UNITA, para além de ser um atentado contra a verdade dos factos.
Além disso, começa a ser hábito do MPLA, tentar adaptar a História às suas necessidades. Se alterar a História resultou parcialmente no passado, com a globalização e os trabalhos científicos que vão surgindo, não funciona. O regime ainda não aprendeu. Continua a seguir a máxima nazi de que se insistir mil vezes numa mentira ela pode ser vista como uma verdade. Mas não funciona.
A batalha do Cuito Cuanavale começou em Setembro de 1987, com uma ofensiva das forças coligadas FAPLA/russos/cubanos tentando chegar à Jamba. Um exército poderosamente armado, com centenas de blindados e tanques pesados, artilharia auto-transportada e outra, apoiado por helicópteros e aviões avançaram a partir de Menongue.
Depois da batalha, o General França Ndalu, veio dizer a um jornalista que o objectivo não era esse, mas sim o de cortar o apoio logístico à UNITA. O que é visivelmente uma fraca, fraquinha, desculpa, porque o apoio logístico era feito de sul e do leste para a Jamba e nunca entre o Cuito Canavale e o rio Lomba.
Pela frente a coligação comunista encontrou a artilharia e a infantaria da UNITA (FALA), organizada em batalhões regulares e de guerrilha, apoiados por artilharia pesada das forças sul-africanas. Com o avolumar da ofensiva, a África do Sul colocou na batalha mais infantaria, blindados e helicópteros.
A batalha durou mais ou menos seis meses. As forças FAPLA/russos/cubanos, com dezenas de milhares de homens na ofensiva, não conseguiram passar do Cuito Cuanavale. A batalha acabou em Março de 1988 com a retirada das forças FAPLA/russos/cubanos para Menongue.
As consequências foram diversas. O exército cubano aceitou retirar-se de Angola. A África do Sul aceitou que a Namíbia ascendesse à independência, desde que os seus interesses económicos não fossem tocados, que a Namíbia continuasse dentro da união aduaneira que tem com a RAS e que o porto de Walbis Bay (o único da Namíbia) continuasse a ser administrado pela RAS.
O MPLA aceitou finalmente entrar em negociações com a UNITA (o que viria a acontecer em Portugal), aceitou o pluripartidarismo, aceitou eleições.
E a UNITA, o que teve de ceder? Nada. Os seus bastiões continuaram intocados, nenhuma linha logística foi tocada, o seu exército não teve perdas, em homens e material, significativas.
Mais ou menos um ano mais tarde, e já na mesa das negociações, o MPLA tentou uma segunda ofensiva, de novo com milhares de homens, tanques, veículos, helicópteros e aviões. Foi a chamada operação “Último Assalto”, e mais uma vez foi derrotado, desta vez sem os sul-africanos estarem presentes.
Em resumo, se houve vencedores, não foram as forças do MPLA e os seus aliados. Então o que comemora o MPLA? Nada a não ser o que a sua propaganda inventa.
FOLHA8 – 22.11.2019