Por Edwin Hounnou
Mobilizar o povo inteiro para pegar em armas a fim de expulsar o colonialismo da nossa pátria para, no fim da luta, ganhar, apenas, a independência política, ter um presidente preto no Palácio da Ponta Vermelha, uma bandeira e moeda com símbolos nacionais, isso é muito pouco quando comparado com os sacrifícios consentidos, incluindo o sangue derramado pelos melhores filhos da pátria. A independência política é o primeiro passo para qualquer nação. É muito mau que várias nações continuem a marcar passos e não lutem pela independência económica efectiva. Todos os africanos lançam as culpas do seu atraso económico sobre o ocidente, porém, os seus governos nada fazem para saírem do subdesenvolvimento. Só sabem percorrer, e com muito esmero, o mundo para pedir ajuda : faça sol ou faça chuva.
A independência politica compara-se aos primeiros passos de uma criança. Uma criança que nunca quer aprende a andar sozinha, deve estar doente o que deve ser motivo de preocupação para os seus progenitores. Na medida em que os anos passam, os países africanos, Moçambique incluído, estão a afundar-se cada vez mais na lama do neocolonialismo, muito mais cruel que o colonialismo por que o povo foi submetido durante a dominação portuguesa. O povo lutou para se libertar de um colonialismo arcaico para cair num sistema comunista cruel e depois num capitalismo de saque.
É verdadeiro se afirmarmos que, hoje, estamos mais gravemente colonizados que no tempo em que os nossos territórios eram administrados pelas potências coloniais. Os nossos países viraram lugares-comum de onde as multinacionais roubam matérias-primas para as indústrias dos seus países e nós acreditamos que temos o trabalho facilitado ao ponto de abandonamos a agricultura considerada, pela constituição, como o motor do desenvolvimento socioeconómico do país, para vivermos de importações do mais básico como arroz, batata, banana, cebola, feijões, cenoura, alho e fruta diversa.
As infindáveis viagens de peditórios que os nossos governantes fazem pelos países da Europa, Ásia e América levam na folha de angariações fundos para a construção de uma latrina melhorada, um posto de saúde ou uma sala de aulas. Recordamo-nos de que nenhum país vence o subdesenvolvimento apostando em peditórios. Os países arrojados batem-se para reconstruir a economia, erguendo a indústria transformadora e a agricultura comercial. Temos a indústria escangalhada pelas políticas do Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial e pela ineficiência de gestão económica.
Dizia alguém, faz muitos anos, que quando vamos às compras, levamos dinheiro no cesto e trazemos a mercadoria no bolso. É verdade. Estamos sempre a afundar e, doravante, pouco temos a perder porque perdemos tudo que poderíamos ter como povo e como nação. O que está mal? Temos 36 milhões de hectares de terra arável, imensos recursos como minerais, hidrocarbonetos, energéticos, hídricos, marinhos, florestais, um invejável complexo ferroportuário, mais de 60 rios com curso de água permanente, porém, continuamos subdesenvolvidos. O que nos falta? – Uma liderança esclarecida, determinada, laboriosa, livre da corrupção e de compromissos particulares.
Uma sociedade que tolera a corrupção não se pode desenvolver. Alguns dirão que a corrupção existe em todo o mundo, mas eles se esquecem de um importante pormenor : lá em outros países, a corrupção é combatida com acções concretas e os praticantes da modalidade da corrupção são presos e condenados de modo exemplar. Entre nós, os corruptos são reverenciados, tomados como bons porque roubam, ocupam cargos públicos de relevo e “ganham" as eleições com vitórias retumbantes, sufocantes e asfixiantes. O povo, perante tanta imbecilidade, bate palmas por uma camiseta, uma capulana e dança por um copo de sumo. Os funcionários públicos são considerados membros do partido no poder e os professores são instrumentalizados para apoiarem os malandros, indicados para delegados de candidatura do partido no poder. Essa tarefa deve ser acatada sob ameaças de desterros e o fim da carreira profissional.
A corrupção é um entrave ao desenvolvimento, por isso, ninguém deve fingir que está a combatê-lo enquanto está a mentir. O primeiro passo, e o mais importante, deve-se começar pela separação de poderes. No nosso país, o governo e as instituições da justiça (Procuradoria e os tribunais) dormem na mesma cama. É bem elucidativa a luta tirânica em que a Procuradoria-Geral da República se encontra metida para salvar a pele dos que promoveram as dívidas ocultas, gastando fundos públicos para evitar que um dos implicados, para que a verdade não chegue às mãos da justiça norte-americana porque mancharia toda a rede da máfia, deixaria o rei nu na praça. O argumento segundo o qual Manuel Chang deve ser julgado pelos nossos tribunais, é de todo falso. O pouco que hoje sabemos da roubalheira foi graças as informações que nos chegaram de fora enquanto os titulares de vários poderes da nossa terra juravam desconhecer o roubo.
O antigo arcebispo de Nampula, Dom Manuel Vieira Pinto (1923-2020), dizia que a independência política é pouco para matar a sede do povo pela justiça e liberdade. A nossa independência é fictícia porque Moçambique se tornou independente da potência colonial em 1975, porém, passados quase 50 anos ainda continuamos de cócoras, em termos económicos. Não passamos de serventes dos países ricos, dizia o arcebispo. O nosso território é um depositário de matérias-primas para as empresas estrangeiras tirarem madeiras, minerais, recursos marinhos, hídricos, gás natural, carvão mineral e, em breve, petróleo. Para trás, deixam buracos, poeira, desertificação dos solos, desaparecimento dos rios e pobreza absoluta.
Não há dúvidas de que Moçambique passou de um colonialismo de chibalo e machila para um colonialismo de saque económico, passando por uma fase intermédia de um comunismo boçal. Os novos colonialistas usam duas armas : a corrupção e guerra. O antigo colonizador tinha uma face concreta. O povo o conhecia pelo seu nome enquanto o novo chega à nossa terra acompanhado do nosso irmão ou amigo. Este é o mais difícil de combater e facilmente nos deixamos enganar pelas suas ardilosas manobras. O novo colonizador roubar-nos os recursos e o povo está sob ameaça permanente das políticas do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional e do neocolonialismo da China.
Os donos dos países do nosso continente não são os povos africanos. Quem administra os vários países africanos não são os governantes que vemos em Mercedes-Benz, com sirenes para a gente se afastar. Os donos de Moçambique não somos nós que somos chamados a votar de cinco em cinco anos. Os donos do nosso país são os que alimentam a preguiça do nosso governo e o convence a não investir na agricultura comercial e na indústria e, de tempos em tempos, organizam conferências de doações para pagar salário dos governantes, dos funcionários públicos e o resto que fica com os corruptos.
Os nossos donos mandam desindustrializar o país e ordenam que as nossas matérias-primas sejam exportadas, como aconteceu com a castanha de caju e algodão. As indústrias de caju e têxtil caíram na falência. Deram ordens para que a nossa madeira seja exportada em toros e o governo não tossiu. O mesmo se pode dizer das areias pesadas, pedras preciosas, gás de Temane e da Bacia do Rovuma. Nenhum homem, país ou nação pode ser livre enquanto não tiver alcançado a sua independência económica.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 23.02.2021