Ataques de defensores do Presidente Nyusi e FRELIMO nas redes sociais sobem de tom. E sobem também de patamar: acontecem agora sob as luzes da ribalta da comunicação social pública, paga pelo contribuinte. Quem os pára?
Não é apenas no norte e centro de Moçambique que se assiste a confrontos: o sul é também cenário de uma batalha campal. Mas, aqui, os confrontos são de posições e com direito a ataques verbais e insultos.
A cidade de Maputo é o epicentro que opõe intelectuais tidos como pró-Filipe Nyusi e FRELIMO, o partido no poder, a ONGs da sociedade civil mais destacadas. Estas têm-se notabilizado por fazer o contraponto ao Governo de forma consistente.
Já os intelectuais pró-Nyusi são vistos como a mão suja do partido no poder, como reação à acutilância da sociedade civil. Há o entendimento de que o seu objetivo é descredibilizar a sociedade civil. Os ataques que começaram nas redes sociais, entretanto, tem direito agora a um palco de luxo: a comunicação social pública, paga pelo contribuinte.
Manipulação da opinião pública
Ernesto Nhanale, especialista em comunicação social e diretor do MISA-Moçambique, menciona "o facto daqueles que têm poder usarem os meios de comunicação social públicos para escamotear a verdade".
"Uma coisa é o debate nas redes sociais, em que cada um usa a sua página para expressar de forma autoritária o seu pensamento, mas, quando chegamos ao nível de privatizar os meios de comunicação públicos para manipular a opinião pública de forma deliberada isto não é bom", sublinha.
As redes sociais são os ringues onde se assiste a combates entre pugilistas de categorias diferentes. Por exemplo, enquanto a sociedade civil se foca no seu trabalho, apresentando evidências e seguindo à letra o adágio popular que diz "os cães ladram e a caravana passa", os intelectuais pró-FRELIMO esperneiam e apostam, muitas vezes, nos insultos e acusações nunca provadas, como por exemplo de serem a "mão externa" ou de obedecerem a agendas ocultas.
Redes sociais e comunicação social: um casamento possível
Casos houve até em que queixas foram submetidas à Procuradoria Geral da República (PGR) contra alguns dos tais intelectuais. Mas a subida do debate à esfera da comunicação social é uma tendência que se firma, contudo, obedecendo a regras, explica o docente de comunicação social especializado em redes sociais, Celestino Joanguete.
"Alguns meios de comunicação social socorrem-se de algumas fontes das redes sociais, fontes fidedignas, claro. E isso acaba por ser repercutido. Há relação direta entre os debates das redes sociais para os meios de comunicação clássicos. Há até fontes [jornalísticas] que acabam citando os debates das redes sociais", esclarece o entendido em redes sociais.
Muito abaixo do G40
Durante o último mandato de Armando Guebuza, o apelidado G40 ficou célebre. O grupo de intelectuais, defensor ferrenho do ex-Presidente, tinha os microfones dos órgãos públicos, pagos pelo contribuinte, ao dispor, e foi duramente contestado tanto pela sociedade como por jornalistas.
Contudo, tinham um ponto forte: a sua "propaganda" estava assente em argumentos. Já os atuais intelectuais pró-Nyusi em nada podem ser equiparados ao G40. Alguns deles foram até nomeados para altos cargos públicos, o que é entendido como uma espécie de premiação pelos "bons serviços".
A desonestidade intelectual
Sobre este novo grupo, Ernesto Nhanale entende que "o importante é pensar na qualidade das pessoas e estratégias que estão a aplicar. Pessoas que são montadas pelas equipas de partidos políticos de governos e governantes para pressionarem os meios de comunicação social para uma cobertura favorável sobre o que eles fazem para tirarem ganhos na opinião pública, [e isso] nós sempre teremos."
Nhanale fala mesmo em desonestidade intelectual: "Coloca-se nesse tipo de funções pessoas que não têm nenhum nível de responsabilidade suficiente para compreender que é preciso ir a um debate em respeito às posições diferenciadas. As pessoas não têm vergonha de defender uma posição com a qual elas próprias não concordam".
Órgão regulador teria algum papel?
E teria o Conselho Superior de Comunicação social, o órgão regulador, o papel de restabelecer o equilíbrio nesta guerra? O diretor do MISA-Moçambique tem dúvidas.
"Neste caso, não consigo visualizar o papel do Conselho Superior de Comunicação Social, porque estaríamos perante formas de censura não objetiva, dificil de capturar. Seria uma violação às liberdades, dificilmente poderíamos encontrar um papel efetivo do CSCS neste tipo de casos", conclui.
DW – 15.12.2019