Terrorismo no centro e norte de Cabo Delgado
Apesar de a situação de (in)segurança ainda não permitir a verificação no terreno, parecem ser mesmo reais as indicações de um cenário de fome nas bases terroristas montadas em várias matas dos distritos do centro e norte de Cabo Delgado, isto fazendo fé aos relatos que, de algum tempo para cá, vão chegando a algumas sedes distritais como Nangade, Macomia e Palma.
Os relatos são trazidos por homens, mulheres e crianças que fogem dos locais considerados “bases”. As pessoas livram-se por falta de guarnição terrorista, ou simplesmente são dispensadas por aqueles que os tinham como reféns.
Nisto, ao longo da semana passada, um grupo de cinco raparigas reapareceu na vila de Macomia, centro de Cabo Delgado, depois de um desaparecimento que já fazia três anos. Ou seja, há três anos que, raptados em incursões terroristas, as raparigas estavam nas mãos e sob ordens dos localmente chamados al shabaabs, designação copiada do nome do grupo terrorista somali.
As meninas têm idades que variam de 16 a 18 anos. Quatro são naturais de Macomia e uma de Mocímboa da Praia. Parte das raparigas foi capturada num dos ataques insurrectos ao posto administrativo de Mucojo, distrito de Macomia. Mucojo, recorde-se, foi uma das primeiras zonas a serem atacadas, logo depois das aldeias de Mocímboa da Praia.
Elas contam que a sua tarefa principal no mato era cozinhar para os militantes terroristas. Não acompanhavam os insurgentes nas suas incursões. Entretanto, narraram elas, era habitual e recorrente a troca de uma base para outra.
Ou seja, uma vida de nomadismo, que os abrigava a montar pequenos acampamentos num local, mas tempo depois saíam para outro. Tudo em mata cerrada. Disseram que tinham, igualmente, a missão de transportar comida, ou seja, diversos alimentos, normalmente saqueados em incursões a aldeias que ainda eram habitadas.
Contaram ainda que a base ou as bases de insurgentes estavam cheias de gente. Contudo, devido ao que descrevem como “fome e falta e mantimentos”, os insurgentes informaram aos capturados que, quem tivesse condições de voltar para as suas casas [zonas de origem], poderia fazê-lo.
Assim, contaram, foi nesses termos que conseguiram caminhar, a pé, da última base terrorista na qual estavam, até à sede do distrito de Macomia.
O cada vez maior preparo humano e material das Forças de Defesa e Segurança (FDS) para lidar com o terrorismo em Cabo Delgado e o consequente corte logístico dos grupos atacantes, assim como a falta de locais de saque pela realidade de êxodo nas aldeias, têm sido apontados como parte das razões ara a fome e inevitável desintegração terrorista em Cabo Delgado.
As fontes de financiamento monetário, que no início puxaram muitos jovens para a ala terrorista parece, igualmente, estar a ser melhor monitorada pelas autoridades, o que aumenta dificuldades para a subsistência dos grupos.
Relatos de reuniões de chefias terroristas com os militantes apenas para dar indicação de não haver mais capacidade de sobrevivência nas matas, e daí a necessidade de cada um virar-se ou regressar para zonas de origem têm estado a ser ouvidos há algum tempo.
Talvez seja nessa lógica que o Presidente da República tem estado, reiteradamente, a apelar para o regresso e a assumir o compromisso de estar em altura de perdoar os jovens que foram “enganados” pelos terroristas.
Segundo contaram as raparigas, as bases terroristas eram, normalmente, construídas de chapas de zinco [também saqueadas nas aldeias, acredita-se] e eram cobertas de folhas e capim, isto no sentido de dificultar que fossem identificadas por helicópteros das Forças de Defesa e Segurança ou em apoio a estas.
Cada uma das raparigas aceitou dizer o respectivo nome. São elas, Sifa Amed, Mava Saide, Mariamo Abudo, Fátima Adinane e Fofiwa Bakari. Na vila de Macomia, elas encontram-se na casa do tio de uma das meninas. Todas planeiam viajar até à província de Nampula, para onde maior parte da família se refugiou.
MEDIA FAX – 16.02.2021
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