Por ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
E por conta disso, vai surgir um terceiro pacote nesse guarda-chuva da ética, que nós na filosofia chamamos de «ética de princípios», e o grande nome é um filósofo alemão chamado Immanuel Kant. E qual é a ideia central do pensamento do Kant? A ideia central do pensamento do Kant é essa: «é um absurdo julgar a conduta pelos seus efeitos.» Você vê, muito antes de propor a primeira coisa, que o Kant fez foi destruir. «O consequencialismo moral é uma idiotice». Então, se o valor da conduta não está na consequência está aonde? Na conduta, ou seja, a conduta vale pela conduta.
Então, naturalmente, você terá referências de boa conduta, no caso da aula para quem é professor [eu], existe uma disciplina, que define os princípios da boa aula, que se chama «didáctica». Então, na «didáctica» não têm consequências têm princípios. Não grite, não fale obscenidade, não gesticule muito, não se mexa muito. Esses, são os princípios duma boa aula. Mas, você vai dizer bom…, nossos problemas acabaram, vamos agir de acordo com nossos princípios. Veja! Essa teoria só funciona bem quando são esses princípios tipo muçulmanos ou cristãos. Porquê! Porque se não tiver um deus chancelando aqueles princípios e excluindo os outros a pergunta é. Porquê aqueles e não os outros?
Por exemplo, confiança é um princípio de convivência. O que é confiança? Confiança é certeza sem poder verificar. Certeza sobre coisas, que não podemos verificar nem demonstrar.
Por exemplo, confiança é um princípio de convivência. O que é a confiança? É certeza sem poder verificar. Sem confiança não tem projecto, não tem panejamento, não tem nada. Só que, infelizmente agente desconfia tanto quanto confia. Porquê o alarme! Porquê gradear nossas casas! Então, você pergunta se confiança é princípio e desconfia princípio com qual eu fico?
Então, é claro, que o Kant tem uma saída para essa dúvida. Quando você tem um princípio e o outro, o principio que deve prevalecer, que o princípio que é universalizável, àquele que todos podem bem seguir e é isso, que se chama «imperativo categórico»: «faça de tal maneira que todo o mundo possa fazer igual. Faça de tal maneira, que todo o mundo possa respeitar a mesma máxima ou o mesmo princípio, que preside a tua acção».
Nesse caso, entre a consciência e desconfiança eu fazendo um exercício kantiano, acho que a confiança é muito mais universalizável, que a desconfiança. Porque, a confiança vem primeiro. Se encontro você e você me diz, que se chama Pedro, que tem [18] anos, e que estuda na [UP] eu não tenho porque pensar tudo isso é mentira, na verdade você se chama Arlindo, e que é um mecânico e nunca passou pela [UP]. Por princípio, você tem confiança e a desconfiança vem depois. A confiança parece muito mais universalizável do que a desconfiança. Então, você diz, aqui resolvemos o problema da ética é o que diz o Kant no final do «Crítica da Razoa Prática». E aqui está resolvido o problema da moral. Ele tinha cacife para isso? Ele tinha, mas ele não resolveu o problema da moral, por muitos motivos e vamos dar um exemplo muito popular. Não mentir. Lógico a verdade é universalizável e a mentira não é universalizável.
Só que, se alguém [assassino] vem perseguindo injustamente o teu filho na tua casa, você não vai dizer, que o teu filho está escondido ali. Então, você percebe, que mentir é preciso e é exactamente isso, que Edgar Moran vai chamar de «complexidade dos valores». Ou seja, cada valor tem o seu contrário como valor também. E não como ter uma perspectiva de universalidade, que faça com que alguns valores sejam uma tabela que todo o mundo tenham que respeitar. E é por isso, que vai surgir um quarto pacote no século [XX] e é esse pacote que eu quero destacar aqui para você [s].
E esse pacote vai atender pelo nome de «ética da discussão» ou «ética da argumentação» e que tem como maior nome um fulano chamado Habermas.
Então, qual é a ideia. Se os valores são complexos, se os princípios são contraditórios, quais deverão prevalecer! Naturalmente, que alguns dirão aqueles, que Maomé disse,
outros dirão aqueles, que Cristo disse. Mas, na falta deles alguém poderia dizer prevalecerão os princípios, que nós escolhermos para a [nossa convivência], e esses princípios serão escolhidos no calor de um debate, no calor de uma discussão.
Então, perceba que a ética, ela não é mais a preocupação de avaliar a vida como um todo, como era para os gregos, a ética também já não é reflexão sobre a conduta com base em resultados e tão pouco, é respeito a «princípios universais». A ética agora, é uma «actividade ininterrupta» de discussão, de argumentação sobre quais princípios queremos sejam os princípios norteadores da nossa convivência.
Portanto, esse lugar abstracto e imaginário, que na verdade se traduz numa oportunidade permanente de levantar a mão e dizer quais são os princípios, que considera justos é o que o Habermas vai chamar de «esfera pública» ou de «espaço público». No final das contas esse lugar é o lugar aonde todos somos convidados a frequentar, para dizer para onde queremos ir e porque caminhos respeitando que regras.
