Por Edwin Hounnou
A EDM (Electricidade de Moçambique) para resolver os seus problemas de tesouraria e manter o alto nível de vida dos seus gestores empurra os seus ‘assuntos’ para o consumidor para que aguente com o fardo. O governo ao invés de ter coragem de se sentar à mesa para renegociar a tarifa que mantém na venda da corrente eléctrica da HCB (Hidroelétrica de Cahora-Bassa), prefere sufocar o povo em nome da amizade com o ANC (Congresso Nacional Africano). A ESKOM (empresa sul-africana de produção e comercialização da energia eléctrica) compra a energia eléctrica à HCB, a preço de banana e vende-a a preço comercial, diferente do que se passa entre nós em que o coração salta de cada vez que nos chega a factura do consumo da corrente eléctrica.
É uma desculpa esfarrapada segundo a qual a EDM compra a corrente eléctrica à ESKOM a um preço bastante oneroso, por isso, não tem como vendê-la a um preço razoável. A pesada factura que pagamos à EDM se deve a questões de cariz políticos. As despesas com a administração da EDM e os saques que as empresas das elites do partido no poder fazem às instituições públicas dificultam qualquer tentativa de, economicamente, se afirmarem, por isso, não há uma única empresa pública saudável, mesmo os CFM.
Em momentos eleitorais, as empresas públicas são cofres que financiam a campanha eleitoral do partido governamental. Este é um segredo aberto e o gestor que oferecer dificuldade ao saque corre o risco de perder o seu assento. Há gestores que foram mandados embora por não terem dado o braço a torcer. O aumento de 10 por cento visa suportar os apetites dos seus gestores. Mateus Magala, um gestor público de cinco estrelas, teve que sair às corridas da EDM porque os “donos" sentiam interesses ameaçados. Conversamos com Mateus Magala, quando ainda PCA, e ficamos com a percepção de que se trata de um grande gestor que o país precisa para se livrar da lama.
A turma do partido no poder não gostou nada de ver seus negócios questionados e seus rendimentos postos em causa, decidiu agir, devolvê-lo ao BAD (Banco Africano de Desenvolvimento) onde o Presidente Filipe Nyusi o havia solicitado para vir ajudar a reerguer a economia nacional. O partido no poder demonstrou que não está interessado no desenvolvimento do país e, por tal motivo, fecha compromissos políticos com recursos do povo.
O interesse do país sempre vem depois dos interesses privados e do grupo. O que conta é encher os seus bolsos e as suas múltiplas empresas servem de canais para sugar os fundos públicos porque seria demasiado ridículo se cada um fosse às empresas públicas buscar dinheiro em sacos. Na impossibilidade de procederem de forma aberta, infiltram suas empresas nas instituições do Estado como provedoras de serviços de limpeza, jardinagem, fornecedoras de cabos eléctricos, aluguer de viaturas, substituição de lâmpadas na via pública, etc., embora essas obrigações sejam das atribuições da EDM. Até filhos do Presidente da República e seus amigos andam metidos na jogada de adjudicações directas de obras, fornecimento de bens e prestação de serviços ao Estado.
A ESKOM continua a comprar energia da HCB pelo preço de 1982, nesse tempo o Rand equiparava-se quase ao dólar, pois 1Dólar = 1,09 Rand. Neste momento, o dólar está para cerca de 16,3 Randes e a tabela da venda da corrente à ESKOM mantém-se inalterável. No acordo de fornecimento de electricidade, de 2007, obrigava a ESKOM a comprar a corrente eléctrica da HCB a 0,1256 centavos do Rand por KW/h. Este valor já era um absurdo em 2007, considerando os níveis de preço da energia produzida na África do Sul e no Mundo. Os preços médios estão 32 cêntimos do dólar na Alemanha, 20 cêntimos na França, 16 cêntimos no Brasil e 14 cêntimos na Rússia, enquanto isso a HCB vende a 0,1256 cêntimos do Rand à ESKOM que equivale a cerca de 0,0073 cêntimos do Dólar. Esta situação deplorável permanece inalterável até aos dias de hoje.
