Em entrevista com a DW África, o ativista Adriano Nuvunga acusa o Estado de conluio com a mineradora na violação de direitos humanos.
A multinacional brasileira Vale, uma das principais companhias mineiras a operar em Moçambique, anunciou esta quinta-feira (21.01) que vai abandonar a exploração de carvão em Moatize. Tenciona, no entanto, encontrar uma empresa que esteja interessada em comprar a mina.
Em entrevista com a DW África, Adriano Nuvunga, diretor do Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD) em Maputo, explica porque é que o abandono da Vale vai custar rendimentos ao Estado. E lembra que as populações locais foram, desde o início do projeto, muito mal-tratadas pela empresa brasileira.
DW África: O abandono da Vale é uma boa ou uma má notícia para os moçambicanos?
Adriano Nuvunga (AN): É uma má notícia, por várias razões. Primeiro, quando se fala do setor mineiro em Moçambique, ele está associado à Vale. Foi a Vale que veio ressuscitar o gigante carvoeiro Moatize. Esperava-se que se tornasse no "Eldorado" do país. Mas passado pouco tempo, as dificuldades começaram a surgir. Mesmo assim, a Vale continuou e fez investimentos importantes, que se esperava que, neste momento, já estivessem a gerar lucros importantes para a província, para o país e para a própria empresa.
DW África: O abandono da Vale quer também dizer que o Estado perderá os benefícios fiscais, ou seja, haverá menos dinheiro nos cofres do Estado.
AN: A saída da Vale vai significar perdas para o país também no sentido mais financeiro do termo. Porque, quando vende e depois um parceiro entra, essa saída e entrada significa a redução do ganho para o Estado. Porque de acordo com a nova legislação, quem compra tem que recuperar esse dinheiro. O que significa que a riqueza que devia ser para a província e para o Estado moçambicano fica nas mãos daqueles que hão-de vir para investir.
DW África: A Vale tratou com respeito as populações locais?
AN: Longe disso. Pode-se dizer que uma relação de conluio entre o Estado e a Vale resultou em violações gravíssimas dos direitos humanos. O atropelo àquilo que é a dignidade de comunidades foi perpetrado pela Vale com o beneplácito de pessoas importantes no Estado moçambicano.
DW África: No comunicado, a Vale diz que abandona Moçambique devido à questão ambiental. Isso é credível?
AN: O fator ambiental é importante. A questão ambiental é importantíssima. Há cada vez mais debate sobre a questão da transição energética, que coloca pressão sobre as mineradoras não só aqui em Moçambique como a nível global. Mas claramente a questão da produtividade, e também um pouco da qualidade do próprio produto, afetou grandemente essa visão que de que Tete seria o "Eldorado" do país.
DW – 21.01.2021