Dezenas de pessoas amotinaram-se no bairro Paquitequete, na província de Cabo Delgado, contra alegadas violações por parte das Forças de Defesa e Segurança (FDS), disseram hoje à Lusa várias fontes.
O tumulto começou por volta das 20:30 de terça-feira, quando as Forças de Defesa e Segurança realizavam uma operação no bairro Paquitequete, em Pemba, capital provincial de Cabo Delgado.
"Eles encontraram-nos sentados em frente de casa, quando eles chegaram entrámos nas nossas residências. Eles arrombaram a porta da minha casa e obrigaram-me a sair. Recusei-me e eles puxaram-me e a população começou a gritar e a atirar pedras contra eles", explicou à Lusa um jovem que foi levado para a esquadra por algumas horas após os tumultos.
Os manifestantes montaram barricadas nas estradas, queimaram pneus e atiram objetos contra as forças poiíciais, incluindo ‘cocktails molotov’, e as autoridades responderam com balas reais para o ar e gás lacrimogéneo para dispersar a população.
O tumulto durou cerca de uma hora e meia, tendo a polícia efetuado perseguições contra os líderes do motim, segundo as fontes.
"Os militares são para defender a população e não para matar", declarou à Lusa o líder de um dos quarteirões do bairro e que também esteve no tumulto.
Foi no bairro de Paquitequete que na semana passada a PRM espancou um cidadão e reteve um jornalista durante horas, na sequência de uma outra operação.
A violência contra o cidadão, na presença do jornalista retido, foi filmada por populares e gerou uma onda de críticas de Organizações Não-Governamentais e de outras pessoas, principalmente nas redes sociais.
O bairro Paquitequete, situado na zona costeira de Pemba, alberga muitos deslocados das zonas afetadas pela violência armada, além de ser a residência de vários pescadores que frequentam a costa dos distritos onde se têm registado ataques armados no norte de Cabo Delgado.
A Lusa tentou obter um esclarecimento por parte das autoridades em Cabo Delgado, mas ainda sem sucesso.
Cabo Delgado, região onde avançam megaprojetos de extração de gás natural, tem vindo a ser confrontada com ataques de grupos armados classificados como uma ameaça terrorista.
As incursões já mataram, pelo menos, 400 pessoas desde outubro de 2017.
O Governo contabilizou 162 mil afetados pela violência armada naquela província, 40 mil dos quais deslocados das zonas consideradas de risco, maioritariamente situadas mais para o norte da província, e que estão a receber assistência humanitária na cidade de Pemba, a capital provincial.
No final de março, as vilas de Mocímboa e Quissanga foram invadidas por um grupo, que destruiu várias infraestruturas e içou a sua bandeira num quartel das Forças de Defesa e Segurança.
Na ocasião, num vídeo distribuído na Internet, um alegado militante 'jihadista' justificou os ataques de grupos armados no norte do país com o objetivo de impor uma lei islâmica na região.
Foi a primeira mensagem divulgada por autores dos ataques que ocorrem há dois anos e meio na província de Cabo Delgado, gravada numa das povoações que invadiram.
LUSA – 22.04.2020