Por Edwin Hounnou
Esta é a nossa realidade, à maneira marxista-leninista, que não tolera partilhar o mesmo espaço político e geográfico com as demais forças politicas concorrentes. O cerco é cada vez mais apertado ainda quando a força política que chega ao poder com uma certa legitimidade ou por via das armas, como é o nosso caso. A intolerância reduz o outro a nada e sufoca o outro. A exclusão fala mais alto quando se entra em contacto com as instituições públicas ou delas procura tirar benefícios. As portas não se abrem para quem não seja do partido no poder. As portas de sucesso não se abrem não pela falta de competências, mas, quando a falta de pertença ao partido governamental.
O cartão vermelho, símbolo da Frelimo, continua a ser a chave mágica que abre todas as portas de oportunidades de negócio, de um bom emprego, até de ficar rico qualquer esforço e, como agora está ficando na moda, abocanhar todas as adjudicações directas de obras e prestações de serviços e fornecimento de bens ao Estado. Em todos aspectos - politico, social e económico – o partido no poder continua a manter a postura dos anos da independência, admitindo, apenas, níveis ínfimos de tolerância para agradar os “parceiros de cooperação" que gostariam de ver que, entre os moçambicanos, também uma aparente democracia multipartidária e, assim, permitir o fluxo de apoios financeiros. A exclusão nos actos públicos é um factor gritante que ainda ameaça a paz.
A Frelimo não permite nem mesmo aos partidos com assento parlamentar trabalharem em Inhambane, Gaza. Em algumas províncias o espaço está parcialmente fechado. A Renamo e o MDM sabem do que estamos a falar. Ossufo Momade e Daviz Simango sempre sofrerem vexames e perseguições nas suas digressões pelas províncias. Na Maxixe, operadores turísticos tiveram que devolver ao MDM o dinheiro de arrendamento de sala, alegando que terem sido alertados de que haviam de sofrer represálias caso alojassem a oposição. Poucos dias depois, mesmo aconteceu com o presidente da Renamo viu suas actividades inviabilizadas por grupos da Frelimo.
A OJM e OMM, organizações sociais da Frelimo, são especializadas na inviabilização das actividades dos partidos da oposição. Com quem, afinal, a Frelimo se quer reconciliar, se nem mesmo a Renamo, que tem armas, não lhe permite trabalhar com tranquilidade? A paz e reconciliação bafejam somente a Filipe Nyusi e Ossufo Momade, que se abraçam efusivamente, mas as perseguições contra quem pensa diferente continua. O G40 descaracteriza o pensar diferente e os esquadrões da morte ainda raptam e matam.
É absurdo falar da paz e reconciliação nacional enquanto houver um grupo de pessoas a se comportarem como se ainda estivéssemos nos primórdios da independência em que era expressamente proibida a existência da oposição. Em países democráticos, ninguém ganha tudo assim como ninguém perde tudo. O perder tudo é uma fonte de conflitos que desaguam em guerras. Nenhuma boa governação resiste à alternância ao poder. Alternância e democracia são condimentos essenciais para a paz e reconciliação. O país vem sendo (des)governado pelo mesmo partido, há 45 anos, passando uma certidão de incompetência ao povo que aflui às urnas para escolher um outro tipo de governação. Não há alternâncias no comando do Estado enquanto a Frelimo continuar a fazer megafraudes eleitorais com ajuda e beneplácito da policia e dos órgãos eleitorais.
Não pode haver paz nem reconciliação num país onde as eleições servem para legitimar os corruptos e bandidos e não pode trazer a paz e desenvolvimento nacional. A paz é sinónimo de desenvolvimento e não há paz sem desenvolvimento. A corrupção e a exclusão social ofuscam paz e mina o desenvolvimento socioeconómico. O que faz crescer um país e o torna rico não é, apenas, a abundância dos seus recursos mas a inteligência e visão do governo e o trabalho árduo do seu povo. Um governo corrupto é uma fonte permanente de conflitos. Um mau governo joga o povo para a fornalha.
A situação permanente de conflitos e de guerras por que passamos se deve ao tipo de governos que têm dirigido os destinos do nosso país e não à qualidade dos nossos vizinhos, como costumam propagar os comissários do regime frelimista. A descoberta de imensos atiçam a corrupção e amaldiçoam o futuro das gerações vindouras do nosso país. Os parceiros de cooperação juntam-se a “feiticeiros" que gastam 30 milhões de dólares com as importações de papel higiênico, como revelou o ministro da Indústria e Comércio, Carlos Mesquita, na semana finda. Isso é muito vantajoso para os corruptos.
Vozes estranhas ecoam no nosso horizonte político sugerindo que o Acordo de Paz Definitiva não pode ser renegociado. Essas vozes estão a insultar a nossa dignidade. A renegociação ou não de um acordo deveria ser um assunto, estritamente, interno, que dissesse respeito aos moçambicanos, mas lemos e vemos individualidades a fazerem pronunciamentos a esse respeito que roçam a diplomacia. A única coisa que não pode ser renegociada é a Lei de Deus. Todo o resto é renegociável. Seria bom que essas brilhantes vozes da diplomacia internacional aconselhassem aos seus “bradas" para pararem com os raptos, exclusão socioeconômica de gente que não seja do partido no poder. São as injustiças que ameaçam a paz e não as armas nem o que denunciamos.
Os raptos de membros da Renamo recentemente reintegrados no âmbito da DDR, nas províncias de Manica e Sofala, prosseguem. Valeu a pena entregar as armas, para depois virem a ser apanhados e degolados como se fossem animais selvagens? Parece ser um equívoco dizer que a paz que o acordo preconiza seja abrangente para todos ou se limita somente a bafejar aos seus signatários, designadamente, Filipe Nyusi e Ossufo Momade, pois a incerteza sobre o amanhã ainda paira nas mentes dos que abraçaram a causa da Renamo ou com ela se identifica. Ninguém se bateu por esse tipo de paz e a guerra não é nenhum destino traçado por Deus atravessado no caminho do povo moçambicano.
O pensamento único é coisa que se cultiva em sistemas comunistas e pensar diferente constitui, como ficou provado entre nós, um crime que pode custar a vida.
O ser diferente, agir diferente e pensar diferente constituem um sério perigo. As eleições fraudulentas servem para dar continuidade da mentira. Os acordos visam a realização de eleições e não a estabelecer uma paz efectiva, desenvolvimento e paz. Depois de cada ciclo eleitoral, as armas voltam a semear a morte. A causa das guerras por que passamos se assentam no monopólio do poder por indivíduos para se enriquecerem de maneira ilícita, promovendo um único partido em detrimento das demais forças políticas, contra as quais se mobiliza a polícia, os tribunais e os órgãos eleitorais.
Estamos a caminhar para um estado falhado e isso não se deve por culpa do colono de ontem, mas por causa do colono de hoje que partidariza o estado o que lhe permite acumular riqueza de maneira ilícita. O novo colono julga que chegou a sua vez de, também, comer. O sistema colonial punia, com agravo, os seus corruptos e ladrões enquanto os novos colonos se juntam para saquear o nosso Estado e se defenderem uns aos outros quando as coisas não lhes correm bem. A dança dos loucos das dívidas ocultas elucida como funciona a máfia. Até a Procuradoria-Geral da República, um defensor do Estado, foi mobilizada para defender os gatunos e saqueadores do nosso futuro, desviando fundos públicos que tanta falta fazem para os sectores sociais e económicos.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 28.10.2020