Especialistas na matéria sugerem que o preço realista seria entre 1,80 a 1.90 Randes por KW/h ao invés dos insignificantes 0,1256 Randes. A electricidade da Central Termoelétrica de Ciclo Combinado de Ressano Garcia é vendida à ESKOM por 1,4 Randes por KW/h, representando uma diferença escandalosa se comparada ao preço de venda da energia da HCB adquirida pela ESKOM. A explicação é muito simples : as elites do partido no governo têm interesses na Central Termoelétrica de Ciclo Combinado de Ressano Garcia, por isso, discutem o preço de venda do seu produto da maneira mais realista possível.
Está claro que as elites do partido governamental estão viradas apenas para os seus interesses privados e servem-se do Estado para se afirmarem como endinheirados e não como uma burguesia nacional comprometidas em produzir riqueza e bem-estar para as populações. Noutros quadrantes do Mundo, ser burguês é sinônimo de produtor de riqueza e contribui para os cofres públicos enquanto entre nós é sinônimo de ser ladrão, corrupto e bandido. No mundo civilizado, onde as oportunidades estão abertas a todos, trabalha-se no duro para se tornar burguês, diferente de Moçambique onde para ter dinheiro basta ser presidente, ministro, governador, PCA ou que ocupe um lugar relevante na administração pública que, por sinal, todos sendo do partido no poder desde 1975. Se no passado o mobutismo (referente à governação de Mobutu Sese Seko, do Zaire, hoje RD Congo) nos repugnava, agora também nos repugna o guebuzismo e o nyusismo, especializados na arte do saque do bem público.
Em 2007, 0,1256 cêntimos do Rand valiam 0,017 cêntimos de dólar americano. Em 2015, 0,1256 cêntimos do Rand equivaliam 0,009 cêntimos do Dólar americano, ou seja, nos dias que correm, a ESKOM paga cerca de quatro vezes menos do que pagava em 1982. O governo do ANC quadruplicou a injustiça contra a economia moçambicana, em conivência com os seus camaradas da Frelimo. Para percebermos a dimensão da pilhagem da energia eléctrica da HCB é importante dizer que o preço real de energia eléctrica de mercado, na região da SADC, é cerca de 15 vezes superior ao preço que a HCB vende à ESKOM. Os governos da Frelimo e do ANC estão, como é evidente, a empobrecer a economia do nosso país com base em compromissos políticos efêmeros.
Se o país vendesse ao preço de mercado a energia de HCB à ESK0M, ao invés de receber os cerca de 6,5 por cento do valor real – quase de borla -, o país estaria em boas condições de desenvolvimento, nem precisaria do Clube de Paris nem se ajoelharia junto às instituições do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial. A diferença é de 1.300 milhões de dólares vencidos por ano. Moçambique é o quarto país menos desenvolvido do mundo, mas subsidia a maior economia de África, com PIB 20 vezes superior ao nosso.
É um negócio duvidoso que faz descarrilar o desenvolvimento socioeconómico do país. Com o dinheiro desperdiçado com base em negociata entre a Frelimo e o ANC, de 1982 a 2020, o país já perdeu 50 biliões de dólares. É muito dinheiro para os cofres de qualquer país do mundo que, bem gerido, poderia tirar os moçambicanos da pobreza, porém, continuamos sem educação nem saúde e, sobretudo, sem a oportunidade de nos livrarmos da miséria em que fomos jogados.
O nosso grande assunto mesmo não é com a EDM, mas com os graúdos da Frelimo que estão no comando do nosso país. Deve ser com os novos ricos da Frelimo que temos que acertar as contas. A EDM é uma agulha perdida no enorme caixote de lixo da corrupção onde os graúdos do partido no poder passeiam a sua classe de agentes do mal.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 21.10.2020