O Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO) moçambicano defendeu hoje que as estratégias do Fundo Monetário Internacional (FMI) para garantir transparência na gestão de fundos disponibilizados aos países africanos são insuficientes, reiterando a necessidade de uma fiscalização externa.
Numa nota distribuída hoje à comunicação social, o FMO, uma plataforma que congrega várias organizações da sociedade civil moçambicana, considera que o FMI apoia programas para "governação económica" em África há quase 40 anos, mas continuam a ser registados sucessivos escândalos de corrupção e outros crimes financeiros, o que mantém o continente no estágio de subdesenvolvimento.
"Algumas ações e decisões do FMI vão na contramão da sua intenção de promoção de boas práticas de governação económica, como aconteceu quando fez vista grossa a atos flagrantes de má governação macroeconómica aquando da polémica sobre a reavaliação da sustentabilidade da dívida pública moçambicana", lê-se na nota da instituição.
Segundo o FMO, para o caso de Moçambique, não há elementos que garantam que o executivo moçambicano vai gerir de forma transparente o apoio de 309 milhões de dólares disponibilizado pelo FMI face ao défice orçamental provocado pela pandemia da COVID-19, considerando fundamental o envolvimento da sociedade civil na fiscalização.
A plataforma reuniu-se em maio com o FMI para debater mecanismos de prestação de contas do Governo moçambicano na gestão do empréstimo, na sequência de uma carta enviada pela sociedade civil ao organismo internacional, alertando para a necessidade de reforço da transparência na gestão do empréstimo.
Durante o encontro, o FMI esclareceu que o acordo com o Governo moçambicano para o empréstimo inclui a publicação dos grandes contratos públicos, a realização e publicação de auditorias sobre as despesas efetuadas, avançando que o resto do processo fica na responsabilidade do executivo.
Para o FMO, as exigências do FMI não são suficientes, na medida em que a participação da sociedade civil podia "limitar o espaço de ação dos gestores públicos com intenções de desviar fundos do tesouro público para fins alheios à agenda de resgate das economias afetadas pela crise da pandemia".
O empréstimo do FMI representa cerca de metade do apoio financeiro de 700 milhões de dólares que Moçambique espera receber de parceiros no âmbito do combate à pandemia provocada pelo novo coronavírus.
O apoio foi pedido pelo Governo aos parceiros, em Maputo, em 23 de março, para cobrir o buraco fiscal provocado pela pandemia no Orçamento do Estado (OE) de 2020, bem como para financiar o combate à doença e dar apoios para os mais pobres.
O apoio do FMI será feito através da linha de crédito rápido (RCF) e 28 milhões de dólares numa linha para alívio e contenção de catástrofes.
Na altura do anúncio, o FMI esclareceu que "os recursos da RCF serão devidos só depois de a produção, exportação e receitas fiscais do gás natural liquefeito arrancarem", o que se prevê para 2022/2023.
O FMI leva em linha de conta as promessas do Governo de publicar auditorias sobre a utilização das verbas e confia nos progressos do Banco de Moçambique em melhorar as capacidades de gestão e auditoria, de acordo com recomendações feitas por uma missão em dezembro de 2019.
Os compromissos contrastam com o passado recente de Moçambique, ensombrado pelas chamadas “dívidas ocultas” do Estado de cerca de dois mil milhões de euros, que levaram o FMI e doadores a cortar a modalidade de apoio direto ao OE em 2016.
Este é o segundo ano consecutivo em que Moçambique recebe apoio da RCF: em 2019, o fundo emprestou ao país 118 milhões de dólares após os ciclones Idai e Kenneth para apoiar o OE nos esforços humanitários e de reconstrução.
Com um total de 733 infeções já registadas e cinco mortos, Moçambique vive em estado de emergência desde 01 de abril, prorrogado por duas vezes até 29 de junho.
Em África, há 8.115 mortos confirmados em mais de 306 mil infetados em 54 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.
A pandemia de COVID-19 já provocou mais de 468 mil mortos e infetou mais de 8,9 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
LUSA – 22.06.2020