Então, naturalmente, esse «espaço público» será tanto mais rico, tanto mais eu diria «competente» para definir fins e meios, quanto mais povoado ele for de bons argumentos. Nesse «espaço», de depuração [limpeza] de maus argumento, você não vencerá sempre. Mas, você sempre terá a oportunidade de apresentar o seu ponto de vista a respeito de, para onde aquele colectivo deve ir segundo você. Então, quanto mais gente participar sobre aonde queremos ir, mas rica será a discussão e melhor será a depuração dos maus argumentos em favor dos bons argumentos.
Ora! O que é que isso ajuda a entender. Isso ajudar a entender, que durante [25] séculos o homem imaginou, que a ética fosse respeito a um certo tipo de comportamento que impunha a ele, mas que no último século o homem percebeu, que ética é mais do que isso. A ética é respeitar é! Mas…, é respeitar critérios de conduta definidos por aqueles que respeitarão. Então, a ética não é só a parte do respeito é parte da «legislação», existe portanto na ética uma perspectiva normativa e uma perspectiva aplicada. Ou seja, para fazer ética, não se trata só de respeitar as regras de jogo, mas participar da definição das regras do jogo. Dai, ética é liberdade para decidir o que queremos para nós e respeita o que nós mesmo combinamos.
Destarte, eu espero, que você [s] tenha compreendido, que nessas condições em que ética vai depender daquilo, que nós mesmos decidimos para nós e portanto a ética depreende de grandes regras, de «embates argumentativos» é imprescindível o respeito, ao direito de fala de todos os interlocutores. E toda vez, que há cerceamento a esse direito de fala, quer por intervenção policial, quer por qualquer acto de truculência o que você faz é [fracturar] as condições de possibilidades do «espaço público» de definir, as regras e mais do que as regras os destinos da sociedade.
Então, quando você chega no quinto pacote, e você se depara com uma ética, que hoje é chamada de ética da «pós-modernidade», alguém poderia dizer bom…, sendo a «pós-modernidade» o respeito aos valores do baixo-ventre. O respeito aos desejos é uma coisa muito generalizada, porque no final das contas, sendo um respeito às tuas inclinações e não mais a princípios robustecidos a «ética pós-moderna» pode-te permitir perfeitamente você beijar mais [4] bocas numa noite ou nenhuma.
Claro! Por se tratar dum esforço de aperfeiçoamento da convivência é imprescindível numa ética desse tipo, que haja respeito pelas inclinações do outro, porque obviamente ninguém chamaria «ética pós-moderna» de uma ética de «estupradores». E é nesse momento, você olhando para mim, você deve estar se perguntando o que carga de água quis dizer com isso tudo.
Repare! Eu quis dizer, que se as formigas convivem de um único forma que poderiam conviver. Porquê! Porque você aprendeu, que no formigueiro têm algumas formigas, que trabalham o tempo todo e outras não fazem nada, mas se houvesse uma revolução do tipo proletário no formigueiro não daria certo, porque a formiga que não trabalha não poderia ser levada a trabalhar, porque ela não tem pata para trabalhar. Então, o que é que você aprende? Que o formigueiro funciona da mesma forma desde a antiguidade até aos nossos dias. Ou seja, o funcionamento do formigueiro é inapelável e inexorável. É necessariamente aquele.
Agora; o que acontece com o nosso formigueiro? O nosso formigueiro é cheio de excrutícies, mas tem uma diferença em relação ao das formigas. No nosso caso, pode ser diferente do que é. Vou repetir. Existe uma tendência dos «poderosos» em querer conservar as condições matérias de reprodução de sua dominação, mas invariavelmente no nosso caso o formigueiro pode ser diferente do que ele é.
Por isso, a ética é certeza de que a razão compartilhada permite o aperfeiçoamento do formigueiro, e vamos e convenhamos a história da humanidade não é exactamente uma história da qual podemos nos orgulhar sempre, porque ela é rechiada de crueldades. Portanto, qualquer coisa, que façamos será muito provavelmente no sentido do aperfeiçoamento da convivência e não se trata de respeitar verdades já estabelecidas. Por exemplo, se hoje eu represento a minha comunidade no Ministério da Educação para discutir um problema como o uso infantil do facebook, eu te pergunto. Quem é que tem a verdade sobre o uso infantil do facebook?
É um problema ético? Claro que é! É um problema de convivência graças ao facebook, que é uma ferramenta potencialmente extraordinária, você tem o facebook e a destruição das identidades infantis ainda incipientes com consequências psíquicas até difíceis de avaliar. Então, você pergunta quem é que tem a verdade sobre o uso infantil do facebook? Será o Aristóteles? Será o Kant? Será o Marx? Quem será? Se o facebook surgiu ontem.
Então, quem vai discutir sobre o que queremos, quem é que vai decidir sobre a conveniência da técnica, quem é que vai decidir sobre o valor do instrumento, quem é que vai decidir, se não nós. Porquê! Porque o facebook é parte do nosso mundo. Então, é claro pode ser diferente do que é. E se pode ser diferente do que é, quem é que vai mudar? Não tem eles lá, e você aqui. Quem muda a convivência de um espaço de convivência é quem convivi ou mais ninguém.
Em termos simples, a ética hoje, muito mais do que tabela de certo e errado é uma disposição «arejada e permanente» para argumentação interrupta, sobre problemas virginais e repetíveis que temos que encarar a cada segundo e que sexta-feira ainda não existiam.
Manuel Bernardo Gondola
Em Maputo, [21] de Junho 20[20]